Delcídio do Amaral: ‘A’
testemunha
Nos últimos doze anos, o senador acompanhou de dentro o lado sombrio dos governos petistas.
Viu o nascimento dos esquemas de corrupção, seus desdobramentos financeiros e
eleitorais, participou dos esforços para debelá-los e agora pode apontar com
precisão quem são os mentores e beneficiários
Saída de Delcídio é o mais duro golpe para a articulação política do
governo Dilma (Ueslei Marcelino/Reuters)
Para entender a magnitude da prisão,
na semana passada, de Delcídio do Amaral, senador petista e líder do governo, é
preciso até um pouco de imaginação.
Pois imaginemos que nenhum empresário preso
na Operação Lava-Jato tivesse até hoje quebrado o silêncio nas delações
premiadas - ou que nenhum político estivesse na lista que a Procuradoria-Geral
da República mandou para o Supremo Tribunal Federal (STF).
Mesmo no cenário
irreal acima, a prisão de Delcídio e a possibilidade de ele recorrer à delação
premiada - uma vez que foi abandonado pelo PT, ignorado por Dilma e ofendido
por Lula - terão consequências devastadoras para a estabilidade do já
cambaleante regime lulopetista.
Delcídio do Amaral testemunhou os momentos mais
dramáticos dos escândalos do governo do ex-presidente.
Viveu e participou
desses mesmos momentos no governo Dilma.
Delcídio não é uma testemunha.
Ele é
"a" testemunha - e a melhor oportunidade oferecida à Justiça até
agora de elucidar cada ação da entidade criminosa que, nas palavras do ministro
Celso de Mello, decano do STF, "se instalou no coração da administração
pública".
Terminada uma reunião no gabinete de
Dilma Rousseff, em junho passado, Delcídio chamou-a de lado e disse a seguinte
frase:
"Presidente, a prisão (de Marcelo Odebrecht) também é um
problema seu, porque a Odebrecht pagou no exterior pelos serviços prestados por
João Santana à sua campanha".
Delcídio contrariou o diagnóstico de Aloizio
Mercadante, que ainda chefiava a Casa Civil, segundo quem a prisão de Marcelo
Odebrecht "era problema do Lula".
Ao deixar o Palácio do Planalto,
Delcídio definiu Dilma a um colega de partido como "autista",
espantado que ficou com o aparente desconhecimento da presidente sobre o
umbilical envolvimento financeiro do PT com as empreiteiras implicadas na
Lava-Jato.
Na reunião, Dilma dissera aos presentes que as repercussões da
operação nada mais eram do que uma campanha para "criminalizar" as
empreiteiras e inviabilizar seu pacote de investimento e concessões na área de
infraestrutura.
"A Dilma não sabe o que é passar o chapéu porque passaram
o chapéu por ela", concluiu Delcídio.
Passar o chapéu é bater na porta das
empreiteiras e pedir dinheiro para campanhas políticas.
Quando feitas dentro da
lei, as doações não deixam manchas no chapéu.
Mas, quando fruto de propinas
como as obtidas nos bilionários negócios com a Petrobras, a encrenca, mesmo que
seja ignorada por sua beneficiária, não vai embora facilmente.
Menos de um mês
após a reunião no Planalto, a Polícia Federal divulgou as explosivas anotações
com que Marcelo Odebrecht incentivava seus advogados a encontrar uma maneira de
fazer chegar a Dilma a informação de que as investigações sobre as contas da
empreiteira na Suíça bateriam nela.
Poucos políticos tiveram mais acesso
do que Delcídio aos bastidores do mensalão e do petrolão.
Poucos políticos
conhecem tão bem como ele as entranhas da Petrobras, onde trabalhou e fez
amigos.
Poucos políticos têm tanto trânsito como ele nos gabinetes mais
poderosos da política e da iniciativa privada.
Até ser preso, Delcídio atuava
como bombeiro, tentando reduzir os focos de tensão existentes para Lula, Dilma
e o PT.
Na condição de encarcerado, é uma testemunha decisiva.
A possibilidade
de ele colaborar com os investigadores está sob avaliação de sua família.
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