Da Revolução ao Crime: as raízes ideológicas do Comando Vermelho e a herança no PCC
O Comando Vermelho não nasceu do nada. Surgiu de um encontro improvável e explosivo: o dos criminosos comuns com os terroristas da esquerda armada durante os anos de chumbo do regime militar.
A convivência forçada entre assaltantes, sequestradores e guerrilheiros
em presídios como o da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, deu origem à fusão entre
o discurso político revolucionário e a prática criminosa.
Sob a tutela de terroristas do MR-8 e da VAR-Palmares, os presos comuns aprenderam a se organizar, a impor disciplina e a enxergar o Estado como inimigo. Nascia ali a semente do que se tornaria o Comando Vermelho (CV) — inicialmente chamado Falange Vermelha, com o lema “Paz, Justiça e Liberdade”.
Um slogan que poderia
estar em qualquer panfleto de guerrilha, mas que passaria a ecoar nas bocas dos
chefes do tráfico.
Do ideal à degeneração
A
retórica de esquerda foi sendo diluída pelo pragmatismo do lucro, mas os
símbolos da revolta permaneceram — a cor vermelha, a ideia de que o Estado é o
inimigo e o crime, uma forma de libertação.
Essa
narrativa encontrou eco em parte da elite intelectual brasileira, que nas
décadas seguintes romantizou o criminoso como vítima social e passou a culpar o
Estado pela violência.
O
resultado foi uma perigosa inversão moral: o bandido virou personagem político,
e o crime, consequência da “injustiça estrutural”.
O herdeiro paulista
Os fundadores assumiram o mesmo lema (“Paz, Justiça e Liberdade”) e copiaram seu modelo de organização.
Mas o contexto era outro: o PCC surgiu após o massacre
do Carandiru, um trauma coletivo que reforçou a percepção de guerra entre
presos e Estado.
Mesmo sem convivência com militantes políticos, o PCC herdou a retórica antissistema e igualitarista.
Falava em “direitos dos presos” e “resistência ao sistema
carcerário” — um vocabulário que reflete a linguagem política da esquerda.
Com o tempo, tornou-se um poder paralelo racionalizado, com códigos próprios, disciplina quase leninista e domínio territorial.
A retórica de “libertação”
sobreviveu como justificativa moral para o poder armado.
A herança simbólica da revolta
O
que começou como discurso político virou narrativa de legitimação, usada para
justificar a violência e organizar o poder nas periferias.
De
certo modo, o crime organizado brasileiro nasceu impregnado da lógica do
“inimigo do sistema” — uma lógica que ainda ecoa, de forma disfarçada, em parte
da academia e da mídia.
Ao romantizar o bandido e demonizar a autoridade, o país acabou naturalizando a criminalidade como forma de expressão política.
E, com isso, abriu espaço para
que facções se tornassem atores morais e territoriais, ocupando o vácuo deixado
pelo Estado.
Conclusão
O
PCC, por sua vez, é o herdeiro pragmático dessa herança ideológica — mais
racional, mas movido pela mesma narrativa moral.
Ambos
mostram como o Brasil transformou o discurso de revolta em cultura de poder.
Enquanto os mais brutais criminosos forem tratados como “vítimas da sociedade”, não há a menor chance de resolver o maior problema do país.

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