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50 ANOS DO GOLPE DE 1964: Com palestra em seminário da USP e da Brown University, Luiz Cláudio Cunha desnuda a participação da ditadura brasileira nos crimes dos ex-regimes autoritários do Cone Sul

Ilustração do artista alemão para a edição de 1549 da sátira "A Nau dos Insensatos", do também alemão Sebastian Brant
Ilustração do artista alemão Albrecht Dürer para a capa da edição de 1549 da sátira “A Nau dos Insensatos”, do também alemão Sebastian Brant
No âmbito do seminário internacional “O Golpe de 1964 e a onda autoritária na América Latina”, co-patrocinado pela Universidade de São Paulo e pela Brown University, dos Estados Unidos, o jornalista Luiz Cláudio Cunha falou sobre a participação da extinta ditadura brasileira na chamada Operação Condor, conjunto de operações repressivas ilegais em que colaboraram outros regimes totalitários do Cone Sul nos anos 70 e 80.
O evento, que transcorreu de segunda a sexta-feira da semana passada em auditório na Praça da Reitoria, no campus da USP, foi uma promoção do Departamento de História da Universidade, sob coordenação da professora Maria Helena Capelato, com comissão integrada pelos professores Marcos Napolitano e Janaína Teles, também da História da USP, e James Green, da História da Brown University,
Participaram alguns dos principais especialistas no período militar e historiadores de seis universidades brasileiras, duas dos Estados Unidos, uma do Chile e uma da Argentina, além de um representante do National Security Archive, de Washington, e outra da Comissão Nacional da Verdade. O único não acadêmico era Luiz Cláudio.
A palestra de Luiz Cláudio, veterano batalhador pelos direitos humanos, Prêmio Esso de Jornalismo e autor, entre outros, do livro O Seqüestro dos Uruguaios — Uma Reportagem dos Tempos da Ditadura (Editora L&PM, 2008, 472 págs.), intensamente documentada, é uma peça histórica cuja leitura vale a pena.
Confiram:
As penas verde-amarelas da Condor — As conexões repressivas do Brasil com as ditaduras no Cone Sul
As conexões repressivas do Brasil com as ditaduras no Cone Sul.
A plateia bem comportada que tomava as poltronas de veludo vermelho do centenário Teatro Solís, no centro de Montevidéu, irrompeu em aplausos entusiasmados quando ouviu o refrão final de Disculpe, o grande sucesso de Los Nocheros, o grupo folclórico patrioteiro que fazia sucesso com a música que a ultradireita do Uruguai assumiu como seu hino anticomunista.
Disculpe si no me entiende
Disculpe si no lo entiendo
Usted habla por la boca de otra gente y yo,
Y yo soy solo el eco de mi pueblo
O público daquela noite, 25 de agosto de 1975, não podia ser mais fiel: eram generais, oficiais de inteligência e agregados da elite militar de 15 países reunidos nos preparativos da 11º Conferência dos Exércitos Americanos (CEA), que seria aberta dois meses depois.
E a atração musical no palco não podia ser mais confiável.
O quarteto de Los Nocheros — três guitarras e um bumbo — teve o seu disco patrocinado pela DINARP, o organismo de propaganda criado logo após o golpe militar civil-militar de 1973.
Dois músicos do grupo eram ligados à DNII, a Dirección Nacional de Información y Inteligência, a polícia política patrocinada com recursos da CIA norte-americana e inspirada no ‘Esquadrão da Morte’ do delegado brasileiro Sérgio Fleury.
O quarteto almoçava com frequência com o comandante da secreta Compañia de Contrainformaciones, o braço repressivo do Exército. E Los Nocheros chegaram a cantar na festa de aniversário da unidade militar, instalada num quartel na esquina da calle Colorado e bulevar Artigas, dois quilômetros ao norte do Obelisco, marco turístico de Montevidéu.
Em 20 de outubro, enfim, abriu-se a 11ª CEA, que reuniu por cinco dias os comandantes da repressão mais louvados pelos nocheros do continente.
O anfitrião da CEA, general Julio César Vadora, comandante do Exército uruguaio, expôs a ideia fixa daquele distinto público: “No campo de batalha da sedição, deve haver um estreito enlace entre os Exércitos [...]“.
Maior do Exército, que amanheceu já no dia 11 de setembro no regimento de Peñalolén onde o general Augusto Pinochet instalou o QG do golpe contra o presidente chileno Salvador Allende em 1973. O general Álvarez ecoou o mantra de seu líder: “O mundo se encontra em guerra. Uma guerra [...] de ações solapadas em que não se distingue vanguarda e retaguarda [...]“.
O general uruguaio Luís Vicente Queirolo, secretário-geral da conferência, foi mais claro: “Existe uma coordenação entre os exércitos do continente para combater e impedir a infiltração marxista [...]“.
A estrela principal da reunião acabou sendo o chefe da delegação argentina, nomeado há menos de dois meses pela presidente Isabelita Perón para o comando do Exército.
Se for preciso, deverão morrer na Argentina todas as pessoas necessárias para alcançar a segurança do país”
O tenente-general Jorge Rafael Videla ganhou as manchetes dos jornais ao antecipar o futuro em Montevidéu: “Se for preciso, deverão morrer na Argentina todas as pessoas necessárias para alcançar a segurança do país…”, avisou Videla, seis meses antes de liderar o golpe que matou e fez desaparecer 30 mil pessoas que ‘ameaçavam’ a segurança nacional.
O líder da comitiva brasileira, mais discreto, era o general Fritz Azevedo Manso, chefe do Estado-Maior do Exército, que derrubou João Goulart duas vezes no espaço de uma década.
Em 1954, como tenente-coronel, Fritz assinou o manifesto de 82 oficiais que levou à queda do então ministro do Trabalho de Getúlio Vargas. Em 1964, como coronel, Fritz conspirou no golpe que depôs o presidente da República.
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