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Por Juliana Blume, em 20.06.2020 |
“O impacto global de cães domésticos na vida selvagem é muito
subestimado”, diz trabalho realizado na Austrália e publicado em 2017 na
revista Biological Conservation. Os pesquisadores acusam cachorros
de terem levado à extinção 11 espécies australianas. Isso significa que o cão é
o terceiro mamífero mais destrutivo da natureza, atrás apenas dos gatos e roedores.
Os cães se unem em matilhas de até 15
indivíduos e caçam iguanas, pombos, macacos, cágados e até pinguins. Eles
ativam câmeras com sensor de movimento em dezenas de reservas e parques
nacionais no Brasil, e levaram a pesquisadora Ana Maria Paschoal, da Universidade
Federal de Minas Gerais, a tentar descobrir de onde vinham tantos cachorros que
circulavam na Mata Atlântica.
A conclusão da pesquisa publicada em
2012 na revista Mammalia foi chocante: muitos dos cachorros
nem sequer eram de rua ou sem donos, e sim cães que viviam em casas próximas às
reservas e que passavam o dia soltos.
“Todos os cachorros detectados tinham
um dono ou uma pessoa com a qual o animal tinha uma ligação”, afirmou ela em
entrevista ao The Washington Post. Quanto mais populações humanas
havia no entorno da floresta, mais cães transitavam e caçavam por ali.
Cachorros eram os mamíferos que mais ativavam as câmeras com sensores.
Espécies ameaçadas

Os cães causam
impactos nas populações silvestres por conta da predação, da competição e da
introdução de doenças como cinomose, parvovírus, raiva, leishmaniose e
dirofilariose. Em 2008 a cinomose foi identificada em nove onças no Parque
Estadual Ivinhema, em São Paulo.
Entre os animais
brasileiros ameaçados, foram citados rã-pimenta, curiango,
gambá-de-orelhas-pretas, cuíca-de-quatro-olhos, várias espécies de tatu e
tamanduá, macaco-prego, bugio, lobo-guará, cachorro-do-mato, raposa-do-campo,
jaguatirica, onça-pintada, onça-parda, quati, anta, veado-catingueiro,
queixada, cutia, preá, paca, entre outros.
Donos surpresos
Fernando Fernandez, professor de ecologia da
Universidade Federal do Rio de Janeiro relatou problema semelhante ao observado
por Paschoal. Ao reintroduzir animais nativos à floresta da Tijuca, no Rio de
Janeiro, eles logo eram atacados por cachorros. As cutias eram muito atacadas
pelos cães, que nem as consumiam. Eles as matavam por diversão.
Fernandez e a equipe dele instalaram câmeras e
identificaram mais de 100 cães no Parque Nacional da Tijuca, e descobriram que
eles moravam em comunidades nas redondezas da floresta. “Essas são pessoas que
não têm dinheiro para construir muros. Quando os donos saem para trabalhar, os
cães também saem e só voltam quando os donos retornam do trabalho”, explica
ele.
Frequentemente, os donos não têm a mínima ideia
do que seus amigos caninos fazem durante o dia. Quando Fernandez contava a eles
que seus cães matavam animais silvestres na floresta com regularidade, eles
ficavam surpresos.
O que fazer?
Esse problema é de difícil solução, já que
estima-se que existam 52 milhões de cachorros no Brasil. Conforme mais e mais
populações humanas cercam áreas de proteção ambiental, mais cães domésticos são
introduzidos nesses ambientes, impactando negativamente as espécies silvestres.
Uma solução proposta por um estudo da
Universidade de Brasília de 2016 é: (a) identificar
vias de acesso da espécie invasora, nesse caso o cão; (b) estabelecer detecção precoce e
sistema de resposta rápida; (c) aplicar
medidas de contenção quando a erradicação não é mais possível mas quando a
invasão é restrita; (d) manter
trabalho de controle se a prevenção e detecção precoce não são mais
possíveis. Para fazer a contenção, é necessário o bloqueio físico dos limites
da área protegida, enquanto a erradicação é a remoção ou eliminação de espécies
invasoras.
Também
é preciso utilizar estratégias de educação da população que vive próxima aos
parques. Idealmente, seria importante registrar todos os cães que vivem nas
redondezas com fotografias e planilhas. Assim, caso o cão seja encontrado na
área protegida, o dono poderia ser responsabilizado. A castração também é
crucial para reduzir populações caninas e evitar animais de rua. [Washington Post, Cães domésticos em
áreas protegidas]
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