Você sabe o que é uma “pemmican”? Essa palavra deriva do termo
“cree pimîhkân”, em si derivado da palavra pimî, ou “gordura”.
É um alimento
semelhante às nossas atuais barras energéticas. Enquanto elas são feitas
normalmente de cereais e outros alimentos, a pemmican era uma mistura
concentrada de gordura e proteína composta principalmente de carne seca de
bisão, alce ou veado.
O mantimento era
popular entre exploradores do Ártico e da Antártica – por exemplo, era a comida
preferida de Robert Peary, conforme relatado no livro “Secrets of Polar
Travel”. Peary pode ter sido a primeira pessoa a chegar ao Polo Norte, em 1909.
A pemmican tem
muito mais do que cem anos, no entanto. Evidências arqueológicas sugerem que
esse “café da manhã dos campeões” existia desde pelo menos 2800 aC.
Nessa época,
caçadores antigos que perseguiam bisões nas Grandes Planícies da América do
Norte misturavam sua carne, sua gordura e sua medula em barrinhas densas em
energia com uma excelente vida útil.
Certamente, o
alimento durava muito mais do que simplesmente comer a carne do bisão no
momento da caça. Segundo os cientistas, uma única barrinha era válida por anos
e podia conter até 3.500 calorias.
Histórico indígena
Os arqueólogos
acreditam que foi a nutrição da pemmican que ajudou populações antigas das
Planícies a se moverem e se espalharem, se desenvolvendo em vários grupos
indígenas através do norte dos EUA e do Canadá.
“A pemmican é uma
barra de energia indígena antiga legítima”, disse Shane Chartrand, cozinheiro
da Enoch Cree Nation, uma reserva indígena de Alberta, no Canadá.
O livro de
receitas de Chartrand contém instruções para fazer uma pemmican à base de
salmão. Aparentemente, não é um alimento delicioso, mas sim estimado por seu
valor nutritivo.
“O propósito de
algumas coisas não é ter bom gosto; é fazer você sobreviver. Eu cacei toda a
minha vida. Quando você está lá fora, está morrendo de fome e pode sentir seu
corpo falhando, cansado e com açúcar baixo, não importa se o sabor é bom. Você
quer algo que o ajude a viver e a seguir em frente. Isso é pemmican”, explica.
Produto prestigiado até a extinção
Conforme
diferentes culturas, da Enoch Cree à Ojibwe à Blackfoot à Sioux, lançaram suas
próprias versões da pemmican ao longo de milênios, as receitas do alimento
foram variando.
A maioria usa
carne de bisão, enquanto algumas versões optam por carne de veado ou peixe.
Outros ingredientes possíveis são cerejas ou bagas secas. Por fim, há quem
cozinhasse a mistura em um ensopado conhecido como rubaboo (prato
tradicionalmente feito de ervilhas e/ou milho, com gordura de urso ou porco e
engrossado com farinha).
Nos anos 1770, a
pemmican se tornou um alimento desejado por comerciantes de peles que estavam
expandindo seus negócios no Canadá, à época controlado pelos britânicos. Os
viajantes precisavam de muitas calorias para remar suas canoas cheias de
mercadorias, e a pemmican era uma refeição muito mais adequada do que suas dietas
comuns dominadas por milho.
Aos poucos, uma
comunidade de caçadores de bisão descendentes de viajantes franceses e suas
esposas indígenas, os Métis, passaram a dominar o comércio de pemmican. No
início dos anos 1800, o produto era tão cobiçado que uma verdadeira guerra,
conhecida como “Pemmican War” ou “Guerra Pemmican”, estourou entre comerciantes
de pele, colonos e os Métis.
No fim das contas,
a popularidade da pemmican foi o que causou seu fim: na década de 1880, a caça
excessiva levou à quase extinção do bisão-americano, tornando o produto
escasso.
Quer experimentar?
A barra energética
original da América pode não parecer tão gostosa hoje quanto já foi para
caçadores e exploradores antigos, mas talvez valha a pena conhecer seu sabor
ligeiramente agridoce e entender de onde veio todo o “hype”.
