Debate sobre recriação de Ministério da
Segurança é novo lance em embate entre Bolsonaro e Moro.
BRASÍLIA (Reuters) - A possibilidade
de recriação do Ministério da Segurança Pública pode ser mais um lance no
embate quase sempre silencioso entre o presidente Jair Bolsonaro e o ministro
Sergio Moro, hoje com uma popularidade maior que o chefe, segundo pesquisas de
opinião pública, e considerado um potencial candidato na eleição presidencial
de 2022.
Presidente Jair
Bolsonaro e ministro da Justiça, Sergio Moro, durante cerimônia no Palácio do
Planalto 18/12/2019 REUTERS/Adriano Machado
Na manhã desta
quinta-feira, Bolsonaro confirmou publicamente a possibilidade de recriação da
pasta, o que reduziria significativamente o poder de Moro, titular do atual
Ministério da Justiça e Segurança Pública.
A demanda para a
recriação do Ministério da Segurança Pública foi apresentada formalmente na
quarta-feira por secretários de Segurança Pública a Bolsonaro em reunião no
Palácio do Planalto, quando o presidente disse que iria avaliar as demandas dos
secretários.
Na manhã desta quinta, ele voltou ao assunto em entrevista a
jornalistas ao deixar o Palácio da Alvorada para viagem à Índia, de onde
retorna apenas na próxima terça-feira.
“Isso tem que ser
estudado. Estudado com o Moro. Lógico que o Moro deve ser contra, mas estudado
com os demais ministros. O (presidente da Câmara) Rodrigo Maia é favorável à
criação da Segurança. Acredito que a Comissão de Segurança Pública (da Câmara)
também seja favorável. Temos que ver como se comporta esse setor da sociedade
para melhor decidir”, disse o presidente.
Na véspera, Maia disse
que o fim do Ministério da Segurança Pública pelo governo Bolsonaro “foi um
erro” e defendeu que sua recriação seria “uma sinalização de priorização do
tema”. [nL1N29R20B]
Bolsonaro disse a
jornalistas que, se o ministério for recriado, Moro “fica na Justiça”.
“É o que era
inicialmente. Tanto é que, quando ele foi convidado, não existia ainda essa
modulação de fundir com o Ministério da Segurança”, afirmou.
Na verdade, uma das
condições de Moro para deixar o cargo de juiz federal no Paraná e aceitar o
cargo de ministro do governo Bolsonaro, foi a ampliação dos poderes do
Ministério da Justiça para abarcar novamente a área de segurança pública.
O
então juiz tinha a intenção de fazer avançar o pacote anticrime e as chamadas
10 medidas contra a corrupção, propostas pelo Ministério Público Federal.
Moro queria,
inclusive, mais do que reunificar os dois ministérios e tentou levar para sua
pasta o Ministério da Transparência, que incluía a Controladoria-Geral da União
(CGU), e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), o que não
conseguiu.
O ex-juiz chegou a ter
o Coaf sob seu guarda-chuva, mas apenas até o Congresso votar a medida
provisória que transferia o órgão da Fazenda para a Justiça. Os parlamentares
decidiram alocar o Coaf na Economia (que unificou os ministérios econômicos). E
mais recentemente, em nova mudança, o órgão foi para o Banco Central.
Procurado por meio da
assessoria de imprensa, Moro disse que não vai comentar a possibilidade de
desmembramento da Segurança Pública de sua pasta.
Uma fonte ligada a
Moro disse que esse debate é visto com espanto pela atual equipe do ministério,
porque tem ocorrido à revelia da pasta. A avaliação é que os indicadores de
segurança pública são bons e houve aumento na execução de recursos aos entes
regionais, contrariando argumento dos secretários.
Essa fonte considera
que há um componente político nessa discussão, com o objetivo de enfraquecer
Moro. A defesa de recriação do ministério, segundo essa fonte, feita por Maia
tem por objetivo emplacar no cargo o correligionário do DEM e ex-deputado
federal Alberto Fraga (DF).
Haveria ainda, por trás
desse debate, ciúmes de Bolsonaro com a popularidade que Moro tem e que, em
razão disso, vez por outra há confrontações. “O jogo de morde-e-assopra é
eterno”, afirmou a fonte.
