Na Irlanda está o maior número de Sheela na Gigs conhecidos. No livro The Sheela-na-Gigs of Ireland and Britain: The Divine Hag of the Christian Celts – An Illustrated Guide (Guia Ilustrado – A Divina Bruxa dos Celtas Cristãos), Jack Roberts e Joanne McMahon citam 101 exemplares localizados na Irlanda e apenas 45 na Grã-Bretanha, mas podem eles podem ser encontrados em toda a Europa ocidental e central.
Um dos melhores exemplares mais preservados se localiza na Round Tower em Rattoo, no Condado de Kerry na Irlanda. Outro bem conhecido pode ser visto em Kilpeck, em Herefordshire, na Inglaterra.
O que torna essas esculturas tão intrigantes é o fato de estarem predominantemente em edifícios religiosos medievais, como igrejas e locais monásticos. Estudiosos dizem que os entalhes protegem da morte e do mal. Outras figuras grotescas como gárgulas também são encontradas em igrejas por toda a Europa, sendo comum dizer que a sua presença afasta os espíritos malignos. São comuns sobre portas e janelas, para proteger a entrada do edifício contra maus espíritos.
O filósofo grego Plutarco (46 a 126 d.C) já dizia que os homens enxergavam a vagina de uma mulher como a própria redenção. A solução de muitos dos seus problemas. E não somente os sexuais. Os homens do primeiro século resolviam, ou acreditavam resolver, algumas situações apenas expondo a genitália feminina.
Acreditavam que por esta inusitada tática adquiriam boa sorte, além do poder de expulsar demônios, de espantar algum mal iminente ou fazer com que leões e ursos corressem sem atacá-los.
Em Rodel na Escócia | Crédito da foto
Acreditavam que diante de uma vagina exposta tornavam-se melhores guerreiros, melhores homens. Acreditavam, enfim, que diante de qualquer adversidade, levantar as saias de uma mulher era a melhor opção. O ato concedia-lhes poder e segurança.
A crendice passou de geração em geração e existiu, em algumas culturas, até o século 18. De qualquer maneira, a exposição da vagina era bem interpretada em diversas situações. É neste contexto que, acredita-se, estão inseridas algumas das muitas teorias em torno das sheela na gigs.
Quando essas esculturas chamaram a atenção pela primeira vez da comunidade científica séculos atrás, elas foram consideradas vulgares, repulsivas e sem nenhum interesse em se fazer um estudo mais sério sobre o assunto. Os clérigos ficaram embaraçados e mandaram tirar muitas delas das paredes das igrejas.
Os arqueólogos também as ignoraram, enquanto os museus as guardavam em caixas, longe das vistas do público. Foi apenas nas últimas décadas que os acadêmicos começaram a se interessar e a estudar tais esculturas inusitadas. Com o decorrer dos anos, a maioria das sheela na gigs foram destruídas pelos puritanos, que as consideravam obscenas e indecentes.
Apesar das inúmeras teorias, sua origem e significado continuam sendo um mistério. Enquanto os sheela na gigs parecem ser de natureza erótica, eles são provavelmente símbolos pagãos de fertilidade ou avisos contra a luxúria. Na arte românica do período medieval, a luxúria era frequentemente retratada como uma mulher nua com cobras e sapos comendo seus seios e órgãos genitais.
Os edifícios de igrejas ao longo de muitas rotas de peregrinação representavam uma variedade de figuras exibicionistas, tanto masculinas como femininas, para alertar os fiéis sobre os perigos do pecado da luxúria. A ênfase estava sempre na genitália, que eram feitas de maneira desproporcional. Essas esculturas exibicionistas femininas românicas poderiam ter dado origem as sheela na gigs.
Um ponto de vista sustentado por Anthony Weir e James Jerman, é que as Sheelas foram talhadas pela primeira vez, no século 11 na França e na Espanha, e só mais tarde foram instaladas na Grã-Bretanha e Irlanda, em meados do século 12.
Eamonn Kelly, conservador de antiguidades irlandesas do Museu Nacional da Irlanda em Dublin, descreve em seu livro Sheela-na-gigs: origins and functions sobre a distribuição das sheelas na Irlanda para apoiar a teoria de Weir e Jerman: quase todas as sheelas conservadas in situ estão em regiões conquistadas pelos anglonormandos (século 12), enquanto nas zonas que permaneceram “irlandesas nativas” aparecem só umas poucas.
Weir e Jerman também argumentam em Images of Lust que a sua localização nas igrejas e a sua imagem grotesca sugerem que foram usadas para representar a luxúria feminina como horrível e pecaminosamente corrompedora. A expressão de algumas esculturas é assustadora, com certa deformação facial, ou um sorriso demente, dando uma sensação desconfortável para quem as observa.
A origem do nome, sheela na gigs também é um mistério. De acordo com Jørgen Andersen – cujo livro The Witch on the Wall (A Bruxa na Parede), publicado em 1977, foi o primeiro livro sério a tratar sobre essas esculturas – o nome vem da frase irlandesa Sighle na gCíoch, que significa “a velha bruxa dos seios“, ou Síla-na Giob, que significa “velha agachada“.
Mas alguns estudiosos expressaram dúvidas sobre a conexão, já que muito poucos sheela na gigs são mostrados com seios. A acadêmica Barbara Freitag, que escreveu o livro “Sheela na gig – esclarecendo um enigma” aponta referências que talvez expliquem a etimologia do nome, como um navio da Marinha Britânica chamado “Sheela na gig” e uma dança do mesmo nome, que existiu por volta de 1700.
Ela também descobriu que “gig” era na verdade uma gíria do norte da Inglaterra para os órgãos genitais de uma mulher. Mesmo com essas referências, os principais pesquisadores não aceitam que o nome tenha surgido de forma arbitrária.
De qualquer maneira, as sheela na gigs nos trazem uma pequena noção de como a sexualidade da mulher era tratada por algumas culturas. Ora interpretada como sorte – por uma sociedade que lhe concedia poder e controle sobre os seres; ora interpretada como praga – por uma sociedade que execrava os desejos femininos e amaldiçoava quem ousasse saciá-los.
Seja como for, a sexualidade feminina jamais foi interpretada como natural, sendo necessário, sempre, justificar sua existência e suas implicações, boas ou ruins.
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