Uma
pesquisa realizada em parceria entre cientistas da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, com um grupo de pesquisadores da
Universidade de Harvard (EUA), descobriu por acidente como acontece o processo
de despigmentação capilar e como impedir este problema. A coordenação do trabalho
foi feita pela professora de Biologia Regenerativa Ya-Chieh Hsu, e os
resultados foram divulgados na revista Nature.
A humanidade já
percebeu há muito tempo que uma pessoa que passa por um trauma ou estresse
muito grande fica com mais cabelo branco, mas até agora não se sabia
exatamente por que isso acontece. É interessante notar que o
fenômeno não é exclusivo de humanos, e que também acontece com outros mamíferos
como ratos de laboratório.
O estudo em questão
obteve a resposta para este problema milenar quando estudava a consequência da
dor em ratos da linhagem Black-C57, que têm pelagem completamente escura. Os
pesquisadores injetaram uma substância chamada resiniferatoxina para ativar um
receptor de dor nos animais. Quatro semanas depois da injeção da toxina, foi
observado que os animais estavam com os pelos completamente brancos. O
experimento foi repetido algumas vezes e os resultados foram
consistentes.
O processo de despigmentação
Quando há dor, o
sistema nervoso simpático faz o coração bater mais rápido, a pressão arterial
subir, a respiração acelerar e as pupilas dilatarem. Ou seja, há uma resposta
típica de estresse no corpo.
“Aqui reportamos que,
em ratos, estresse agudo causa o embranquecimento de pelos através da perda de
células-tronco de melanócitos”, escrevem os autores no trabalho. Eles apontam
que este processo é independente do ataque imunológico ou de hormônios de
estresse adrenal. Ao invés disso, a despigmentação capilar resulta da ativação
dos nervos simpáticos que inervam as reentrâncias das células-tronco dos
melanócitos existentes dentro do bulbo capilar.
São essas células as
responsáveis pela geração de células produtoras de melanina, o pigmento que dá
cor aos fios capilares.
Sob
condições de estresse, a ativação desses nervos simpáticos leva à grande
liberação do neurotransmissor noradrenalina. Isso faz com que as células-tronco
de melanócitos em repouso se proliferem rapidamente e que também se esgotem
rapidamente. Em outras palavras, o estresse envelhece as células-tronco
melanocíticas.
Uma vez que isso
acontece, o fio capilar não recupera nunca mais a sua cor original, e sempre
será branco. O dano é permanente.
Como impedir o processo
Depois que os
pesquisadores injetaram a resiniferatoxina nos ratos, eles foram tratados com
guanetidina, um anti-hipertenso capaz de inibir a neurotransmissão pelas fibras
simpáticas. Assim o processo de embranquecimento foi bloqueado.
Outra forma de
interromper a despigmentação foi pela remoção cirúrgica das fibras simpáticas
dos animais. Nas semanas seguintes ao procedimento o pelo parou de mudar de
cor.
Proteína CDK
Os cientistas também
encontraram os genes que mais se alteram com o estresse, e um deles se
destacou. Ele codifica uma proteína chamada CDK, a quinase dependente de
ciclina, enzima que participa da regulação do ciclo celular.
Eles então repetiram o
procedimento de indução da dor e ao mesmo tempo trataram os animais com um
inibidor da enzima CDK. O resultado foi que o processo de envelhecimento
precoce das células-tronco melanocítica foi prevenido, e os pelos pararam de
ficar grisalhos.
Parceria
USP-Harvard
Esta valiosa parceria
aconteceu porque o pesquisador brasileiro Thiago Mattar Cunha passou os anos de
2018 e 2019 na instituição americana como professor visitante, com bolsa
oferecida pelo programa Capes-Harvard. Ao conversar com os colegas de Harvard,
ele ficou sabendo que um grupo de pesquisadores da universidade havia atingido
os mesmos resultados que o grupo dele já havia conseguido na USP, também de
forma acidental. A professora Hsu então o convidou a integrar um projeto de
investigação do fenômeno. [Nature, Governo do
Estado de São Paulo, BBC]
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