Estamos a caminho da III Guerra Mundial? Onze personalidades respondem ao DN.
ATUALIZADA - A análise ao clima de tensão entre EUA e Rússia
Há um risco de guerra entre EUA e Rússia, assumiu Vassily Nebenzia,
embaixador da Rússia na ONU, admitindo, sobre a hipótese de rebentar uma
guerra, que "não podemos excluir qualquer possibilidade". Do lado
norte-americano, embora depois tenha recuado, Donald Trump já afirmou que
"os mísseis estão a chegar à Síria".
Perante este cenário, há a possibilidade de estarmos a caminho de um
terceiro conflito global? Leia aqui as respostas de nove personalidades ouvidas
pelo DN.
ALLAN KATZ - Embaixador dos EUA em Portugal entre 2010 e 2013
Embaixador dos Estados Unidos em Portugal entre 2010 e 2013, Allan Katz
admite que a ameaça de uma Terceira Guerra Mundial "aumentou
exponencialmente com a relação entre os Estados Unidos e a Rússia". O
advogado, que desde que deixou a embaixada passa grande parte do ano no seu
apartamento da Ajuda, acredita que Donald Trump e Vladimir Putin irão perceber
que têm de aclamar os ânimos. "Ainda estou à espera que ambos os líderes
expressem, através de palavras e atos, que têm noção de que têm de acalmar as
tensões em todo o mundo", disse ao DN.
"Acredito que a ameaça aumentou exponencialmente com a relação
entre os Estados Unidos e a Rússia". Allan Katz Embaixador dos EUA em
Portugal entre 2010 e 2013
"Acredito que a ameaça aumentou exponencialmente com a relação entre os Estados Unidos e a Rússia". Allan Katz Embaixador dos EUA em Portugal entre 2010 e 2013
OLEG CHUMAKOV - Professor de russo na Oxford School e na Faculdade
de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Nasceu em 1960 e
está em Portugal desde 1999
"Pelo que vejo nas notícias da televisão russa, da parte da Rússia
não vejo ameaça nenhuma, ninguém lá, nenhum político ou nenhuma outra pessoa,
quer uma guerra, nuclear ou de outro tipo. O desenvolvimento económico, social
e político da Rússia implica vontade de continuar sem guerra nenhuma, sem estas
perturbações. Agora, da parte da política anglo-saxónica, dos EUA e Inglaterra,
vejo uma ameaça concreta.
Na opinião de muitas pessoas, e não falo só de
russos, mas também de portugueses, é a política anglo-saxónica que representa
uma ameaça. Em vez de criar condições para um ambiente de cooperação social,
política e económica com a Rússia, criam condições para entrar em conflito com
esta potência nuclear, que claramente começa a ficar preocupada e até assustada
com a sua segurança nacional."
"É a política anglo-saxónica que representa uma ameaça". Oleg
Chumakov, Professor de russo na Oxford School e na Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
| LEONARDO NEGRÃO/GLOBAL
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"É a política anglo-saxónica que representa uma ameaça". Oleg Chumakov, Professor de russo na Oxford School e na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
LEONIDAS CHRYSANTHOPOULOS - Embaixador
grego reformado e especialista em assuntos internacionais
"Haverá um confronto entre a Rússia e os EUA na Síria e no
Mediterrâneo Oriental porque a situação lá tornou-se demasiado complicada e é
praticamente impossível impedir que a situação se deteriore ainda mais. Temos
Israel a atuar como agente provocador, o Irão e a Turquia invadiram a Síria,
para não falar da Arábia Saudita. A propaganda contra a Rússia nos EUA não está
a ajudar e ter [John] Bolton como novo conselheiro de segurança nacional é um
desastre. A ONU é inútil e não há ninguém com prestígio para mediar. Mas se o
conflito vai evoluir ou não para uma terceira guerra mundial isso ainda está
para se ver", afirmou Leonidas Chrysanthopoulos ao DN.
"Haverá um confronto entre a Rússia e os EUA na Síria e no
Mediterrâneo Oriental", Leonidas Chrysanthopoulos, Embaixador grego
reformado e especialista em assuntos internacionais
"Haverá um confronto entre a Rússia e os EUA na Síria e no Mediterrâneo Oriental", Leonidas Chrysanthopoulos, Embaixador grego reformado e especialista em assuntos internacionais
MÁRIO CORDEIRO - Pediatra
"A III Guerra Mundial pode acontecer, até porque os aliados de hoje
são inimigos amanhã e o carácter utilitários das pessoas e das nações
sobrepôs-se à noção de aliança e de fidelidade e lealdade", diz ao DN
Mário Cordeiro.
