O jornalista Frederico Duarte Carvalho
afirma que Portugal é “uma pequena reserva de políticos” à disposição de
Bilderberg quando não há mais alternativas.
Jornalista de profissão, há muito que
Frederico Duarte Carvalho se interessa pelo Grupo Bilderberg e como este
influencia a política e a economia no mundo. Anos de interesse resultaram
finalmente no livro “O Governo Bilderberg – Do Estado Novo aos nossos dias”,
sobre um grupo a que chama os “senhores do mundo”, alertando que “nunca teve
tanto poder em Portugal”. “A maior prova disso tudo é quem está hoje a liderar
Portugal, a oposição e a Presidência da República: são tudo pessoas escolhidas
por Balsemão”, disse Duarte Carvalho, apontando o dono da Impresa como o homem
forte de Bilderberg em Portugal.
De que forma a história de Portugal se
entrelaça com a do Grupo Bilderberg?
Este pequeno país consegue ser
importante para os senhores do mundo. A partir da ii Guerra Mundial, o mais
importante para o grupo era a união europeia, a unificação política e económica
da Europa, e para isso era necessária a unificação da Alemanha, criarem-se as
condições para que não parecesse uma vitória nem de um lado nem do outro [da
Guerra Fria], e começou-se de fora para dentro, ou seja, pelos países do sul e
à volta da Alemanha para que isso se tornasse uma inevitabilidade política.
Portugal e Espanha nunca podiam entrar [no plano] se fossem ditaduras e,
portanto, o Grupo Bilderberg procurou desde o início controlar a História. E
Portugal, como potência colonial, era muito apetecível e tinha sido membro
fundador da NATO, apesar de ser uma ditadura. Bilderberg é o braço político da
NATO.
Quais foram os principais momentos dessas
intervenções?
Durante o período de Salazar,
Bilderberg esteve mais ou menos controlado. Não há grandes momentos, é um
bocado linear, é um percurso. Mas há momentos decisivos, como quando convidam o
ministro [dos Negócios Estrangeiros de Salazar] Franco Nogueira, em 1967, e ele
traz um documento de Cambridge sobre o futuro da NATO onde é dito o que se está
a passar hoje: com o fim da URSS, atrair os países satélites para o seio da
NATO. Quando falo do grupo, não estou a falar de um senhor que controla com um
computador o que se passa: há uma conjugação de interesses que ocorrem de forma
natural, orgânica e harmoniosa. Depois, quando Vítor Constâncio vai [à
reunião], em 1978, é a primeira vez que Bilderberg sai da alçada dos negócios
estrangeiros e entra finalmente no campo da economia. E, por fim, quando
Balsemão se torna, em 1981, convidado e acaba membro permanente até 2015.
Qual a importância de Portugal depois
da adesão à CEE?
Entrámos na CEE em 1986 e três anos
depois cai o Muro de Berlim. O grande objetivo político é alcançado e é preciso
tratar da construção económica com a moeda única. Portugal acaba por ser muito
importante – ao darmos o passo para a moeda única, estamos a mostrar que até um
pequeno país do sul da Europa pode ter a mesma moeda que a Alemanha;
simbolicamente, fomos muito importantes –, mas sobretudo pela criação de
políticos que podem ser usados quando a Europa está complicada. Portugal, país
pequeno e simpático, é sempre uma pequena reserva. Quando os outros não se
entendem, um político português pode sempre funcionar muito bem, como Barroso e
António Guterres.
No livro refere o anticomunismo do
grupo e deixa no ar a ideia de o caso Casa Pia ter sido contra Ferro Rodrigues.
Quem diz isso é Daniel Estulin.
Limito--me a constatar um encontro entre Durão Barroso e Ferro Rodrigues em
Paris, dias antes de Paulo Pedroso ser detido. Balsemão era primeiro-ministro
em 1982, quando o caso Casa Pia começou, e Teresa Costa Macedo tinha os
relatórios, isso são factos. Estulin faz a ligação e diz que muitas vezes são
usadas acusações de pedofilia para controlar políticos. Para mim, é uma coisa
de Bilderberg ou feita por elementos do grupo. As reuniões anuais deles são
como de CEO’s a decidirem sobre a sua empresa, neste caso o mundo, nomeadamente
os EUA e a Europa. Não vou dizer que a Casa Pia partiu de Bilderberg, mas
envolveu pessoas de lá, isso é óbvio.
Diz que tudo aconteceu por Ferro
Rodrigues ponderar uma aliança com o PCP.
Na altura falou-se nisso e ainda era
visto como contranatura, isso sim. Se calhar, Ferro Rodrigues esticou demasiado
a corda e pode ter pago desproporcionadamente. Que houve muita proteção a
Barroso, houve. Wilfried Martens [então presidente do Partido Popular Europeu]
veio cá almoçar e Barroso disse-lhe que, se não encontrassem ninguém, estava
disposto a sair a meio do mandato para a Comissão Europeia. Já estava a
preparar o caminho e vê-se que estava muito coordenado com Balsemão. Em 2015
tornou-se sucessor em Bilderberg. Os convites de Balsemão foram sempre democráticos
na polarização: convidava alguém do PS e outro do PSD, jogando sempre nos dois
tabuleiros do xadrez. Se alguém sai da linha, Bilderberg atua.
Qual a real influência de Balsemão?
É a comunicação social e é o número 1
no PSD. A televisão dele é quem põe e dispõe as pessoas que devem ser ouvidas
e, por muita independência dos jornalistas, tem sempre a última palavra a dizer
– é ele quem assina os cheques. Se não é respeitado por quem escolhe para ir a
Bilderberg, há toda uma conjugação. A maior prova disso tudo é quem está hoje a
liderar Portugal, a oposição e na Presidência da República: são tudo pessoas
escolhidas por Balsemão. Ao chegar ao governo com um acordo com PCP e BE,
António Costa conseguiu domar a esquerda, o que é extraordinário, e Bilderberg
está-lhe agradecido. Bilderberg nunca teve tanto poder em Portugal.
Até que ponto a ida de uma pessoa a uma
reunião faz com que pertença ao grupo?
Quando se vai a uma reunião de
Bilderberg é como ir a uma espécie de entrevista de emprego. Vai por já ter
feito coisas e por poder fazer coisas; vai para ser integrada entre amigos. Uma
pessoa fica num ambiente de mosteiro com as personalidades mais influentes do
mundo, fica-se com uma ótima rede de networking. Sabe que fez um caminho e que,
se continuar, vai ser protegido. Volte ou não, terá um número de telefone do
representante de cá [Portugal] que, por sua vez, pode ligar a duas ou três
personalidades-chave no mundo. Isso é um poder extraordinário. Também se
beneficia dos relatórios que todos os anos fazem. Ir a uma reunião não faz uma
pessoa ser a mais importante e que fique logo no topo. O Santana Lopes foi a
uma reunião e só se tem lixado. Se calhar, por não ter respondido a Bilderberg
como gostariam; foi usado na transição entre Barroso e Sócrates. Se se alinhar
com os rapazes, ser-se-á protegido pelos rapazes enquanto for útil.
Quais as consequências das ações de
Bilderberg para a democracia portuguesa?
Estamos subjugados ao poder orçamental
de Bruxelas. A democracia é um bem demasiado precioso e temos de cuidar dela
todos os dias, mesmo que ameaçada e controlada há muito tempo. Salazar
respeitava a democracia, por isso é que a punia e não a queria. Bilderberg
não a respeita e por isso não quer saber o que pode decidir.
Fonte: Jornal i
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