Estudo do Datafolha revela que 62% dos brasileiros entre
os 16 e os 24 anos gostavam de abandonar o país. 8% escolhem Portugal Seis em cada dez jovens brasileiros
gostavam de viver fora do país e Portugal surge como o segundo destino mais
desejado, depois dos EUA.
Esta disponibilidade para emigrar dos jovens entre os
16 e os 24 anos - maior do que a média da população adulta que é de 43% - é o
principal resultado de um estudo de opinião efetuado pelo instituto de
sondagens Datafolha para o jornal Folha de São Paulo que, tal como o DN,
publica hoje os resultados desse trabalho no âmbito de uma parceria de media
lusófonos.
Outra das conclusões desse estudo, no qual foram entrevistadas 2090 pessoas, é
que entre os inquiridos com idades entre os 26 e os 34 anos, 50% também
consideraria a possibilidade de mudar de país se a oportunidade surgisse.
Esta
disponibilidade estará relacionada com a crise política e económica que se vive
no Brasil, como reconheceu ao DN o diretor de pesquisa do Datafolha, Alessandro
Janoni.
A partir dos 35 anos, a vontade de emigrar vai diminuindo.
Portugal ser o segundo destino mais indicado pelos jovens (8% contra 14% dos
EUA) é uma boa notícia, pois uma imigração jovem - e no caso uma grande parte
com curso superior - pode ajudar a diminuir os problemas da redução de
população.
É que as previsões do Instituto Nacional de Estatística apontam para
que a população mais jovem seja reduzida de 1,4 milhões para as 900 mil pessoas
em 2080, enquanto o número de idosos deverá subir de 2,2 para 2,8 milhões.
De
acordo com esses dados, Portugal vai ficar abaixo dos 10 milhões de pessoas já
a partir de 2033.
Maria João Valente Rosa, demógrafa e diretora do Pordata, considera, por isso,
que "a entrada de pessoas válidas, que desejem viver num país que lhes
parece promissor é um sinal positivo para nós".
Os dados do INE,
prossegue, "mostram que, pela primeira vez nos últimos seis anos, voltámos
a ter um saldo migratório positivo, ou seja, entraram mais pessoas do que
aquelas que saíram".
O que se torna relevante, já que Portugal está
"cada vez mais dependente do saldo migratório para ter algum dinamismo
demográfico".
É precisamente nesse sentido que aponta um estudo recente da Fundação Francisco
Manuel dos Santos - "Migrações e sustentabilidade demográfica":
"A manutenção da dimensão total da população residente nos atuais 10,4 milhões
exigirá [...] um saldo migratório global entre cerca de 2 milhões [...] entre
2015 e 2060". Isto implica mais 47 mil entradas do que saídas por ano.
Proximidade cultural facilit
No caso dos brasileiros, a proximidade cultural e linguística facilita a
integração. Valente Rosa diz que a escolha de Portugal "não é estranha,
por todas as razões, não só históricas, mas de proximidade da língua".
Por
outro lado, "já existem em Portugal várias comunidades brasileiras e,
normalmente, as rotas seguem trajetos já desenhados". E o país ganha com
isso:
"A chegada de pessoas vindas de outros países e continentes só nos
enriquece enquanto sociedade".
Foi com surpresa que o diretor de pesquisa do Datafolha, Alessandro Janoni, viu
os resultados do estudo: "Não só surpreende como também preocupa bastante.
É um sintoma do pessimismo atual dos brasileiros".
Em causa estarão as
crises que o país atravessa. "Crise de representação política, com
crescente descrédito nas instituições democráticas, crise económica com taxas
elevadas de desemprego e queda no poder de compra, crise na segurança pública.
Os jovens são o estrato mais vitimizado".
Quanto à preferência por Portugal, também surpreende, "principalmente em
segmentos específicos da população brasileira.
Entre os mais escolarizados e
mais ricos, por exemplo, Portugal empata com os EUA".