Os tempos são, na opinião do pediatra, "de vingança e
mesquinhez, desprezo pela empatia e pela solidariedade, e corre-se o risco de,
com vários loucos e psicopatas ocupando lugares de poder, a guerra
começar". Considera que "já começou a guerra financeira e
informática, e seguir-se-á, eventualmente, a guerra violenta, de uma forma
nunca vista e sem obedecer às, mesmo que ridículas e discutíveis, regras
militares". Se isso acontecer, prossegue, "o planeta corre risco de sobrevivência".
Para si, que se diz um otimista, "os tempos são muito maus e andamos
porventura demasiado distraídos relativamente a esta questão".
Mário Cordeiro diz que "os períodos 'entre duas guerras' são sempre muito
frágeis e, verdadeiramente, não são de paz, porque há sempre escaramuças e
guerrilhas locais, civis ou regionais, apesar de muitas serem ignoradas".
Desde que o homem inventou armas, "agora de destruição maciça e sem
respeito sequer pela população civil, o risco de hecatombe é real. Muito pior
quando quem decide e pode 'carregar no botão' pensa em interesses políticos,
financeiros, narcisistas ou racistas ente outros".
“A III Guerra Mundial pode acontecer”, Mário Cordeiro, pediatra
| SARA MATOS / GLOBAL
IMAGENS
“A III Guerra Mundial pode acontecer”, Mário Cordeiro, pediatra
| SARA MATOS / GLOBAL IMAGENS
CARLOS COELHO - Eurodeputado do PSD
"Acho que não. Acho que vai prevalecer a abordagem racional,
ninguém tem interesse nesse cenário apocalíptico. Não ajuda nada o tipo de
comunicação incendiária, pelo twitter, do presidente Donald Trump",
afirmou Carlos Coelho ao DN.
"Acho que vai prevalecer a abordagem racional, ninguém tem
interesse nesse cenário apocalíptico", Carlos Coelho, eurodeputado do PSD
| GUSTAVO BOM / GLOBAL
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"Acho que vai prevalecer a abordagem racional, ninguém tem interesse nesse cenário apocalíptico", Carlos Coelho, eurodeputado do PSD
CARLOS ZORRINHO - eurodeputado
PS
Ao DN, Carlos Zorrinho afirmou que é necessário "defender o
multilateralismo". "Os fatores de risco existem e são hoje mais
elevados que nunca. A História mostra-nos que os grandes conflitos raramente
começam da forma mais óbvia e pode haver um fator que, parecendo menos óbvio,
acaba por ganhar grande destaque. O que temos de fazer é continuar a defender o
multilateralismo. Não sendo uma garantia, é confortante saber que EUA, França,
Inglaterra... que os vários canais diplomáticos continuam ativos. É preciso
cumprir aquela velha máxima de fazer a guerra sem armas", acrescentou.
"É preciso cumprir aquela velha máxima de fazer a guerra sem
armas", Carlos Zorrinho, eurodeputado do PS
| PEDRO GRANADEIRO/GLOBAL
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"É preciso cumprir aquela velha máxima de fazer a guerra sem armas", Carlos Zorrinho, eurodeputado do PS
PATRÍCIA MÜLLER - Escritora, autora de "Madre
Paula" e "Uma senhora nunca"
"O momento é indefinido. Relações entre EUA/Rússia são nubladas:
Trump é posto na presidência por Putin e agora ameaçam-se com mísseis por causa
da Síria? Há aqui qualquer coisa que me parece um tremendo bluff e muito jogo
político incoerente.
A diferença de uma possível terceira guerra para as outras
guerras é que, tendo sido o século XX o da solidariedade, algum ensinamento
deixou ao presente na sociedade ocidental: o medo de provocar mortes sem fim,
de destruir o futuro da humanidade. O passado deixou marcas fortes e não
estamos com o espírito da Idade Média. Isto inclui Rússia também, talvez não
Síria,
China ou Coreia do Norte. A haver uma escalada mundial de violência,
acredito que poderá partir daí. A tentativa crescente de se impor da China face
aos EUA ou a loucura da Coreia do Norte podem ser um espoletar como foram a
morte de Francisco Ferdinando ou a invasão da Polónia. E aqui entra uma nova
variável: a tecnologia e a capacidade alargada de impor destruição à distância.
Hiroshima será um brinquedo de crianças ao pé do variado arsenal militar que os
países dispõem - veja-se o ataque químico na Síria.
Por isso, acho que, se for,
será também uma batalha de combate à memória. Uma Terceira Guerra não trará
resultados novos, sabemos o que comporta. Os principais líderes mundiais
arriscam a ressuscitação de fantasmas que ainda não foram enterrados? Acho que
farão de tudo para evitar. Mesmo o Trump", afirmou Patrícia Müller ao DN.
