FURO►: O 7 de Setembro na verdade foi em 1º de Agosto!

 
(Texto completo abaixo desta reprodução da página). 
Acesso direto em: http://oglobo.globo.com/ciencia/arquivos/18_info_logo.pdf 


Uma das mais inspiradas frases de nosso anedotário contemporâneo diz que, no Brasil, "até o passado é imprevisível". 

Não à toa, biografias imaculadas se desvirtuam, em especial nesses meses antes das eleições.

Historiadores obstinados como Nireu Cavalcanti também se deparam, eventualmente, com revelações súbitas.
Como esta que, dez dias passados do 7 de setembro, a Página Móvel — irmanada à seção História — apresenta, na forma de uma tese em tintas de crônica: segundo as pesquisas exaustivas de Nireu, a Independência foi declarada em 1 de agosto, no Rio, e não na data que apren- demos na escola e comemoramos anualmente com paradas e esquadrilhas.
Isso não quer dizer que o grito do piranga não tenha existido, ou tenha sido uma farsa. Foi, contudo, nas palavras de Nireu, apenas um ato sim- bólico, para "acalmar os paulistas". Senhores: estão abertos os debates. (Arnaldo Bloch)  
SILÊNCIO NO IPIRANGA
Por Nireu Cavalcanti
A leitura de documentos primários referentes à História do Brasil é prazerosa, como se estivéssemos vivendo aquele tempo, compartilhando a experiência. Inclusive a surpresa, quando os documentos são comparados com versões vigentes.

Foi o que aconteceu quando, em recente pesquisa, eu lia e analisava os fatos que levaram à Independência do Brasil, no decorrer dosanos de 1821 e 1822 e concluí que a Declaração de Independência aconteceu em 1 de agosto, no Palácio do Rio de Janeiro, e não em 7 de setembro, em São Paulo, "às margens plácidas do Ipiranga".

Usei três fontes: o Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa; a coleção de Leis brasileiras para o período; e os jornais brasileiros da época. Vamos lá. Em agosto de 1820 eclodiu a revolução dos liberais de Portugal que, no entanto, não destituíram o rei D. João VI. 

Mas, com o advento do Congresso Constituinte, que desenvolveria o esboço de constituição liberal, aprovado em 10 de março de 1821, D. João passou a ser titulado como Rei Constitucional e mero assinante dos atos promulgados pelos revoltosos. Coagido, teve que jurar fidelidade à constituição a ser elaborada pelas "Cortes Gerais Extraordinárias", legitimando o processo revolucionário e sua própria expulsão. 

Mas, em vez de deixar no Brasil uma Junta, como fora ordenado, deixou o seu filho D. Pedro como regente do Reino do Brasil, intimado pelas Cortes a também regressar a Portugal com a família.

Os moradores e autoridades civis, militares e eclesiásticas do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo reagiram, o que resultou no famoso dia do Fico, em 9 de janeiro de 1822, para "bem de todos e felicidade geral da nação...", e todos aclamaram:"Viva a Religião, Viva a Constituição, Vivam as Cortes, Viva El Rei constitucional e Viva a união de Portugal com o Brasil"! Valente, D. Pedro conseguiu anular a reação das tropas portuguesas no Rio e convencê-las a regressarem para Portugal, sem derramamento de sangue. Jurou fidelidade a todos, inclusive à pauta liberal: afinal, ele era um deles.

Em resposta à reação imediata da Regência e dos constituintes portugueses
— que, na moita, baixaram normas que pulverizavam o poder central do Rio de Janeiro entre as províncias, fazendo com que o Brasil, na prática, voltasse à condição de colônia — D. Pedro convocou eleições (3/6/1822), em cada província, rompendo com as Cortes. As que não apoiavam D. Pedro, como Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Goiás, Mato Grosso, Ceará etc. se negaram a eleger seus deputados.

Finalmente, em primeiro de agosto de 1822, D. Pedro assume a proposta política de Independência do Brasil. Com o título "Manifesto de S. A. R. o Príncipe Regente Constitucional e Defensor Perpétuo do Reino do Brasil, aos Povos deste Reino", o regente, após uma introdução contextualizando as razões do rompimento com as Cortes e com o Reino
de Portugal, declara: 

Acordemos pois, Generosos Habitantes deste Vasto e poderoso Império, está dado o grande passo da Vossa Independência, e felicidade a tantos tempos preconizada pelos grandes Políticos da Europa. Já sois um Povo Soberano; já entrastes na grande Sociedade das Nações independentes, a que tinheis todo o direito.

