Política
Sem diálogo nem interlocutores com o Congresso, governo está às voltas com um grupo de deputados que decidiram se unir em pleno ano eleitoral
Marcela Mattos, de Brasília
SEMPRE ELE – Eduardo Cunha reúne líderes dos partidos: dor de cabeça para o Palácio do Planalto à vista (Sergio Lima/Folhapress)
Em um ano que será tomado por eleições e pela realização da Copa do Mundo no Brasil, o que fatalmente se refletirá em produtividade quase nula no Congresso Nacional, a presidente Dilma Rousseff ganhou uma nova – e nada agradável – novidade em sua desarticulada base parlamentar: oito partidos anunciaram a formação de um "blocão", com 242 deputados (47% da Câmara).
Das oito siglas que compõem essa massa parlamentar – PDT, PSC, PP, Pros, PMDB, PTB e PR –, somente o Solidariedade é assumidamente de oposição.
Porém, a movimentação partidária alarmou o Palácio do Planalto, que agora poderá ser pressionado a negociar a aprovação dos seus projetos com um grupo que detém metade dos votos da Câmara.
A esse cenário desfavorável, soma-se a inabilidade dos articuladores políticos do governo, com a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) à frente, em dialogar com o Congresso, palco de sucessivas rebeliões.
Embora ainda não tenha destacado um líder para assumir a linha de frente do bloco, o principal articulador do grupo é uma antiga pedra no sapato do governo: o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
O parlamentar já escolheu sua primeira batalha: derrubar o projeto do Marco Civil da Internet. Com cinco ministérios, o PMDB também está insatisfeito por não ter ganhado mais espaço no governo nas mudanças feitas por Dilma até agora.
Ainda restam dúvidas sobre o real potencial da associação de siglas: a fidelidade do grupo não foi testada em nenhuma votação nem ficou determinado quanto tempo as legendas atuarão em conjunto – uma possibilidade, por exemplo, é que o governo libere verbas represadas de emendas parlamentares em ano eleitoral para acalmar os ânimos.
Outro ponto ainda sem resposta é o grau de envolvimento de um partido de oposição em um grupo de parlamentares cujos partidos deverão apoiar a reeleição de Dilma.
“Eu sou o incendiário”, resume o líder do Solidariedade, Fernando Francischini (PR). No próximo dia 11, o grupo vai se reunir para discutir projetos comuns e levá-los à votação.
De olho na reeleição, também irrita os parlamentares o isolamento das ações organizadas pelo Planalto. “Nós estamos aqui votando, aprovando matérias do governo, mas nenhum ministro nos recebe.
Eles enviam bilhões para o nosso Estado, discutem a seca que o assola, mas não escutam e nem convidam o Congresso.
Somos substituídos por técnicos”, desabafa o líder do Pros, Givaldo Carimbão (AL). “Eu sou constantemente cobrado.
Os deputados do partido reclamam que estão sendo atropelados. Eles querem mostrar resultado, chegar lá na ponta, mas não conseguem”, complementa o líder do PR, Bernardo Santana (MG).
“O que dói em um, dói em outro”, resume o líder do PTB na Câmara, deputado Jovair Arantes (GO).
Há um mês, Dilma designou seu novo homem forte do governo, Aloizio Mercadante (Casa Civil) para tentar realinhar a relação com o Congresso.
No primeiro contato direto, porém, fracassou: ao lado de Ideli e do vice-presidente, Michel Temer, que exerce o papel de apaziguador da bancada do PMDB, Mercadante errou o tom.
Ao tentar recuperar o apoio, afirmou aos deputados do “blocão” que a recondução da presidente estava consolidada e que os deputados deveriam "tirar foto com a Dilma”. A ação só piorou os ânimos.
Petrobras – A estreia do “blocão” aconteceu na última terça-feira. Diante das denúncias de que a Petrobras recebeu propina para favorecer contratos de uma empresa holandesa, conforme revelou VEJA, os deputados se articularam para apurar o caso com a criação de uma comissão externa.
O governo ainda tenta abafar o problema e, na Câmara, trabalhou para retirar a proposta de pauta. Mas não obteve sucesso: o requerimento foi rejeitado por 261 votos a 80. O "blocão" ganhava seu primeiro round.
“Nós derrotamos o governo. O resultado político já foi obtido. Enquanto não votarem a criação de uma comissão externa, vou obstruir a pauta. Ou vota isso ou não vota nada”, afirmou Eduardo Cunha.
Acuado, o Planalto teve o apoio do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Ao final do prazo regimental para a votação da matéria, Alves não pautou novamente o tema e empurrou a votação para o dia seguinte – uma quarta-feira esvaziada por causa do feriado de Carnaval.
Sem quórum, a votação foi remarcada para o próximo dia 11.
Depois da trapalhada no primeiro contato, Mercadante procurou individualmente os líderes dos partidos para ouvir as demandas e tentar aplacar os ânimos.
Além disso, doze ministros, entre eles Aguinaldo Ribeiro (Cidades) e Francisco Teixeira (Integração Nacional), foram escalados para ouvir os deputados depois do Carnaval. Eles farão uma espécie de “plantão” na Câmara – algo inédito na gestão Dilma.
O governo também estuda montar um cardápio de pautas de apelo popular que podem ser aprovadas ainda neste ano.
Para isso, precisa retirar a urgência de cinco projetos prioritários do Executivo que impedem a votação de outras matérias – começando pelo Marco Civil da Internet.
A partir daí, o "blocão" poderá até ser dissolvido. Mas, para um governo que nunca se empenhou em manter diálogo com o Congresso, o recado dos deputados foi dado.
Quem é quem no "blocão"
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Eduardo Cunha (PMDB)
O líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), carrega a contradição de comandar o maior partido de apoio ao Palácio do Planalto e, ao mesmo tempo, ter articulado derrotas para o governo na Câmara. Partiu dele, acompanhado pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), a criação do bloco informal para cobrar uma mudança de postura da presidente Dilma Rousseff. A investida já deu resultado: mobilizou 261 votos favoráveis à investigação sobre o suposto recebimento de propina da Petrobras. Mas Cunha quer mais: além de derrubar o Marco Civil da Internet, o partido, quer mais cadeiras na reforma ministrial de Dilma.
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