DA REVOLUÇÃO AO CRIME: AS RAIZES IDEOLÓGICAS DO COMANDO VERMELHO E A HERANÇA DO 'PCC'

 


Da Revolução ao Crime: as raízes ideológicas do Comando Vermelho e a herança no PCC

O Comando Vermelho não nasceu do nada. Surgiu de um encontro improvável e explosivo: o dos criminosos comuns com os terroristas da esquerda armada durante os anos de chumbo do regime militar. 


A convivência forçada entre assaltantes, sequestradores e guerrilheiros em presídios como o da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, deu origem à fusão entre o discurso político revolucionário e a prática criminosa.


Sob a tutela de terroristas do MR-8 e da VAR-Palmares, os presos comuns aprenderam a se organizar, a impor disciplina e a enxergar o Estado como inimigo. Nascia ali a semente do que se tornaria o Comando Vermelho (CV) — inicialmente chamado Falange Vermelha, com o lema “Paz, Justiça e Liberdade”


Um slogan que poderia estar em qualquer panfleto de guerrilha, mas que passaria a ecoar nas bocas dos chefes do tráfico.


Do ideal à degeneração

Nos primeiros anos, o CV ainda carregava traços de um romantismo político. Falava-se em “justiça social” e “resistência ao sistema opressor”, embora a prática logo revelasse outra natureza: a do domínio armado e da economia do crime.

A retórica de esquerda foi sendo diluída pelo pragmatismo do lucro, mas os símbolos da revolta permaneceram — a cor vermelha, a ideia de que o Estado é o inimigo e o crime, uma forma de libertação.


Essa narrativa encontrou eco em parte da elite intelectual brasileira, que nas décadas seguintes romantizou o criminoso como vítima social e passou a culpar o Estado pela violência.


O resultado foi uma perigosa inversão moral: o bandido virou personagem político, e o crime, consequência da “injustiça estrutural”.


O herdeiro paulista

Duas décadas depois, em 1993, nascia no presídio de Taubaté o Primeiro Comando da Capital (PCC) — diretamente inspirado no CV.

Os fundadores assumiram o mesmo lema (“Paz, Justiça e Liberdade”) e copiaram seu modelo de organização. 


Mas o contexto era outro: o PCC surgiu após o massacre do Carandiru, um trauma coletivo que reforçou a percepção de guerra entre presos e Estado.


Mesmo sem convivência com militantes políticos, o PCC herdou a retórica antissistema e igualitarista. 


Falava em “direitos dos presos” e “resistência ao sistema carcerário” — um vocabulário que reflete a linguagem política da esquerda.


Com o tempo, tornou-se um poder paralelo racionalizado, com códigos próprios, disciplina quase leninista e domínio territorial. 


A retórica de “libertação” sobreviveu como justificativa moral para o poder armado.


A herança simbólica da revolta

O paralelo entre CV e PCC mostra como a ideologia revolucionária dos anos 1970 foi reciclada e adaptada ao submundo do crime.

O que começou como discurso político virou narrativa de legitimação, usada para justificar a violência e organizar o poder nas periferias.


De certo modo, o crime organizado brasileiro nasceu impregnado da lógica do “inimigo do sistema” — uma lógica que ainda ecoa, de forma disfarçada, em parte da academia e da mídia.


Ao romantizar o bandido e demonizar a autoridade, o país acabou naturalizando a criminalidade como forma de expressão política. 


E, com isso, abriu espaço para que facções se tornassem atores morais e territoriais, ocupando o vácuo deixado pelo Estado.

Conclusão

Do ponto de vista antropológico, o Comando Vermelho é o elo perdido entre a esquerda armada e o crime organizado.

O PCC, por sua vez, é o herdeiro pragmático dessa herança ideológica — mais racional, mas movido pela mesma narrativa moral.


Ambos mostram como o Brasil transformou o discurso de revolta em cultura de poder.


Enquanto os mais brutais criminosos forem tratados como “vítimas da sociedade”, não há a menor chance de resolver o maior problema do país.

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