Milhaes de pessoas foram às ruas em várias cidades brasileiras no domingo, 26, apoiar o governo Jair Bolsonaro. Não foram manifestações gigantes, mas expressivas. Os setores que foram às ruas tiveram como alvo preferencial o chamado "centrão", grupo de parlamentares de partidos de centro e centro-direita, e demonstraram apoio aos projetos dos ministros Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) e Paulo Guedes (Economia).
Os atos foram convocados em resposta aos protestos realizados em 15 de
maio contra os bloqueios anunciados no Orçamento da Educação.
Inicialmente apoiados por Bolsonaro e seus filhos, os protestos de
domingo tinham uma pauta difusa. Na semana anterior, circularam nas redes
sociais mensagens pedindo o fechamento do STF e postagens sobre a manifestação
estavam sendo acompanhadas pela hashtag #vamosinvadirocongresso no Twitter.
Ante a repercussão negativa, principalmente na classe política e mesmo
entre governistas, as bandeiras dos atos passaram a se concentrar em apoio à
Reforma da Previdência e em projetos de Moro e Guedes.
Bolsonaro desistiu de ir ao ato e desencorajou a presença de seus
ministros. No domingo, fez uma série de tuítes apoiando os protestos.
Protestos a favor do presidente Jair Bolsonaro (PSL) levaram milhares de manifestantes às ruas |
"Há alguns dias
atrás, fui claro ao dizer que quem estivesse pedindo o fechamento do Congresso
ou STF hoje estaria na manifestação errada. A população mostrou isso. Sua
grande maioria foi às ruas com pautas legítimas e democráticas, mas há quem
ainda insista em distorcer os fatos", escreveu.
A BBC News Brasil listou sete conclusões sobre as
manifestações.
1 - Não foram gigantes, mas foram expressivas
Havia uma grande expectativa em relação à quantidade
de pessoas que compareceriam às manifestações, principalmente por causa de
divisões na direita no curso das convocações - por causa de pautas consideradas
radicais, grupos como o MBL e deputados do partido governista PSL como Janaina
Paschoal se opuseram aos atos - e pelo recuo de Bolsonaro, que decidiu não ir
Rodrigo Maia virou alvo preferencial dos manifestantes deste domingo, 26 |
O resultado: por um lado, os atos
não foram gigantes; eles perdem na comparação com as manifestações contra os
cortes de verba na educação e dos protestos pelo impeachment da ex-presidente
Dilma Rousseff (PT) em 2015. Por outro, as milhares de pessoas que foram às
ruas mostraram que o presidente ainda conta com uma expressiva base de apoio
que vai às ruas, apesar da queda em sua popularidade nos primeiros meses de
governo.
Kataguiri, líder do MBL, também foi criticado pelos manifestantes; ele havia condenado os atos por seu tom autoritário |
2 - Centrão vira alvo preferencial da direita
"Tudo o que o 'centrão' faz é contra o Brasil.
Eles passam qualquer votação na frente só para prejudicar o Bolsonaro",
afirmou à BBC News Brasil o confeiteiro Valdir dos Santos Vieira, 37 anos, que
foi ao protesto na avenida Paulista, em São Paulo.
A avaliação não foi só de Valdir - o chamado
"centrão" foi o principal alvo de crítica nos protestos pelo Brasil,
tomando o lugar do tradicional "pixuleco" contra o ex-presidente
Lula, por exemplo. O "centrão" é como são chamados os parlamentares
de partidos de centro e centro-direita, como Democratas, Solidariedade, PP, PR,
PSD, PTB, entre outros.
Esse grupo de deputados foi personificado no
deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, alvo de muitos
xingamentos e faixas. Paradoxalmente, Maia é o principal articulador pela
Reforma da Previdência, um dos projetos que o governo Bolsonaro tenta aprovar
no Congresso.
3 - Crise com o Congresso persiste
Analistas dizem que
o tamanho dos protestos não foi suficiente para que
Bolsonaro supere a crise que vive com o Congresso, apesar
de terem mostrado que o presidente ainda tem "bala".
Segundo o jornal Folha de S.Paulo, a exaltação de
Bolsonaro aos atos que criticaram duramente o "centrão" pode ter até
aumentador a crise com o Congresso. Os posts do presidente teriam irritado
parlamentares.
Os cinco meses de administração Bolsonaro têm sido
marcados por uma relação difícil com o Congresso, já que o presidente não
construiu uma base de apoio ao seu governo sob a justificativa de implementar
uma "nova política", sem "toma lá dá cá" ou seja, sem
envolver a distribuição de cargos na máquina federal. Por isso, tem enfrentado
dificuldade para aprovar diversos projetos.
