Publicado na edição impressa de VEJA
J. R. GUZZO
Todo brasileiro de olhos abertos para o que está acontecendo no país em geral, e na sua própria vida em particular, sabe muito bem que a coisa está preta.
Há mil e uma razões para isso, como se pode verificar todos os dias pelo noticiário; seria pretensioso, além de inútil, tentar fazer uma lista de todas.
Basta dizer, para encurtar o assunto, que, segundo as últimas pesquisas de opinião, mais de 70% da população acha que assim não vai, e quer mudanças na ação do governo como um todo.
Será que os brasileiros, finalmente, se convenceram de que estão sendo dirigidos por um dos governos mais incompetentes que já tiveram de aguentar – ou, possivelmente, o mais incompetente de todos?
Mais interessante ainda: a propaganda descomunal que o poder público soca todos os dias em cima da população e o uso sistemático da mentira talvez já não estejam dando os resultados que costumam dar.
A presidente Dilma Rousseff, por exemplo, ameaça combater a corrupção na Petrobras, mas diz que os “inimigos da empresa” são os que sugeriram mudar seu nome para “Petrobrax”, cerca de quinze anos atrás, com a intenção secreta de liquidá-la – e, ao mesmo tempo, faz tudo para impedir que se investigue a roubalheira pública de hoje.
Quanta gente acredita num desvario desses? Tudo bem.
O Brasil está em petição de miséria, e o presente já é um caso perdido.
A pergunta, agora, é a seguinte: as coisas vão mudar para melhor depois da eleição presidencial de outubro ou vão ficar piores ainda?
Vão ficar piores, com certeza, se o Brasil não sair da armadilha que o governo, o PT e o ex-presidente Lula montaram: eles têm de ganhar todas, pois não podem mais admitir a alternância de poder.
Se admitirem, a casa cai, e a casa não pode cair – pois os que mandam no país não conseguem mais viver fora do governo.
Manter-se no poder todo mundo quer, nas melhores democracias do mundo.
O problema atual do Brasil é que o PT não apenas quer continuar: precisa continuar, pois, se sair, o mundo de privilégio que construiu para si próprio nos últimos onze anos vai direto para o espaço.
É essa ansiedade, e nada mais, que acaba de trazer Lula para dentro da campanha eleitoral – se Dilma continuar caindo nas pesquisas, é pouco provável que ele próprio e seu partido digam “que pena”, e fiquem só olhando o desastre acontecer na sua frente.
Aí, para não perderem a situação de proprietários privados do Brasil que conseguiram obter de 2003 para cá, tudo passa a valer: a presidente pode ser desembarcada sem maior cerimônia do seu posto de candidata à reeleição, e Lula entraria na disputa para salvar a pele de todos.
Como explicar essa deposição de Dilma para o público? Inventa-se uma história qualquer – esse tipo de coisa jamais foi problema para Lula, um artista em escapar das situações mais sinistras sem explicar nada.
A companheirada, por sua vez, dirá que lamenta – mas que a volta de Lula é essencial para salvar o “projeto do PT”, caso ele esteja ameaçado de “destruição” pela “direita”, pela “grande mídia”, pelos que “não se conformam” com a vitória da classe operária etc.
Se a oposição ganhar, dizem, será a “volta da ditadura” – e não é possível permitir tal crime.
“Projeto do PT”? Que diabo seria isso? Nada mais simples: o projeto do PT é não ter projeto nenhum.
Em vez de trabalhar para construir um Brasil mais justo, confortável e promissor para os brasileiros, todo o esforço do partido se concentra em não largar o osso do governo. Não se trata de desejo: é necessidade.
O que muda, se saírem, não é nada que tenha a ver com ideias, princípios ou valores; o que muda, no duro, é a sua vida material. Vão-se embora os 20 000 altos empregos que têm no governo federal.
Vão-se embora as oportunidades ilimitadas de negócios com o poder público. Vão-se embora as Pasadenas, os mensalões, a compra de certas empresas de videogames por empreiteiras de obras, na base dos 10 milhões de reais.
Ficam as fortunas criadas nos porões da Petrobras. Ficam as rosemarys, os youssefs e milhares de outros como eles.
Ficam o caviar de Roseana Sarney, os jatinhos, os planos médicos milionários.
Ficam as diárias de hotel a 8 000 euros. Fica um STF obediente. Mais que tudo, fica garantida a impunidade.
O PT, como observou há pouco o ex-deputado Fernando Gabeira, é um partido que se baseia totalmente na obediência; não valem nada, ali, mérito, talento ou competição sadia.
A única maneira de subir na vida é obedecendo a Lula – e para isso é indispensável que Lula, ou algum dos seus postes, esteja no governo.
Tags: Brasil, Dilma Rousseff, eleição, Fernando Gabeira, Lula, Petrobras, PT
‘A grande família petista’, editorial do Estadão
Publicado no Estadão deste sábado
Nem é preciso fazer escavações profundas.
Arranhe-se apenas a superfície do sistema petista de poder e, certo como a noite que se segue ao dia, se encontrará um escândalo, uma maracutaia, uma armação, uma negociata, um vexame, um ato mal explicado ou inexplicável à luz da ética pública.
E não se diga que é intriga da oposição em ano eleitoral.
Para ficar apenas na safra da semana, ora é uma auditoria da Petrobrás que afirma que em 5 de fevereiro de 2010 alguém foi autorizado verbalmente a sacar US$ 10 milhões de uma conta da Refinaria de Pasadena, na qual a empresa ainda tinha como sócia a Astra Oil.
A revelação foi publicada pelo Globo.
Quem autorizou, quem sacou, o porquê do saque e o que foi feito com a bolada, isso a Petrobrás não conta.
Diz, burocraticamente, que o procedimento seria “uma atividade usual de trading” e nele “não foram constatadas quaisquer irregularidades”.
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