02/01/2014
às 15:01 \ Política & CiaLula mente descaradamente ao enxergar “pensamento único” da imprensa, a favor, durante o governo FHC — e omite que ele próprio foi “blindado” de críticas por longo período
Publicado originalmente em 25 de setembro de 2013
Como ele só fala para a companheirada, encontra sempre ouvidos amigos e aplausos. Com jornalistas minimamente independentes, de quem foge como o diabo na cruz, ele não se encontra há séculos.
Ontem, Lula concedeu uma entrevista a jornalistas de publicações sindicais ou ligados ao movimento sindical. Veículos amigos, portanto.
Disse que não haveria “perguntas proibidas”, mas nada respondeu de concreto sobre o mensalão, uma vez mais — embora alegue estar com “cócegas na garganta” e ter “muito a contar” –, alegando que espera o final do julgamento.
Nada disse, nem lhe foi perguntado, sobre o escândalo de sua amiga do peito Rosemary Noronha, que fez do escritório da Presidência em São Paulo um balcão espúrio de tráfico de influências.
O blog de Augusto Nunes lembrou esta semana que Lula ultrapassou a vergonhosa barreira dos 300 dias de absoluto silêncio sobre um caso no qual tem a irrecusável responsabilidade de haver colocado “Rose” — a Rose de tantas viagens no jato presidencial sem qualquer função definida — no cargo desde o início de seu governo e, depois de seus oito anos no Planalto, ter pedido à presidente Dilma que a mantivesse.
Entre outros pontos escandalosos de sua entrevista, há a crítica — inevitável, em se tratando do grão-senhor do lulalato — à imprensa. Fantasiosa, como sempre, e, no caso específico, mentirosa.
Vejam só:
“Muita coisa evoluiu no Brasil, mas os meios de comunicação não quiseram evoluir. Saíram de um momento de pensamento único em defesa do governo anterior ao nosso e passaram a um pensamento único contrário. Até hoje continua assim”.
Pensamento único em defesa do “governo anterior”? (Ele agora deu de não mais citar sua obsessão freudiana, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.)
Como assim, cara-pálida? Lula está querendo reescrever a história recente! Mas ela foi vivida por milhões de brasileiros!
Tudo bem que Lula não gosta de ler, mas, durante o governo FHC (1995-2003), para qualquer pessoa que haja acompanhado com um mínimo de sentido comum o período, o presidente não passou uma semana sem levar bordoada.
FHC não teve sequer os tais 100 dias de lua de mel.
Mal sentado na poltrona de seu novo gabinete no Planalto, para começar, FHC já enfrentou uma enorme barragem de críticas — corretas, aliás — por não ter peitado o Congresso e vetado lei que anistiou o então senador Humberto Lucena (PMDB-PB) de condenação por crime eleitoral.
A partir daí, jornais como a Folha de S. Paulo encontravam alguma razão para criticar o presidente dia sim, dia não.
Qualquer pessoa com um mínimo de equilíbrio que consultar a coleção de VEJA desde seu lançamento, em 1968, disponível neste link, constatará que a revista publicou no mínimo uma centena de reportagens que não agradaram ao Planalto durante o governo FHC, e dezena e meia de reportagens de capa.
FHC foi criticado — em jornais, revistas, sites noticiosos, blogs, emissoras de rádio e TV por gente de esquerda e de direita, por intelectuais, por colunistas, por sindicalistas, – por sua aliança com o então PFL (hoje DEM), por ser apoiado pelos fisiológicos do PMDB (os mesmos que foram depois, correndo, para o colo de Lula), por privatizar estatais, pela forma como privatizou, por privatizar muito, por privatizar pouco, por ter iniciado a reforma da Previdência (veja-se o que se diz, até hoje, do fator previdenciário, instituído por lei proposta por seu governo), por não ter ido fundo na reforma da Previdência, por haver conseguido quebrar o monopólio estatal sobre o petróleo, por não ter aprofundado a quebra de monopólio, por criar o Ministério da Defesa — sempre ocupado por um civil, com a extinção dos ministérios militares –, por não haver reformado mais ainda as Forças Armadas, por ter criado uma “rede de proteção social” (origem do Bolsa Família do lulalato), por não ter ampliado suficientemente a rede…
A coisa não acaba mais. E a metralha de críticas sobre a REELEIÇÃO? Já esqueceram?
E as críticas por não ter recusado o apoio de Maluf em 1998? E por haver abrigado ministros como Renan Calheiros ou Íris Rezende?
FHC foi tão criticado como qualquer outro presidente.
Achar que houve “blindagem” a ele e seu governo pela “mídia” — como se a grande imprensa fosse algo compacto, unívoco, de pensamento único, posicionamento e interesses únicos, e de teor invariavelmente conspiratório — é simplesmente trombar escandalosamente com os fatos.
Blindagem houve, sim, a ele, Lula, por parte da maior parte dos veículos de imprensa, e sobretudo dos repórteres encarregados de cobrir suas atividades desde os primórdios de sua atuação sindical, nos anos 70. O fato de Lula nunca admitir esse fato notório também integra sua tendência a querer reescrever a história — no caso, a sua própria.
A lua-de-mel longuíssima somente começou a acabar no dia em que um repórter da Folha de S. Paulo — para espanto absoluto de Lula e de seu séquito — ousou contar que o já então ex-deputado constituinte e ex-candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva havia se referido ao Presidente Itamar Franco (1992-1995), numa rodinha com jornalistas supostamente “amigos”. como sendo um “filho da puta”.
Este foi o ponto fora da curva na cobertura de um Lula de que até então, de forma esmagadora, ressaltava sobretudo o carisma, a liderança, a capacidade de mobilização, a astúcia nas negociações, a energia e disposição com que o pobre migrante nordestino subiu na vida até fundar e colocar de pé um partido político – deixando de fora seu lado escuro e criticável.
Lula mente descaradamente quando afirma que não houve críticas a FHC e torna a tapar o sol com a peneira ao fingir que não existe um monumental esquema de sustentação à presidente Dilma e ao lulopetismo nos meios de comunicação, sobretudo na internet, mas que abrange também revistas e um sem-número de colunistas, inclusive na grande imprensa “burguesa”.
O fato de que parte desse esquema se assente sobre espaços alugados e pagos não exclui a realidade de que eles não apenas sustentam ideias e ações do lulopetismo, como metralham de forma incessante e frequentemente vil os adversários, especialmente do PSDB, e mais ainda se próximos a FHC.
O Lula que pediu desculpas aos brasileiros pela TV pelo mensalão em 2005, sem contudo explicar nada nem admitir nada, e nem esclarecer quem supostamente o “traiu”, continua o mesmo.
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