Mas, segundo analistas, os protestos de domingo,
chamados em parte para pressionar pela aprovação desses projetos, não foram
grandes o suficiente para assustar o Congresso.
"Nitidamente, o movimento tinha objetivo de
constranger o Congresso. Se fossem dois milhões de pessoas na rua, certamente o
Congresso ficaria intimidado, mas como ficou aquém do esperado pelos
organizadores acaba contribuindo para piorar a relação", disse à BBC News
Brasil o cientista político da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)
Geraldo Tadeu Monteiro. "Acho que a crise vai persistir porque não há, por
parte do governo, nenhum projeto para construção de uma base."
Outras análises apontam para um certo impulso que
Bolsonaro pode ter ganhado com os atos: "Protestos pró-governo neste
domingo parecem ter dado uma força política ao presidente", avaliou o
Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, dizendo também que o
capital político do presidente se mantém "relativamente robusto".
4 - Racha da direita sai das redes e chega às ruas
Outro alvo dos manifestantes foram membros da
própria direita, concretizando um movimento que já tinha tomado as redes na
semana anterior, com as duras críticas feitas ao líder do Movimento Brasil
Livre (MBL), o deputado federal Kim Kataguiri (DEM).
Kataguiri havia se posicionado contra os protestos
deste domingo, 26, por considerar que apoiavam pautas radicais, como o
fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Nos atos em São Paulo, o
MBL foi chamado de "Movimento Bumbum Livre" pela multidão; e Kataguiri,
de "traidor". O MBL foi um dos principais impulsionadores das
manifestações que apoiaram o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, e ministro da Justiça, Sergio Moro, tiveram seus projetos exaltados |
O governador de São
Paulo, João Doria (PSDB) e a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP), que
também haviam se posicionado contra os atos, também foram alvos. Doria havia
classificado o ato como "inútil" e "inadequado".
5 - Exaltados, Moro e Guedes têm projetos endossados
Os ministros da Economia, Paulo Guedes, e da
Justiça, Sergio Moro, tiveram seus projetos exaltados. Havia um amplo apoio nos
atos à Reforma da Previdência tocada por Guedes e também ao pacote anticrime
proposto por Moro.
No Twitter, Moro também publicou mensagem em apoio
aos protestos. "Festa da democracia. Povo manifestando-se em apoio ao Pr
Bolsonaro, Nova Previdência e ao Pacote anticrime. Sem pautas autoritárias.
Povo na rua é democracia. Com povo e Congresso, avançaremos. Gratidão."
Em São Paulo, a reforma da Previdência foi
amplamente defendida nos carros de som do protesto e pelos manifestantes
ouvidos pela BBC News Brasil. "A reforma é o que o país mais precisa
agora", afirmou o médico Heitor Oliveira
Novo protesto contra cortes na educação foram marcados para dia 30; atos contrários mostram que país segue polarizado |
Os líderes do ato repetiram o discurso do governo e de parte dos atores
econômicos de que a reforma é primordial para fazer a economia andar nos
próximos anos.
6 - STF também é atacado, mas sem radicalismo
anunciado
Mensagens contra o Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive apoiando
seu fechamento, circularam na semana anterior aos protestos. Nos atos em si, o
STF também foi alvo, mas em geral apenas com críticas e não com reivindicações
mais extremas.
No protesto em São Paulo, o STF era um dos alvos preferenciais, com
vaias e até pedidos de impeachment. Os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes
foram xingados, às vezes com palavras de baixo calão.
O STF "está de brincadeira", afirmou o consultor Ricardo
Gerhard. "Eles conseguem votar contra as próprias leis."
Para o médico Heitor Oliveira, o Supremo "não se dá ao
respeito". "Você vê ministro que vive na ponte-aérea Brasil-Lisboa.
Outro que faz palestra em empresa privada ou participa de festas com
advogados", afirma.
"Se os ministros vivem batendo boca entre eles, por que um cidadão
comum não pode questioná-los?".
Já o confeiteiro Valdir dos Santos Vieira cita uma licitação do Supremo
para a compra de vinhos e lagostas, pleito que chegou a ser questionado na
Justiça, mas acabou liberado. "Os caras comem lagosta e o povo passando
fome?", diz.
7
- País segue dividido
Convocadas após os protestos contra o bloqueio de
verbas para a educação que levaram milhares de pessoas às ruas, os protestos
pró-Bolsonaro, apesar de menores, mostraram que o país segue dividido.
Em 2015, o Brasil viu suas ruas sendo tomadas com
protestos ora de esquerda, ora de direita. Um novo protesto contra o governo,
marcado para dia 30, mostra que novamente essa polarização pode ficar mais
escancarada.
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