Um cadáver na Operação Lava Jato
Com dinheiro sujo, o PT comprou o silêncio de um empresário que ameaçava dar informações sobre o suposto envolvimento de Lula, José Dirceu e Gilberto Carvalho no assassinato de Celso Daniel. A Polícia Federal prendeu esse empresário Por: Rodrigo Rangel e Robson Bonin -
CENA DO CRIME - O prefeito de Santo
André Celso Daniel foi sequestrado e assassinado em 2002. Sua família sempre
acusou dirigentes do PT de estarem por trás do homicídio (EPITACIO PESSOA/Estadão Conteúdo)
José Dirceu conversava animadamente
em um restaurante de Brasília, no ápice da campanha presidencial, em 2002,
quando foi interrompido por um homem bem vestido, de terno.
Carregando uma
valise, ele chegou apressado e fez sinal com as mãos de que precisava falar
reservadamente.
O então coordenador da campanha de Lula se levantou e
apresentou o interlocutor: "Este aqui é o Delúbio, nosso tesoureiro".
Os dois seguiram para um canto vazio e cochicharam por alguns minutos. Delúbio
Soares passou rapidamente pela mesa, acenou e foi embora.
Dirceu voltou ao seu
lugar. Parecia transtornado.
"Os tucanos estão preparando uma armadilha
para nos destruir." "Que armadilha?", alguém perguntou.
"Fizeram um dossiê para nos envolver no assassinato do Celso Daniel.
Dizem
que tem gravações telefônicas, depoimentos, gente do PT...". Antes de se
despedir, Dirceu dimensionou o que estaria por vir:
"Isso é muito grave.
Precisamos reagir rápido, abortar o plano de qualquer maneira".
Na
conversa, que VEJA testemunhou, petistas e simpatizantes que estavam à mesa
combinaram uma estratégia de defesa.
Era preciso que se antecipassem,
denunciando a farsa antes que viesse a público. Era preciso esclarecer que o
caso constituía uma tentativa de golpe sujo e desesperado do governo tucano
para atrapalhar a eleição de Lula.
O assassinato do prefeito Celso
Daniel, de Santo André, ocorrido em janeiro de 2002, nunca deixou de assombrar
o PT, fosse na forma de chantagens eleitorais ou de investigações policiais
que, até hoje, não esclareceram a morte do prefeito.
Assim, a dúvida sobre o
envolvimento de petistas no caso paira no ar como uma nuvem de enxofre capaz de
contaminar ainda mais o pântano em que se meteu o partido.
Na semana passada, a
mais recente fase da Lava-Jato voltou a agitar o fantasma de Celso Daniel.
A
operação foi chamada de Carbono 14, numa referência ao elemento usado pela
ciência para desenterrar o passado.
Mas o que um homicídio de catorze anos
atrás tem a ver com a roubalheira na Petrobras? As conexões são um pouco
intrincadas, mas, seguindo-se o calendário das investigações, tudo fica mais
claro.
O começo se dá em 2012. VEJA revelou
que Marcos Valério ainda guardava consigo segredos devastadores.
Em depoimento
à Procuradoria-Geral da República, o famoso operador do mensalão resolveu
detalhar alguns deles.
Um, em especial, parecia mirabolante. Valério disse que
um obscuro empresário de Santo André, Ronan Maria Pinto, acionou o então
secretário do PT, Silvio Pereira, para chantagear o ex-presidente Lula.
A
chantagem: ou o PT lhe dava 6 milhões de reais ou ele revelaria o envolvimento
de Lula, José Dirceu e Gilberto Carvalho no assassinato de Celso Daniel.
Disse
mais: os 6 milhões de reais foram negociados pelo pecuarista José Carlos
Bumlai, que tomou o dinheiro do cesto de picaretagens petistas na Petrobras.
Diante dessa história, os investigadores arregalaram os olhos - era forte, mas
também poderia ser resultado de imaginação positivamente fértil.
Em 2014, dois anos depois, durante as
investigações da Lava-Jato, a polícia encontrou num escritório de contabilidade
um contrato confidencial.
Pelo documento, Marcos Valério emprestava 6 milhões
de reais ao empresário chantagista Ronan Maria Pinto.
O valor e o nome dos
personagens acenderam uma luz vermelha. A polícia então interrogou a dona do
escritório de contabilidade, Meire Poza.
Ela contou que o contrato pertencia a
um notório lavador de dinheiro chamado Enivaldo Quadrado.
E Enivaldo Quadrado
dizia que guardava uma via do tal contrato para resguardar-se. Era seu
"seguro de vida contra o PT", uma "arma que derrubaria o
Lula".
E, claro, um instrumento para arrancar uma graninha do PT.
E
explicava que os tais 6 milhões do empréstimo serviriam para pagar a chantagem
que Ronan Maria Pinto vinha fazendo contra o PT.
O quebra-cabeça começava a
tomar uma forma mais clara.
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