No conflito que acabou com a era da inocência, armas foram testadas sem que se pudesse avaliar seu poder de destruição. O saldo: 15 milhões de mortos
Edoardo Ghirotto
Túmulo de soldado francês morto na batalha de Verdun, na I Guerra Mundial, é marcado no front por seu rifle e capacete(Hulton Archive/Getty Images)
Se a discussão atual sobre armas de guerra é permeada por questionamentos sobre os limiares éticos no uso dos drones e pela condenação do uso de armas químicas no conflito da Síria, há cem anos a humanidade começava a acompanhar o que seria o morticínio generalizado representado pela I Guerra Mundial. Onde as armas químicas fizeram sua terrível estreia e onde teve início a busca por um avião que, controlado remotamente, pudesse espionar e atacar as fileiras inimigas.
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Entre 1914 e 1918, foram 15 milhões de mortos, entre militares e civis. Saldo aterrador do primeiro conflito moderno da História, no qual novas armas foram usadas antes que seu poder de destruição fosse conhecido, e equipamentos foram aprimorados a partir das dificuldades enfrentadas no front. Foi assim que granadas que falhavam ao cair em poças de lama foram aperfeiçoadas. Ou que as submetralhadoras substituíram os modelos anteriores, que pesavam até sessenta quilos e exigiam até seis homens em sua operação.
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“Do ponto de vista militar, a principal lição tirada da guerra foi que as táticas de infantaria dos séculos XVIII e XIX eram fúteis”, destacou Bruce Canfield, autor do livro U.S. Infantry Weapons of the First World War (Armas de Infantaria dos Estados Unidos na I Guerra Mundial). “Ninguém tinha a experiência de lutar uma guerra desse tipo. Eles tiveram que aprender quando estavam sozinhos no combate. Muitos generais da I Guerra foram criticados por terem errado e sacrificado vidas, mas, honestamente, eles não tinham outras opções”, acrescentou o historiador Peter Simkins, da Universidade de Birmingham, na Inglaterra.
O plano da Alemanha de conseguir uma vitória militar sobre França e Rússia em duas semanas se converteu em uma derrota dos alemães após quatro anos. O resultado, segundo os especialistas ouvidos pelo site de VEJA, não foi influenciado tanto pela capacidade bélica, mas pela eficiência em usar o que se tinha à disposição. “A guerra mostrou que nenhuma vitória era ‘barata’. As batalhas em campos abertos em 1914 e 1918 custaram ainda mais vidas do que os conflitos em trincheiras”, disse Paul Cornish, curador das galerias da I Guerra Mundial no Imperial War Museum, de Londres.
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“A guerra não se tratava mais de se ter armas melhores ou piores. Era algo mais parecido com uma equipe de futebol cheia de estrelas que é derrotada por outra que não dispõe de craques, mas está melhor entrosada. O modo como os Exércitos manejavam as armas se tornou o diferencial. E foi assim que franceses e britânicos vieram a derrotar os alemães no fim do conflito”, completou Peter Simkins.
Rifle Short Magazine Lee-Enfield com uma baioneta de 42cm acoplada
O uso da baioneta no início da I Guerra Mundial era respaldado pela maioria dos Exércitos que ingressaram no conflito. Idealizado no século XVII e amplamente utilizado na Guerra da Secessão nos Estados Unidos, o rifle com uma faca presa ao cano servia para o soldado combater oponentes em lutas corpo a corpo ou atacar grupos de cavalaria.
Além disso, os militares de alta patente viam a baioneta como uma motivação extra aos batalhões, algo que os franceses chamavam de élan (espírito ofensivo), segundo o Western Front Association, uma organização responsável por preservar a memória da I Guerra.
Por estimular uma postura agressiva nos soldados, o treinamento com a arma se tornou obrigatório em alguns Exércitos, principalmente no britânico.
No início da I Guerra, contudo, nenhum batalhão previa que o conflito se desenharia atrás de trincheiras. A estratégia de utilizar longas espadas para aumentar o alcance branco do rifle se mostrou inútil, e a baioneta passou a ser usada basicamente em tarefas triviais, como cortar madeira, abrir latas e em alfaiataria.
O uso da arma em combate também apresentava limitações, uma vez que os soldados tinham dificuldades para retirar a faca da barriga do inimigo ou impedir que ele segurasse a espada após ser atingido na virilha. Os golpes mortais focavam nas mãos e cabeça.
Embora tenha perdido importância com o desenrolar do conflito, a baioneta foi mantida por representar uma segurança física e psicológica para os soldados.
A chance de um militar atirar no próprio colega durante uma luta nas trincheiras era alta. Os soldados também podiam desferir golpes mortais nos feridos de tropas inimigas que representassem perigo para os batalhões.
Estirados pelos campos de batalha, os militares incapacitados geralmente esperavam a passagem das tropas vencedoras para abrir fogo pelas costas. Os canadenses, por sua vez, encontraram na baioneta um elemento imprescindível para a sobrevivência, já que os rifles Ross usados por eles costumavam falhar após entrar em contato com a lama.
Para os alemães, o uso das facas ia além das baionetas. Os soldados costumavam prendê-las nas botas para caçar e usá-las em combates corpo a corpo, contribuindo para que elas se popularizassem com o nome de “facas de trincheira”, ou Nahkampfmesser (faca para combate próximo, em alemão).
Uma passagem do livro Knives of War - An International Guide to Military Knives from World War I to the Present, de Gordon Hughes, Barry Jenkins e Robert A. Buerlein, no entanto, aponta que a partir de 1916 a utilização de facas por soldados e suboficiais foi proibida, o que tornou a presença das armas nas trincheiras alemãs um sinônimo de patente elevada.
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