Publicamente —como em
entrevista à Reuters ano passado— Moro nega ter pretensões eleitorais e diz que
o presidente é o candidato à reeleição do governo, que contará com seu apoio.
Mas há quem aposte que dependendo do cenário em 2022, o ministro pode tentar
conquistar a Presidência.
A eventual iniciativa
de Bolsonaro, se vingar, pode levar a um arranjo semelhante ao que ocorreu no
governo de Michel Temer. Ministro da Justiça à época, Torquato Jardim terminou
relegado ao ostracismo, enquanto Raul Jungmann, que assumiu a Segurança
Pública, se transformou em figura central do governo.
Uma reestruturação do
tipo tiraria de Moro todo o poder de influência no combate à corrupção, foco do
ministro ao aceitar o cargo, já que não poderia contar com a Polícia Federal,
por exemplo, e nem caberia a ele negociar medidas anticrime no Congresso.
Também tiraria de Moro
a área que o ministro mais tem usado para enumerar seus feitos. Sucessos no
combate ao tráfico de drogas e armas e a redução no índice de homicídios são
hoje seus principais temas, inclusive nas redes sociais.
O ministro mais popular
do governo já travou embates com Bolsonaro. Um exemplo disso foi a pressão por
mudanças na cúpula da PF, que está sob comando de Moro.
RECLAMAÇÃO
Um dos aliados mais
próximos de Bolsonaro, Alberto Fraga diz que a recriação do Ministério da
Segurança Pública é uma demanda reclamada pela população brasileira. Ele
atribui o mérito da redução de índices de criminalidade no país ao trabalho
feito pelas policiais estaduais, mas não à atuação de Moro.
“A única medida que o
ministério tomou foi o isolamento de líderes de facções criminosas em presídios
federais. O ministério não é órgão executor das políticas de segurança
pública”, afirmou.
“Não tenho nada e
ninguém pode ter absolutamente nada contra o ministro Sergio Moro, ícone do
nosso pais, agora não querem misturar ou atribuir a Sergio Moro com alguma
coisa da segurança publica que ele não tem nada. Se tivesse, os secretários não
teriam pedido a recriação do ministério”, completou.
Fraga, que disse ter
estado pessoalmente com Bolsonaro três vezes desde sábado, afirmou não ter
tratado do assunto da recriação da pasta e que o presidente foi pego de
surpresa com o pedido apresentado pelos secretários.
“Não, não recebi
convite nenhum... não discuti isso com o presidente”, disse ele, para quem foi
o “maior erro” Bolsonaro ter fundido novamente as duas pastas no seu governo.
Para o ex-deputado, no
entanto, a eventual recriação do ministério não seria uma retaliação a Moro.
BALA CONTRA
Já o presidente da
Comissão de Segurança Pública da Câmara e coordenador da frente parlamentar da
área, Capitão Augusto (PR-SP), avalia que a medida seria uma retaliação ao
trabalho do ex-juiz da operação Lava Jato e disse ser “totalmente contra” a
retirada da área de segurança pública da alçada de Moro.
“Nesse momento,
enfraqueceria o trabalho do ministro Sergio Moro, é um péssimo sinal, péssimo
recado que daríamos aos países que acompanham nosso combate à corrupção”,
avaliou.
Para o Capitão
Augusto, que foi um dos entusiastas da criação do Ministério da Segurança
Pública no governo Temer, não se deve enfraquecer o que está indo “muito bem”.
“Não houve nenhum fato
na educação, saúde e economia para justificar a redução dos índices (de
criminalidade). Houve uma retórica do endurecimento e as polícias se sentiram
mais confiantes e motivadas com o novo governo. Tem sim o ingrediente da
Justiça e Segurança Pública com Moro e obviamente também a retórica do Bolsonaro”,
disse o Capitão Augusto.
O parlamentar afirmou
que, caso a medida seja implementada pelo governo, por meio de projeto de lei
ou medida provisória, vai trabalhar para derrubá-la na Câmara dos Deputados.
“É só ver quem está pedindo isso, a bancada da bala não pediu,
não concordamos com o enfraquecimento do Moro, vamos trabalhar contra ela”,
disse.
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