Fortaleza - Os livros de Silas Malafaia, que vendem milhões de exemplares no Brasil, têm títulos como "Como vencer as estratégias de Satanás" e "Lições de vencedor". O jatinho particular no qual ele voa tem a frase "Favor of God", em inglês, inscrita na aeronave.
Como pastor evangélico de televisão, Malafaia alcança telespectadores em dezenas de países, incluindo os Estados Unidos, onde o Daystar e a Trinity Broadcasting Network transmitem seus sermões dublados. Há mais de 30 anos, Malafaia, que tem 53, reúne igrejas e empreendimentos prósperos ao redor de sua pregação pentecostal.
Mesmo assim, ele poderia ter conquistado pouca atenção além da de seus seguidores se não tivesse entrado na versão brasileira das guerras culturais. Afinal, o Brasil tem líderes evangélicos que comandam grandes impérios, como Edir Macedo, cuja Igreja Universal do Reino de Deus controla a Rede Record, uma das maiores redes de televisão do país. Outros, como Romildo Ribeiro Soares, da Igreja Internacional da Graça de Deus, são conhecidos por um maior zelo missionário.
Mas é Malafaia que recentemente vem atraindo mais atenção, com seus agressivos ataques verbais contra diversos inimigos, incluindo os líderes do movimento brasileiro pelos direitos dos homossexuais e os defensores do direito ao aborto e da descriminalização da maconha.
"Sou o inimigo público número 1 do movimento gay no Brasil", afirmou Malafaia em entrevista concedida em novembro, em Fortaleza, cidade do Nordeste aonde ele veio liderar uma de suas "cruzadas", como ele chama seus eventos, que misturam as escrituras e música diante de cerca de 200 mil participantes. Lágrimas corriam pelo rosto de alguns dos participantes mais apaixonados, enquanto outros dançavam ao som dos artistas que faziam o show de abertura.
Antes de subir ao púlpito, ele descreveu o quanto se tornou cobiçado em talk shows de televisão, como parceiro de debate de líderes gays. No entanto, essa é apenas uma pequena parte de seu repertório, e a televisão é apenas uma das muitas mídias à disposição de Malafaia. No Twitter, ele tem quase 250 mil seguidores, e em seus vídeos divulgados no YouTube ele critica não apenas inimigos liberais, mas também jornalistas e líderes evangélicos rivais.
Não é de surpreender que sua crescente importância o tenha transformado em fonte de admiração e inquietação. Ele mobilizou milhares de pessoas para marchar em Brasília este ano, em protesto contra um projeto de lei que expande a legislação antidiscriminação para incluir orientação sexual.
"Ele é como Pat Robertson, no sentido de ser pioneiro em levar a direita evangélica brasileira para o ambiente político nacional", afirmou Andrew Chesnut, especialista em religiões da América Latina da Virginia Commonwealth University, comparando Malafaia ao evangélico conservador da televisão americana.
A elite brasileira está buscando entender a ascensão de uma figura tão polarizadora, e como tal ascensão pode influenciar a política do país. A Piauí, uma revista mais ou menos equivalente à americana The New Yorker, publicou um longo artigo este ano sobre a ascensão de Malafaia da obscuridade no Rio de Janeiro, onde ele cresceu numa família militar, ao poder que hoje ele exerce.
Num artigo publicado em novembro, a jornalista Eliane Brum escreveu sobre a intolerância mostrada em relação aos ateus no Brasil por parte de algumas denominações, descrevendo o que ela chamou de "uma disputa cada vez mais agressiva por participação de mercado" entre as grandes igrejas.
O artigo de Brum gerou uma onda de reações de pentecostais. As palavras de Malafaia estiveram entre as mais cáusticas.
Durante a entrevista concedida em Fortaleza, ele chamou Brum de "vagabunda" e repetiu seu argumento de que "ateus comunistas" da antiga União Soviética, Camboja e Vietnã foram responsáveis por mais mortes do que "qualquer guerra produzida por motivos religiosos".
Intencionalmente ou por hábito, sua linguagem agressiva muitas vezes se transforma em espetáculo. Em novembro, a revista Época relatou que Malafaia, durante comentários inflamados sobre tomar medidas legais contra Toni Reis, importante defensor dos direitos dos homossexuais, disse que "fornicaria" com Reis.
Malafaia lançou uma explicação de que ele na verdade tinha usado a palavra "funicar". Embora pesquisadores não tenham conseguido encontrar a palavra usada por Malafaia em dicionários de referência, ele afirmou ser uma gíria com o significado de "arrebentar".
A visibilidade que Malafaia alcança com episódios como esse vem alimentando questionamentos sobre suas ambições políticas. Ele afirmou não desejar concorrer a cargos eleitorais porque isso o limitaria a um partido político específico, portanto reduzindo a ampla visibilidade que ele tem hoje.
"Deus me chamou para ser pastor", ele disse, "e não troco isso por ser político".
Mas influência política é outra questão. Malafaia afirmou ter votado duas vezes no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e por anos desfrutou de acesso aos corredores do poder de Brasília. No entanto, ele também contou um caso sobre a sucessora de Lula, a presidente Dilma Rousseff, que sugere a importância das figuras religiosas nas eleições nacionais.
Malafaia contou ter falado com Dilma por telefone durante 15 minutos durante a campanha presidencial do ano passado. Ela tentava ganhar seu apoio. Mas ele afirmou ter recusado por conta de diferenças ideológicas com setores do Partido dos Trabalhadores e com Dilma, que já participou de um grupo urbano de guerrilha.
"Eu disse a ela: 'Não tenho nada pessoal contra você. Acho você uma mulher inteligente, qualificada'", contou Malafaia. "Mas como posso votar em você se você passou quatro anos lutando com um grupo de seu partido para apoiar um projeto de lei para beneficiar os gays, me prejudicando?"
Malafaia, com anéis de ouro e diamantes nos dedos, conta essas histórias com um forte sotaque carioca.
Sua imagem pública lhe confere quase um status de rock star entre alguns apoiadores.
"Eu não o reconheci sem o bigode", disse Erineide Mendonça, 39, funcionária do hotel em Fortaleza onde Malafaia estava hospedado, referindo-se à marca registrada que ele tirou há pouco tempo. "Mas eu reconheço a voz dele", ela afirmou, pedindo para ser fotografada com o pastor que ela adora.
Malafaia e sua esposa, Elizete, estudaram psicologia. Quando ele sobe ao púlpito, sua voz ecoa em sermões carregados de lições de autoajuda e perseverança.
Um dos temas preferidos envolve o sucesso e como alcançá-lo. Embora ele defenda que ainda vive de forma relativamente humilde e não é milionário, Malafaia não se desculpa por sua própria ascensão material. Na verdade, ele a celebra, promovendo, por exemplo, seu Mercedes-Benz _ um presente, ele explica, dado por um amigo rico.
E tem também o jatinho particular Gulfstream, adquirido de segunda mão nos Estados Unidos, segundo disse, não por ele próprio, mas por sua organização religiosa sem fins lucrativos, a um preço razoável.
"O papa voa num jato jumbo", ele disse, referindo-se ao avião fretado da Alitalia que transporta o bispo de Roma, irritado com o que considera o uso de dois pesos e duas medidas em relação aos líderes evangélicos em ascensão. "Mas se um pastor viaja num jatinho velho, ele é considerado ladrão".
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