Procuradoria pede que Corte avalie prática de delito de senador, que resgatou R$ 2 milhões um dia antes da intervenção no banco. Sarney e o banqueiro Edemar Cid Ferreira são amigos há décadas
O senador José Sarney, ex-presidente do Senado, durante sessão (Antonio Cruz/ABr)
O Ministério Público Federal de São Paulo entregou à Procuradoria-Geral da República um parecer em que aponta "elementos concretos de possível prática de delito" envolvendo o senador José Sarney (PMDB-AP) no caso do Banco Santos. O escândalo envolvendo o banqueiro Edemar Cid Ferreira aconteceu em novembro de 2004, quando a instituição sofreu uma intervenção do Banco Central. Sarney, por sua "relação estreita" com o banqueiro, teria se beneficiado da notícia de que o banco passaria por um processo, resgatando 2,159 milhões de reais (em valores da época) antes de o BC intervir.
Em manifestação de 48 páginas, o MPF deixa a critério da Procuradoria-Geral da República eventual enquadramento penal de Sarney. O documento destaca que a data do saque ocorreu "apenas um dia antes da intervenção" e aponta a "proximidade de Sarney com Cid Ferreira, amigos íntimos há mais de três décadas". A Procuradoria da República pede à Justiça Federal que remeta os autos ao Supremo Tribunal Federal (STF). O processo deverá ser conduzido na Suprema Corte porque Sarney tem foro privilegiado e apenas o STF detém poder constitucional de processar e julgar senadores.
O MPF assinala que o banqueiro e sua mulher são padrinhos de casamento da filha de Sarney, a governadora Roseana Sarney (PMDB), do Maranhão. Cita o depoimento de uma ex-executiva do Banco Santos, que afirmou ter recebido um manuscrito contendo instruções para efetivação do resgate, "documento este que se apurou ter sido escrito por Cid Ferreira, entre outros elementos constantes da apuração da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)".
A intervenção do BC alcançou o Banco Santos e a Santos Corretora de Câmbio e Valores devido "ao comprometimento da situação econômico-financeira" da instituição. O BC comunicou rombo de 2,3 bilhões de reais e perda de liquidez no banco.
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A Polícia Federal abriu inquérito para apurar o caso. Em dezembro de 2006, o banqueiro foi condenado a 21 anos de prisão por formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta. Cid Ferreira reagiu às acusações e recorreu ao Tribunal Regional Federal.
A CVM analisou em que condições foram realizados os resgates mais representativos em termos financeiros nos fundos sob administração do Banco Santos na semana de 8 a 12 de novembro de 2004 e se houve insider trading - informação privilegiada - e favorecimento a cotistas que evitaram perdas.
Sarney era cotista exclusivo do Fundo Titanium FAQ, que aplicava suas cotas no Santos Credit Yield FIF e Santos Credit Master FIF. Do valor resgatado, 2.059.541,91 de reais foram para a conta do senador no Banco do Brasil e 100.000 reais para sua conta no próprio Banco Santos. A transferência ocorreu no dia 11 de novembro de 2004, um dia antes da intervenção.
Privilégios - À CVM, Sarney afirmou não ter recebido informação privilegiada e que uma das razões que o levaram a retirar os recursos é que era fato "público e notório" que o banco atravessava "dificuldades financeiras". Outra justificativa para a retirada dos recursos do Titanium FAQ, anotou Sarney, residiu no fato de a gerente de conta que o atendia há bastante tempo e que cuidava de seus recursos, Fernanda Amendola Bellotti, ter sido demitida no início de novembro de 2004.
A CVM arquivou a apuração por "não ser possível construir e respaldar uma acusação de uso indevido de informação privilegiada em face do cotista José Sarney".
O MPF vê indícios de crime. "Embora estejamos diante de 'valores mobiliários' caberá ao procurador-geral da República e ao STF analisar o enquadramento típico da conduta (de Sarney)."
(Com Estadão Conteúdo)
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