ATENÇÃO◘ ISSO NÃO É RESSACA

 

Mar invade a cidade de Santos e confirma previsões quanto à elevação do nível dos oceanos face à mudança do clima


Mar invade a ponta da praia de Santos - nível visivelmente elevado .


Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro


É a terceira vez,  só neste ano de 2016, que a orla de Santos fica embaixo d'água. 

Não se trata de mera ressaca. É elevação mesmo, do nível do mar, na região.

O nível do mar está subindo e, da mesma forma que a maré sobe, a macro-elevação se processa por ondas - ou seja, por ressacas... 

Hora de observar o que a ciência tem avaliado, para planejar as contingências. 

Dois estudos, um internacional e outro, realizado pela própria academia santista, apresentaram dados firmes no sentido de que o nível do mar no litoral santista não está imune à elevação do nível dos oceanos em todo o globo terrestre. 


NorteAmericanos confirmam a elevação do nível do mar.


Segundo estudo publicado na  Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America - PNAS, o  nível dos oceanos aumentou mais rapidamente a partir do século passado do que durante os últimos três milênios. 

Parati, no litoral sul do Rio, após a ressaca

Entre 1900 e 2000, o nível dos oceanos e dos mares subiu cerca de 14 centímetros.  Esse aumento tem tudo a ver  com o degelo polar, especialmente das geleiras do Ártico.

O estudo calculou que  sem o aumento das temperaturas globais, observado desde o início da era industrial, o aumento do nível dos oceanos teria chegado a, no máximo, metade do que chegou no século XX.

Puro efeito da mudança do clima em curso no planeta.

O século passado "foi extraordinário, em comparação com os últimos três milênios e o aumento dos oceanos" (o nível do mar) acelerou inclusive nos últimos 20 anos", apontou Robert Kopp, professor adjunto do Departamento de Ciências da Terra da Universidade Rutgers. As análises tiveram por base um novo enfoque estatístico desenvolvido pela Universidade Harvard - os oceanos diminuíram 8 centímetros entre os anos 1000 e 1400, período marcado por um esfriamento planetário de 0,2 grau Celsius.

Ocorre que a temperatura média global é, atualmente, 1 grau Celsius mais elevado que no final do século, e deverá aumentar ainda mais nos próximos anos. 

Para determinar a evolução do nível do mar durante os últimos três milênios, os cientistas compilaram novos dados geológicos, indicadores de subida das águas, pântanos e recifes de coral, e sítios arqueológicos.

Eles também usaram os levantamentos de dados de marés em 66 locais em todo o mundo durante os últimos 300 anos. A tendência é  ocorrer aumento de 51 centímetros a 1,3 metros, no nível do mar, se não houver redução do ritmo de aquecimento global. 


Força das ondas contínuas, altera perímetros e arrasta, para o que antes eram avenidas, peixes, barcos e  devolve o lixo...


ONU confirma o fato


O IPCC - painel científico intergovernamental da ONU, informou em seu estudo, que temperaturas não subam mais do que 2 graus acima da era pré-industrial. Se estes compromissos levarem a uma eliminação gradual do carvão e hidrocarbonetos, o aumento do nível dos mares não será maior que  24 a 60 centímetros, de acordo com o estudo.

"Os novos dados sobre o nível do mar confirmam mais uma vez que este período de aquecimento moderno é incomum, pois se deve a nossas emissões de gases de efeito estufa", afirmou Stefan Rahmstorf, professor de oceanografia no Instituto de Pesquisa sobre Impacto Climático de Potsdam, na Alemanha. Estes dados "mostram que o impacto mais perigoso do aumento das temperaturas é o aumento dos oceanos, o que já está bem avançado". "O gelo derrete mais rapidamente quando as temperaturas sobem, é física básica", brincou Stefan.

Outros estudos apontam no mesmo sentido. Neles, há que tenha afirmado que sem o aquecimento global desde o início da era industrial e seu impacto sobre a subida dos oceanos, mais de metade das 8000 inundações no leste dos Estados Unidos desde os anos 1950 não teriam ocorrido.