Algumas
comunidades indígenas ainda fazem pemmican e, ao que tudo indica, não é tão
difícil: você só precisa de banha, carne, bagas e paciência para esperar esses
ingredientes secarem.
Você até pode
facilitar as coisas comprando carne seca e frutas secas prontas, mas o
resultado ficará longe de ideal (explicamos abaixo).
Receita
A receita abaixo
foi inspirada na original, disponível em FirstNations.org.
Ingredientes
1 xícara de carne
seca (bisão, carne de veado ou simplesmente bife)
1/3 de xícara de
frutas secas
2 colheres de sopa
de banha (não substitua por manteiga)
Opcional: açúcar a
gosto
Modo de fazer
O primeiro passo é escolher a carne –
melhor que seja magra. Você deve cortá-la em tiras contra a fibra (pode
esfriá-la no freezer por uma hora antes para tornar essa tarefa mais fácil), e
em seguida colocá-la em um forno pré-aquecido no fogo mais baixo, geralmente em
torno de 75 graus Celsius.
O objetivo é secar a carne. Lembre-se
de que ela vai encolher à medida que seca – por exemplo, cerca de 680 a 900
gramas de carne crua renderão cerca de 1,5 a 2 xícaras quando secas.
Dependendo da espessura da peça
original, pode levar até 12 horas para a carne secar completamente. Você saberá
que ela está pronta quando estiver com aparência seca, mas ainda assim
flexível.
Comprar carne seca pronta pode parecer
um bom atalho, mas a carne seca comercial vem com conservantes como nitratos
que alteram negativamente o sabor final, além de ser cortada a favor da fibra e
portanto mais difícil de moer até virar pó (o que você terá que fazer em
breve).
Depois de secar a carne, é hora de
secar as frutas escolhidas. É melhor que seja uma baga. Os ingredientes
tradicionais eram frutos da Prunus virginiana e da Amelanchier
alnifolia, provavelmente complicados de se achar. Mirtilos, cranberries,
oxicoco e outras bagas devem funcionar.
Para secá-las, use um desidratador de
alimentos ou um forno em fogo baixo. Dependendo do equipamento, o tempo para
secar as bagas pode variar muito, de várias horas a um dia inteiro. Se você
estiver usando um forno, corte ou fure a casca das frutas para permitir que o
suco evapore. Você saberá que elas estão prontas quando estiverem completamente
secas, sem suco.
Agora vem a banha. Se você não tiver
banha de porco sobrando na geladeira, pode comprá-la (procure opções não
hidrogenadas, pois muitas banhas comerciais levam conservantes prejudiciais) ou
fazê-la. Para fazer uma banha de alta qualidade, encomende gordura no açougue
local. Não, ninguém deve achar estranho – pessoas fazem e usam banha de porco
por várias razões, e vender gordura não é tão incomum assim.
Primeiro refrigere a gordura no freezer
e depois corte-a em cubos pequenos. Coloque esses cubos em uma panela com ¼ de
xícara de água em fogo baixo. O processo normalmente leva de duas a quatro
horas. Mexa a panela ocasionalmente. Você saberá que está pronto quando a
maioria dos cubos tiver liquidificado. Filtre quaisquer resíduos e coloque o
líquido em um recipiente hermético. Deixe em temperatura ambiente até que
comece a endurecer e depois guarde na geladeira.
Chegou o momento de moer a carne e as
frutas secas. Você pode usar um processador de alimentos ou, se quiser
experimentar algo mais semelhante ao método tradicional de batê-las com uma
pedra, usar as mãos e um pilão.
Misture os pós em uma tigela. Derreta e
acrescente duas colheres de sopa de banha. Mexa tudo até que a mistura fique
grudenta o suficiente para formar bolinhos. Você pode adicionar mais uma colher
de sopa de banha se notar que a mistura continua ainda muito “poeirenta”. Se
quiser adicionar açúcar, coloque cerca de uma colher de sopa.
Forme bolinhos com a massa final e
deixe secar. O resultado pode não ser lindo, mas aparência não impede as
pessoas de comerem as barras energéticas atuais, não é mesmo? E, se tiver saco
para fazer esse processo todo, nos diga o que você achou! [AtlasObscura]
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