"Acho que farão de tudo para evitar [a guerra]. Mesmo o
Trump", Patrícia Muller escritora
"Acho que farão de tudo para evitar [a guerra]. Mesmo o Trump", Patrícia Muller escritora
ANA RITA CAVACO - Bastonária da Ordem dos Enfermeiros
Diz que não tem "conhecimentos suficientes que permitam dizer que
estamos mais perto da terceira guerra mundial", mas a sua "perceção
empírica" é de que "já estivemos mais longe". Ana Rita Cavaco
considera "é muito preocupante tudo o que vemos nas notícias, a escalada
dos conflitos entre os vários países e a falta de bom senso dos líderes
mundiais, sobretudo dos EUA".
O que dizem, prossegue, "as ameaças que
fazem uns aos outros podem ser só parte do jogo político, mas, do ponto de
vista do cidadão comum, a perceção é que estamos mais perto. Se é real ou não,
não sei responder". O que mais choca a bastonária da Ordem dos Enfermeiros
é que "a vida humana parece que não tem valor nenhum. Mata-se como quem
bebe um copo de água".
“Espero que não. Mas acho que já estivemos mais longe”, Ana Rita Cavaco,
bastonária da Ordem dos Enfermeiros
| FILIPE AMORIM/GLOBAL
IMAGENS
“Espero que não. Mas acho que já estivemos mais longe”, Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros | FILIPE AMORIM/GLOBAL IMAGENS
MARISA MATIAS - Eurodeputada do
BE
"Na Síria está a jogar-se um braço-de-ferro entre as diferentes
potências mundiais, que não tem a ver com a Síria, tem a ver com o Médio
Oriente e os interesses das maiores potências. Estamos num cenário de um mundo
mais multipolar que bipolar - está neste momento a desenvolver-se um braço-de-ferro
EUA/Rússia, mas também entre a Arábia Saudita e a Turquia.
Na Síria, ou no
Iémen, há muito tempo que estamos numa situação de guerra, não nos termos
convencionais que conhecemos, da primeira ou da segunda guerra mundiais, mas
não estamos num contexto de paz. Como é que se vai resolver agora não sou capaz
de antecipar", disse ao DN.
"Não estamos num contexto de paz", Marisa Matias, eurodeputada
do BE
| JORGE AMARAL / GLOBAL
IMAGENS
"Não estamos num contexto de paz", Marisa Matias, eurodeputada do BE
| JORGE AMARAL / GLOBAL IMAGENS
RUI ALMEIDA - Antigo selecionador nacional de
futebol da Síria entre 2010 e 2012
Antigo selecionador nacional sub-23 e AA da Síria entre 2010 e 2012, Rui
Almeida diz que o país que conheceu "nada tem a ver com esta Síria".
"Vivi em Damasco e nada fazia prever o que está acontecer",
acrescentou. "Independentemente das razões de parte a parte, as baixas
humanas são mais do que suficientes para travar este conflito. Fico triste
porque convivi com as pessoas durante um ano e meio", lamentou o treinador
de futebol.
Para o técnico português, "desenvolveu-se um problema político
central que cruza vários problemas daquela região do globo". "A Síria
não é um pais influente. Estão a falar mais alto os interesses dos países ali à
volta. Fico triste", considerou.
“Desenvolveu-se na Síria um problema político central que cruza vários
problemas daquela região do globo”. Rui Almeida, selecionador nacional da Síria
entre 2010 e 2012
| TWITTER BASTIA
“Desenvolveu-se na Síria um problema político central que cruza vários problemas daquela região do globo”. Rui Almeida, selecionador nacional da Síria entre 2010 e 2012
| TWITTER BASTI
A
Vladimir Pliassov, prof. universitário, Centro de
Estudos Russos da Fac. Letras da Universidade de Coimbra
"Ninguém quer guerra, toda a gente quer estabilidade. Apesar das
ameaças de Donald Trump, não acredito que haja guerra entre Rússia e Estados
Unidos", diz ao DN Vladimir Ivanovitch Pliassov, professor universitário,
responsável pelo Centro de Estudos Russos da Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra.
"Até porque os Estados Unidos nunca fizeram
guerra contra uma potência contra a qual correm e também se sentiriam
ameaçados", sublinha o professor que foi viver para Coimbra em 1988 e,
desde então, se tem dedicado a promover a língua, a história e a cultura russas
além-fronteiras.
"Não acredito que haja guerra entre Rússia e Estados Unidos",
diz ao DN Vladimir Ivanovitch
| "Não acredito que haja guerra entre Rússia e Estados Unidos", diz ao DN Vladimir Ivanovitch
| FERNANDO FONTES/GLOBAL IMAGEN
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FERNANDO FONTES/GLOBAL
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