De acordo com os
dados oficiais mais recentes, de 2016, há 81 251 brasileiros em Portugal, o que
faz deles a maior comunidade estrangeira no país, um facto que Alessandro
justifica com "a qualidade de vida" que encontram cá.
"Baixas
taxas de violência, relação histórica entre os dois países, a língua e os
cenários político e económico estáveis", exemplifica.
Com a prisão de Lula da Silva e a destituição de Dilma Rousseff, o Brasil ficou
ainda mais dividido, aguardando agora eleições para a Presidência, que se devem
realizar ainda este ano.
Após dois anos de recessão, a economia cresceu 1%, em
2017, mas ainda não foi o suficiente para o que o país necessita.
Vir para mudar de vida
A escolha de Portugal está, então, relacionada com o idioma, com a segurança
que os brasileiros com quem o DN falou dizem sentir, mas também com a vontade
de ter uma vida melhor do que aquela que tinham no Brasil.
Como Ana Maria que há 15 anos decidiu mudar de vida e deixando os dois filhos
com familiares veio para Portugal. "O país não estava bem.
Se agora não
está, imagine há 15 anos. Tenho dois filhos, a situação estava complicada, não
arranjava trabalho na área de contabilidade. Também era professora e aí também
não conseguia nada", contou ao DN.
Tal como agora, na altura, Portugal não
surgiu como primeira escolha: "Pensei em ir para os EUA, mas depois dos
atentados [nas Torres Gémeas em Nova Iorque, em 2001] ficou complicado.
Vim
para Portugal com a ajuda de uma amiga."
Muitos anos se passaram e Ana Maria diz ser difícil voltar ao Brasil e
justifica essa certeza com o facto de ser "mais tranquilo em termos de
segurança e de sobrevivência".
Tal como Ana Maria, também Fernanda Feliz, Cíntia Pinheiro e Cecília Calhau
estão em Portugal à procura de uma vida que não conseguem ter no Brasil.
Fernanda casou com Nuno Feliz e está a tratar dos documentos para conseguir
trazer o filho que vive no Brasil.
A opção de vir para Lisboa deveu-se à
situação profissional estável do marido e à segurança que sente na rua,
diferente da vivida em Belo Horizonte: "Lá não tínhamos condições de criar
uma família".
Um ano a conduzir "tuk tuk"
Diferente é a história de Cíntia Pinheiro. Está há um ano em Lisboa a conduzir
um "tuk tuk", depois de ter sido afetada pela falta de financiamento
para os estudos superiores no Brasil.
"Cortaram 70% do investimento",
recorda a doutorada em recuperação florestal que chegou a Portugal "após
um convite para vir trabalhar nos tuk tuk".
Dessa mudança destaca a
segurança que sente em Lisboa e a liberdade. "Às vezes vale a pena trocar
o que se fazia para vir para outro lugar onde o teu dinheiro vale alguma coisa.
Pago impostos, mas tenho o retorno em segurança.
A liberdade tem um
preço", concluiu enquanto espera no Chiado pelos visitantes que querem
conhecer a cidade.
Numa situação diferente de Fernanda e Cintia está Cecília Calhau, que estava a
sair do consulado do Brasil onde foi um buscar um documento para o seu pedido
de cidadania.
"Sempre pensei em viver em Portugal e como não tenho nada
que me prenda ao Brasil estou a requerer a cidadania para vir para cá. Será uma
mudança na minha vida", garantiu.
Muitos vêm estudar
Portugal tem vindo a atrair cada vez mais brasileiros que pretendem estudar fora
do país.
Na Universidade de Coimbra, os canarinhos são a maior comunidade
estrangeira. "Temos, atualmente, 2400 brasileiros, um número que há quatro
anos era de 1700", adianta ao DN Joaquim Ramos Carvalho, vice-reitor para
a internacionalização.
Só este ano, registaram-se cerca de 6.000 manifestações
de interesse de estudantes brasileiros.
Para a UC, a comunidade brasileira representa 3.5 a 4% do orçamento global. Mas
os ganhos são muito superiores: "É uma fonte de energia enorme,
diversificam a população estudantil".
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