Por óbvio, são as zonas costeiras habitadas, que estão abaixo o no mesmo nível do mar, as particularmente vulneráveis - em especial as banhadas pelo oceano atlântico. 


Simulação da ocupação da cidade de Santos pelo mar, com a elevação do nível do oceano

Universidade santista responde


O Núcleo de Pesquisas Hidrodinâmicas (NPH) da Universidade Santa Cecília (Unisanta) está pesquisando a ocorrência de ressacas do mar nas praias paulistas, desde a década passada. 

A Unisanta, aliás, já alertou sobre possível invasão do nível do mar em Santos, devido ao aquecimento global, em 2009.

A atividade da universidade, feita em parceria com a Praticagem, visa dar maior segurança à navegação, aos tripulantes, aos passageiros de navios e aos moradores da Cidade, em áreas sobre efeitos das marés, fornecendo previsão de ressacas com até três dias de antecedência para a região.

Conforme as pesquisas, divulgadas desde 2009 pelo NPH-Unisanta, o aumento do nível do mar previsto pelos cientistas, se confirmado, será de maneira lenta e gradual, permitindo o seu acompanhamento e providências para amenizar e evitar possível caos urbano. 

No entanto, é preciso planejar agora obras de contenção. 

A universidade já elaborou até mesmo um mapa, com um prognóstico sobre as ruas e bairros que poderiam ser alagados.
                                Mar invade Santos...




Três cenários de alagamentos


Com base das previsões do IPCC: de 0,5 centímetros; 1,0 e 1.50 metros, em relação ao nível máximo atual, até o fim do século, a Unisanta traçou, em 2009, com detalhes, como se daria o alagamento de bairros e ruas santistas.

As "ressacas" de 2016, ao que tudo indica, estão demonstrando o acerto parcial do mapa.

No pior dos cenários previstos no estudo, o mar subiria 1,50 metros e a Ponta da Praia, o Canal 3 e o Porto seriam os locais mais afetados.  De fato, foi ali que se deu o maior volume de estragos nas últimas "ressacas".

Os cenários anteciparam possíveis efeitos provocados pela elevação do nível do mar em 0,5 centímetros; 1,0 e 1,5 metros, sempre com referência ao nível máximo atual nas marés de sizígia, ou seja, seriam as áreas alagáveis quando houver marés altas (ver áreas azuis nas imagens).

"Em qualquer um dos cenários, é preciso considerar não apenas o efeito dos alagamentos. Deve-se sempre levar em conta o efeito das ondas, que será muito destruidor, mesmo sem grandes ressacas, pois está na sua constância (várias por minuto) este poder de danificar o que encontrar no seu caminho. Os jardins seriam destruídos assim como o pavimento, calçadas das ruas, as garagens e pátios dos prédios seriam invadidos pelas águas e ondas, enfim, o caos", adverte a pesquisa santista.

Garagem totalmente alagada - estruturas costeiras em perigo.

Hora de agir

A Região Metropolitana da Baixada Santista precisa iniciar programas de contingência, emergência e reurbanização. É preciso reuniar engenheiros, arquitetos, oceanógrafos, defesa civil e analistas jurídicos, para buscar soluções urbanísticas e arranjos institucionais compatíveis com o que poderá ocorrer nos próximos anos, a continuar essa tendência destruidora a cada "ressaca", que parece, efetivamente, não um movimento ocasional e periódico mas a ponta de um processo de "ocupação" do espaço pelo mar.

Não se trata, obviamente, de um problema localizado. É uma questão nacional. Santos hospeda o maior complexo portuário da América Latina, é o ponto central de escoamento das exportações e porta de entrada de todos os produtos que interessam ao mercado nacional. 

A região metropolitana de Santos é de uma importância econômica ímpar e a concentração populacional é das maiores do Brasil.

Assim, é hora de cobrar planejamento sério, engenharia, excelência nas pesquisas e administrações que pensem nos habitantes e, não mais, nos interesses partidários de ocasião.

Fontes: 





Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados, integra o Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, membro da Comissão de Infraestrutura e Sustentabilidade e da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo (OAB/SP). Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal. Responde pelo blog The Eagle View.
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