A Honra e Dignidade Nacional, os desejos de ser venturosos, a voz da mesma Natureza mandam que as Colônias deixem de ser Colônias, quando chegam à sua virilidade, e ainda que tratados como Colônias não o éreis realmente, e até por fim éreis um Reino. (...) O Manifesto, após essa declaração de independência, contém o plano de governo de D. Pedro para o Brasil e é concluído com a convocação aos "brasileiros em geral" para que se unissem em torno da causa da Independência e confiassem nele, na marcha da "prosperidade do Brasil". 

D. Pedro assegura que estará a frente de todos, enfrentando os maiores perigos e que "A Minha Felicidade (convencei-vos) existe na vossa felicidade.

É Minha Glória Reger um Povo brioso e livre". No mesmo dia primeiro de agosto D. Pedro declara inimigas as Tropas mandadas de Portugal para atacarem o Brasil e conclama a todos a resistirem com armas nas mãos a esses inimigos.

Orienta os que não tivessem forças necessárias para enfrentá-las em guerra tradicional que usassem o método da guerrilha e se afastassem dos núcleos urbanos costeiros levando todo mantimento e animais que pudessem alimentar os inimigos.

Em outubro o brigadeiro Madeira informa às Cortes que restava fiel ao governo português, na Bahia, apenas Salvador. Poucos dias após 6/8/1822), é divulgado o Manifesto às nações que tinham relações políticas e comerciais com o Brasil pedindo apoio a sua independência esperando que os homens sábios e imparciais de todo o Mundo, e que os Governos e Nações Amigas do Brasil hajam de fazer justiça à decisão brasileira.

D. Pedro convida-os a "continuarem com o Reino do Brasil as mesmas relações de mútuo interesse e amizade". Esses documentos, principalmente o Manifesto aos povos do Brasil, foram encaminhados aos governos civil e militar de todas as províncias. Podemos constatar isso na circular de José Bonifácio à Câmara da vila de Porto Seguro, datada de 7 de agosto de 1822.

Também foram divulgados através de sua publicação nos jornais da época, por exemplo, o Diário do Rio de Janeiro, consultado.

Esse jornal publicou as iniciativas da sociedade de recolhimento de doações para o governo arcar com as despesas da guerra iminente. D. Pedro então teve que viajar para São Paulo, a fim de acalmar os ânimos dos paulistas, revoltados com a manobra de José Bonifácio e de seu irmão Martim Francisco, destituindo dois membros da Junta do Governo Civil, queridos pela população, e substituí-los por seus apadrinhados. D. Pedro anulou essas nomeações. Partiu do Rio de Janeiro em 14 de agosto.

Nessas viagens, o rei ou o príncipe era acompanhado de guarda de honra formada por autoridades engalanadas que ofereciam ao monarca o que de melhor possuíam de montaria, viaturas, roupa e alimentos. Ao se aproximar de uma vila ou cidade, a comitiva parava para que a delegação daquele lugar viesse receber o monarca e substituir a guarda. Por isso, D. Pedro e sua comitiva pararam na região do Rio Ipiranga, próximo à cidade de São Paulo. 

Nesse momento, o oficial que viera portando documentos para D. Pedro e o funcionário do correio se encontraram com a comitiva e entregaram cartas da princesa Leopoldina, narrando os fatos sobre as Cortes de Lisboa e a agitação da cidade do Rio de Janeiro.

Foi esse o momento ideal para que D. Pedro, no dia 7 de setembro, marcasse e referendasse a Independência já proclamada, em território paulista. Esse discurso simbólico pode ser lido na Proclamação aos paulistas datada do dia 8 seguinte. 

Honrados Paulistanos: O amor que Eu consagro ao Brasil em geral, e à vossa
Província em particular, por ser aquela, que perante Mim e o Mundo inteiro fez conhecer primeiro que todos o sistema maquiavélico, desorganizador e faccioso das Cortes de Lisboa, Me obrigou a vir entre vós fazer consolidar a fraternal união e tranquilidade, que vacilava e era ameaçada por desorganizadores, que em breve conhecereis. (...) Eu vos Asseguro que cousa nenhuma Me poderia ser mais sensível do que o golpe que Minha Alma sofre, separando-Me de Meus Amigos Paulistanos (...) A Divisa do Brasil deve ser INDEPENDÊNCIA OU MORTE . (...) 

A partir desse ato simbólico foram elaborados o Tope Nacional, os Escudos de Armas, o Hino da Independência, e outros ícones do novo império americano, como a cerimônia de entrega da bandeira.

Em 12 de outubro (aniversário de D. Pedro) ele foi consagrado Imperador D. Pedro I e coroado em 1 de dezembro de 1822.

 

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