Escrevo direto da terra das charqueadas. Aqui, nos ontontem, muito gado era abatido à beira da Lagoa dos Patos, o couro curtido seguia de navio para Europa e a carne salgada era destinada principalmente para ao Caribe como alimento dos escravos. Pois é, os broder da Jamaica já compunham reggae à espera de um cozido a base de charque.
A confusão entre charque e carne de sol
O charque, que atende também por carne seca ou jabá, tem uma salga bem mais forte que a carne-de-sol, e é seco ao sol e ao vento. O Nordeste e o Sul produzem essa variedade.
Já a carne-de-sol, alimento popular no Norte do Brasil, também é uma carne salgada que seca ao sol e ao vento, mas ela mantém a cor avermelhada e tem uma salgação mais leve.
Os dois tipos carecem de ser dessalgados com um dia de antecedência. Lave bem a carne e deixe de molho em água abundante durante toda a noite. Para facilitar, convém cortar a carne em pedaços não muito pequenos.
O arroz de carreteiro, preparo típico da culinária separatista, digo, do Rio Grande do Sul, tem sua origem nas tropeadas, onde o charque e o arroz eram ingredientes não perecíveis. Seu preparo era simples: gordura e sal já estavam na carne, era só fritar numa panela de ferro cascurrenta, agregar o arroz e água quente, e pronto.
Buenas, receita de carreteiro, com diversas variações e ingredientes desavisados, tem aos montes na rede. Por isso, anexo essa duas receitas diferentes. A primeira é invenção minha, uma espécie de estrogonofe de carne seca. A outra é uma variação do famoso bobó nordestino onde o charque substitui o camarão.
Charque Chique
Para uns dez viventes, vais precisar de um quilo bem pesado de charque, uns dois quilos de cebola e dez dentes de alho. Quatro cenouras bonitas e um vidro comprido de aspargos em conserva. Para temperar, uma xícara de shoyu, meia xícara de molho inglês, e dois copos de vinho branco. Para finalizar, uma xícara de farinha de trigo e duas xícaras de creme de leite. Além do azeite de oliva, sal e pimenta preta.
Pique o charque em tiras como para estrogonofe e deixe de molho em água fria por 24 horas. No azeite de oliva, refogue a cebola e o alho picados, e a cenoura em cubinhos. Agregue o charque, o vinho, o shoyu e o molho inglês. Cozinhe em panela tampada e fogo médio por uma hora. Vai se colocando água quente se secar.
Coloque a farinha misturada com água fria e mexa até ficar um molho espesso, agregando mais farinha se necessário. Acrescente os aspargos em pedaços, misture com carinho e deixe aquecer bem.
Sirva com uma colher de creme de leite por cima. Acompanha arroz branco puxado no limão e no tomilho e, geleia de pêssego apimentada.
Esse preparo é bem invernoso e um vinho tinto seria uma boa pedida.
Bobó de Charque
Para começar, meio quilo de carne seca dessalgada, cozida e desfiada, e um quilo de aipim (mandioca) cozido na água e sal. Para refogar uma colher de sopa de manteiga, uma cebola ralada, meia xícara de chá de azeite de dendê. Para dar gosto, um vidrinho de leite de coco, dois tomates sem sementes picados, meio pimentão vermelho picadinho e uma xícara de salsa e cebolinha e, pros que gostam, coentro, tudo picadinho. Para ficar mais autêntico pode-se agregar um punhado valente de caju ou amendoim torrado e moído.
Não pode faltar sal e pimenta dedo de moça sem sementes. Dá para uns seis elementos de fome mediana.
Vamos lá. Cozinhe o aipim e, com ele bem quente ainda, retire os filamentos. Faça um purê, batendo no liquidificador com algumas conchas da água do cozimento. Deixe ao alcance. Frite a cebola na manteiga até ficar bem dourada. Junte a carne seca e refogue bem, acrescentando o dendê e a pimenta. Mexa com vontade. Adicione o leite de coco, o tomate, o pimentão e metade das ervas. Deixe cozinhar por 10 minutos em fogo médio. Junte o purê e misture bem. Retire do fogo e junte as ervas restantes.
Sirva quente, acompanhado de arroz branco e bananas-da-terra fritas em rodelas. Uma cachacinha para dar apetite e alguma cerva de sua preferência para os entrementes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário