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Por Jorge Alberto Forrer Garcia
Recebendo o cartaz abaixo de um correspondente pela Internet e o comentário pelo qual se mostrava surpreso pela natureza do evento, fiz minha inscrição no seminário e na data aprazada compareci no Instituto de História da UFRJ. Abaixo, segue o cartaz de convocação para o evento e um relato do que vi.
O seminário começou na hora e no local marcados com cerca de 80 presentes, a maioria de mulheres jovens, professoras dos ensinos fundamental e médio, predominantemente das redes municipal e estadual do Rio de Janeiro/RJ. Na mesa de abertura, além dos nomes já previstos, contou-se ainda com a presença do presidente da comissão da verdade do Estado do Rio de Janeiro, que abriu os trabalhos informando que as atividades em desenvolvimento faziam parte de um quadro maior relacionado com a Comissão Nacional da Verdade (CNV).
Disse da importância desse trabalho junto às escolas e que, por conta disso, já se tinha conseguido que a própria população escolar de uma antiga Escola “Marechal Costa e Silva” houvesse decidido – democraticamente substituir esse nome por outro. Disse que uma subcomissão da CNV/Rio estará aumentando a frequência de visitas às escolas visando a uma boa preparação para os 50 anos do Golpe”. Finalizou dizendo que, para isso, terão muita importância os livros didáticos que estão sendo preparados pela CNV.
A primeira das senhoras a usar da palavra falou da necessidade de uma re-contextualização do “Golpe de 64” de modo a que se proporcione aos professores dos níveis escolares elementares uma “uniformização de pensamentos” (sic) entre professores e alunos, de modo que o professor deve atender às orientações de uma Gerência de Passados Sensíveis, para se construir uma “memória coletiva” ou “campo semântico comum, formando, a partir daí, uma identidade nacional nova quanto ao tema “a ditadura militar nas escolas.
Do modo como está hoje, os professores agem por “escolha própria” na seleção de materiais para a elaboração de aulas. Tudo recai na escolha pessoal, pois os meios que se mostram mais disponíveis às mãos dos professores são os livros de história, que, muitos, por serem escritos por autores reacionários, podem mais confundir do ajudar os mestres; além dos filmes e das músicas. Neste ponto, algumas pessoas da platéia sugeriram o emprego de testemunhos de pessoas em sala de aula. Foi sugerido que se tivesse muito cuidado para com as pessoas levadas a testemunhar, haja vista a eventual necessidade de um possível contraditório.
A palestrante sugeriu que tão logo estivessem disponíveis os relatórios da Comissão Nacional da Verdade, sejam estes aproveitados como material didático na preparação de alunos e professores sobre as memórias do “Golpe de 64”, e que – os professores - acreditassem no “saber acadêmico”.
O ponto focal do seminário foi a defasagem que existe entre o “saber acadêmico” sobre o período da “ditadura militar” e o “saber escolar” sobre esse mesmo assunto, pois, segundo os organizadores, os professores das redes municipal e estadual não estão preparados para abordar a questão da ditadura com propriedade, precisando, no atual momento, receberem uma base comum, para que não fiquem à mercê de suas próprias escolhas quando tiverem de tratar sobre isso com seus alunos. Some-se o fato de que se estiverem mais bem preparados, saberão portar-se diante de eventuais perguntas ou posicionamentos de alunos e pais que demonstrem ver aspectos positivos no golpe militar de 1964. (Grifado pelo autor).
As apresentadoras disseram estar em fase de montar currículos e atividades adequados para esse fim de modo a que Escola e Academia tenham um “saber comum” para o ensino da ditadura militar nas escolas. A Academia propõe-se a descer de seu pedestal para ajudar a Escola, aproximando seus “saberes”. Quer dizer, afinando os discursos entre si.
Falou em seguida o Diretor da Faculdade de Educação do Rio de Janeiro, dizendo que muito de seu tempo naquela faculdade tem sido tomado pelo ensino das Questões Sensíveis, entre estas a questão do ensino do “Golpe de 1964“. Anunciou que em 2014 já estará em funcionamento em sua faculdade um Curso de Mestrado Profissional em História para a Rede Pública. Terá a duração de 510 horas. A linha pedagógica do Curso será a deshomogeneização de assuntos da História, como o estudo do holocausto sem os judeus (transmudando a idéia de perseguidos, vítimas de genocídio...); a Escravidão no Brasil sem os negros (os sofridos, os abandonados...)
Por fim, falou a quarta das palestrantes do evento. Denotando ter experiência internacional em “como” os países da América Latina trataram a posteriori o ensino dos golpes militares sofridos em seus países. Disse que o Brasil é o país mais adiantado no ensino da ditadura militar embora ainda não tenha feito a “lição de casa” com a sua CNV. Chile e Uruguai seriam os mais atrasados neste aspecto, pouco ou nada tendo feito para o ensino do assunto “ditaduras militares” em seus currículos escolares atuais.
Relatou que vários estudos experimentais vêm sendo conduzidos por ela no Colégio de Aplicação no Rio, que ela chamou de seu “campo de provas”. Voltou a dizer algo semelhante a “se a memória construída for sólida, menos chance se dará à atividade de escolha por parte dos professores.”
Ao final da parte da manhã foi aberta a palavra aos participantes, tendo-se ouvido de vários deles a pergunta de como esse trabalho seria feito nos colégios militares, que se mostram “muito reacionários” quando se trata desse assunto. Uma das professoras apresentadoras disse que esse era um problema mais difícil de resolver, mas que haveria seu tempo.
Na parte da tarde, os participantes foram divididos em duas turmas (cerca de 40 em cada grupo) e, depois, cada “grupão” foi dividido em pequenos grupos de 5 pessoas, a fim de serem realizadas as oficinas, que foram as mesmas para ambos os “grupões”. Numa primeira solicitação, pediu-se que cada pequeno grupo apresentasse a relevância do ensino da ditadura militar nas escolas. Numa segunda questão, perguntava-se como estaria a cabeça do professor às vésperas de ministrar uma aula sobre a ditadura militar quanto aos meios a sua disposição: livros, filmes, novelas, revistas, conhecimentos pessoais, lembranças, testemunhos...
Na segunda oficina foi entregue a cada aluno um envelope contendo documentos relacionados com o período dos governos militares:
- um exemplar de cópia da Lei de Segurança Nacional;
- uma cópia do frontispício do jornal A Forja, trazendo notícias de greves de metalúrgicos;
- cópia da carta manuscrita da mãe de um preso político ao então Sr. Ministro da Justiça Armando Falcão;
- cópias de 4 correspondências oficiais tratando da censura;
- uma lista de verbetes, que a esse autor pareceu ser falsa, e que seria usada pelos militares para definir palavras como “subversão”, “ação do Comunismo”, “ação repressiva” e “torturadores” (que interesse teriam as Forças Armadas em definir essa palavra?), entre outras;
- uma cópia de uma nota de jornal recente falando de um desaparecido político; e
- cópias de 4 fotografias de presídio Memorial da Tortura, localizado onde era o antigo DEOPS/São Paulo, mostrando celas e inscrições nas paredes.
Os alunos foram convidados a escolher tão somente um daqueles materiais e dizer como fariam o seu aproveitamento para preparar uma aula sobre a ditadura militar para a sua escola, designando o ano de ensino em que seus alunos estariam. A resposta seria grupal, isto é, deveria ser um consenso entre o pequeno grupo. As respostas foram as mais diversas, mas houve predominância para o emprego das fotos do presídio-memorial de São Paulo. Uma participante, ao tratar desse edifício, disse que o Rio de Janeiro também precisaria de um desses e que talvez este fosse o quartel do 1° BPE (DOI/CODI), tendo a professora deixado entreouvir que talvez num outro lugar, pois este estava muito difícil.
Deu-se o encerramento sendo distribuído aos participantes o livro “Ditadura Militar e Democracia no Brasil: História Imagem e Testemunho”, organizado por Maria Paula Araujo, Izabel Pimentel da Silva e Desirree dos Reis Santos, pela editora Ponteio (cognome da Editora Dumará), ano de 2013. Foi informado ser esta a primeira edição e sua liberação esteve na dependência de algumas questões autorais que foram resolvidas, proporcionando a sua distribuição em tempo. O livro contou com o apoio do Laboratório Universitário de Publicidade Aplicada (Lupa Eco-UFRJ) e realização da UFRJ, Projeto Marcas da Memória, Comissão de Anistia Ministério da Justiça e Governo Federal (ISBN 978-85-64116-63-4).
Como obter o livro:http://www.historia.ufrj.br/pdfs/2013/livro_ditadura_militar.pdf
Antes de retirar-me, identifiquei-me, dizendo à coordenadora que respeitava seus pontos de vista, mas não concordava em nada com as idéias ali expostas. Sua expressão foi de espanto. Depois, fiz entrega a uma das professoras de um material escrito (à variadas mãos) com o posicionamento de alguns militares sobre a contra-revolução democrática de 31 de Março de 1964, mesmo sabendo ser atitude vã, pois a “Academia” nunca compreenderá o tema como por nós ali descrito.
Conclusão deste participante: gramscismo puro, da mais alta qualidade.
Jorge Alberto Forrer Garcia é Coronel de Cavalaria e Estado-Maior, na reserva. Chefiou o Centro de Documentação do Exército (C Doc. Ex – hoje desativado). Originalmente publicado no site EscolasemPartido.org – e veiculado no Boletim número 24 da Campanha Brasil Acima de Tudo, circulando a partir de 14 de Fevereiro de 2014.
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