Novo
tratamento para o colesterol muda a visão a respeito do LDL
O desenvolvimento de
medicamentos inibidores da PCSK9 para o tratamento de colesterol alto trouxe
lições importantes sobre o LDL (colesterol ruim)
O
colesterol é um produto essencial à vida dos animais, incluindo o ser humano,
porque é um componente de todas as membranas das células. Praticamente todas as
nossas células são capazes de fabricar essa gordura para satisfazer as suas
necessidades, e o fígado produz uma quantidade excedente que é exportada via
circulação. Cumpriria, assim, a função de abastecer órgãos que necessitam de
maiores quantidades de colesterol, porque o utilizam como matéria-prima para a
produção de certos hormônios como, por exemplo, os hormônios sexuais.
Para distribuir o colesterol que fabrica, o fígado
prepara pacotes de colesterol que também contêm colesterol absorvido a partir
da alimentação. Esses pacotes são transportados em uma partícula chamada LDL
(LDL é a abreviatura em inglês de partícula lipídica de baixa densidade).
Acontece
que o LDL não age como um carteiro que entrega a mercadoria apenas em
determinados endereços, atuando mais como um caminhoneiro que se esqueceu de
fechar a traseira do veículo. Quando carrega muito colesterol, vai “derramando”
a carga pelo percurso. Esse colesterol penetra na parede das artérias e será
removido por outra partícula chamada HDL (abreviatura de partícula lipídica de
alta densidade), que devolve o colesterol “derramado” para o fígado, no chamado
transporte reverso.
Quanto mais colesterol for transportado no LDL, mais
colesterol será inapropriadamente “derramado” nas artérias. Como existe o risco
de que esse colesterol dê origem a uma lesão (ateroma) que pode causar
obstrução do vaso, o LDL colesterol é conhecido como colesterol ruim. Por outro
lado, quanto mais colesterol houver no HDL, significando que mais
colesterol foi removido das artérias, menor o risco de desenvolver
aterosclerose. Daí o HDL colesterol ser conhecido como colesterol bom.
Um grande avanço no tratamento da doença cardiovascular
aterosclerótica ocorreu com a introdução das estatinas, que são medicamentos
que diminuem a produção do colesterol pelo fígado. Com o seu uso disseminado,
pudemos assistir a uma queda de 28% da incidência de infarto agudo do miocárdio,
em populações de alto risco, como nos portadores de diabetes.
As estatinas permitem uma redução de cerca de 50% nos
níveis de LDL colesterol, que pode baixar para valores de cerca de 90 mg%,
situação na qual a doença cardiovascular se estabiliza ou progride mais
lentamente. Certamente, nesse nível o LDL ainda consegue entregar colesterol
suficiente para suprir as necessidades das glândulas que utilizam colesterol
como matéria-prima para a produção de hormônios.
O LDL produzida pelo fígado, após promover a entrega de
parte do colesterol, retorna ao fígado onde pode ser reabastecida de mais
colesterol para uma nova entrega ou ser removida de circulação. A remoção
de LDL pelo fígado se faz por meio de uma proteína receptora de LDL. Por sua
vez, existe uma proteína denominada PCSK9, que promove a destruição do receptor
de LDL.
Em 2003 foram descobertas famílias portadoras de mutações
no gene que codifica a PCSK9 que as impediam de produzi-la. Essas famílias têm
grande quantidade de receptores de LDL (por falta da proteína que destrói esse
receptor) e, portanto, uma grande capacidade de remover LDL da circulação.
Nesses indivíduos, os níveis de LDL colesterol eram incrivelmente baixos (cerca
de 20 mg%) e a doença cardiovascular aterosclerótica praticamente inexistia.
A indústria farmacêutica apressou-se em desenvolver
inibidores da PCSK9 e hoje temos duas medicações já aprovadas, com prioridade,
pelos órgãos regulatórios: o Repatha® e o Praluent®.
O
desenvolvimento dessas medicações trouxe lições importantes. Elas promovem uma
queda acentuada do LDL colesterol de cerca de 65% em relação aos níveis
iniciais e parte expressiva dos pacientes atinge níveis inferiores a 50 mg%. O
recente estudo GLAGOV mediu a quantidade e o volume dos ateromas existentes nas
artérias coronárias de pacientes que receberam o Repatha®, através de
visualização direta por ultrassonografia intracoronária. Verificaram ter havido
a regressão significativa das lesões em 63% dos pacientes, em apenas dezoito
meses. O que pode significar menos cirurgias cardíacas ou stents no futuro.
Outra lição importante diz respeito aos níveis de LDL:
quando são muito baixos, isso não afeta a produção de hormônios, porque
os tecidos que usam o colesterol como matéria-prima deixam de utilizar o
colesterol do LDL e aumentam a fabricação local de colesterol.
Ou seja, o LDL é um produto tóxico para as artérias e
desnecessário para as glândulas; concluímos então que, como para qualquer lixo
tóxico, quanto menor seu nível, melhor.
Quem faz Letra de Médico
- Adilson Costa, dermatologista
- Adriana Vilarinho, dermatologista
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