Reportagem de Filipe Vilicic, publicada em edição impressa de VEJA
A RECONQUISTA DA LUA
Mais de três décadas depois dos tempos áureos da corrida espacial, orientais e ocidentais voltam a esquentar a disputa pela exploração do satélite
Doze astronautas ─ todos americanos ─ já caminharam pelo solo lunar. Eles cumpriram o feito em um período de apenas três anos, entre 1969 e 1972.
O mais recente foi Eugene Cernan, no ápice da derradeira missão Apollo 17. A corrida pela Lua marcou a Guerra Fria como uma competição entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética para ver quem ostentava o maior salto tecnológico para a humanidade, ainda que fossem pequenos passos para os homens que lá estiveram.
Apesar de os soviéticos terem sido os primeiros a enviar uma sonda ao satélite, em 1959, e terem fechado a disputa em 1976, com o lançamento da espaçonave Luna 24, perderam a batalha. Afinal, nunca fizeram uma missão tripulada para lá. Desde então, porém, o interesse pela Lua (e por aventuras espaciais, em geral) caiu drasticamente.
Aos fascinados pela exploração do cosmo, uma boa notícia: esse cenário acaba de sofrer uma reviravolta e tudo indica que haverá uma nova corrida pela Lua. Desta vez, a disputa é entre Oriente e Ocidente. Mudou também o objetivo: estabelecer a primeira colônia humana fora da Terra.
Os chineses estão na frente. Provaram isso com o lançamento da primeira missão com a meta de pousar na Lua desde a década de 70. A sonda ChangE3 (Chang é a deusa que representa a Lua na mitologia chinesa) saiu da Terra no dia 1º de dezembro e tocou a superfície lunar duas semanas depois. A espaçonave é equipada com sensores que estão analisando, em detalhes, a estrutura e a composição do solo até a profundidade de 30 metros – um recorde para a astrofísica.
A meta real, contudo, é outra. O governo chinês quer marcar território no espaço, mostrando que detém poderio tecnológico equivalente ao dos Estados Unidos. Para isso, já planeja sua primeira missão tripulada ao satélite.
Do Oriente, ainda estão nessa disputa Índia e Japão. Os indianos pretendem enviar, nos próximos anos, uma sonda motorizada para circular pela Lua. A Jaxa, a agência espacial japonesa, quer uma missão tripulada em 2020 e sonha em estabelecer uma colônia humana fixa nos anos 2030.
A repentina concorrência oriental despertou os americanos (e seus principais associados na empreitada de se aventurar pelo universo, os europeus). Desde julho de 2011, quando foram aposentados os ônibus espaciais da NASA, os Estados Unidos passaram a apostar em parcerias com empresas nas incursões a regiões mais próximas da Terra. Assim, a NASA pode focar o grosso de seu orçamento em planos ambiciosos, como levar humanos a Marte, iniciativa que promete concretizar em torno de 2030.
A mudança de rumo teve efeitos positivos. Um modelo de espaçonave a ser desenvolvido em 2015 em um concurso promovido pelo Google levaria à Lua uma estufa com uma série de sementes que devem crescer à base da luz solar e de irrigação feita por um dispositivo automático.
Diz o astrofísico Roberto Dias da Costa, da Universidade de São Paulo: “A Lua é o laboratório onde cientistas podem estudar como explorar o restante do sistema solar”. O astro ainda tem mais um propósito seminal. Entendê-lo ajuda a compreender melhor como se formaram outros corpos rochosos do cosmo. Um, em especial: a Terra – da qual se originou a Lua, num impacto entre a formação ancestral de nosso planeta e outro corpo celeste.
Em paralelo à retomada dessa corrida, astrofísicos voltam a dar mais atenção aos estudos sobre o único satélite natural de nosso planeta. Uma pesquisa publicada pela NASA em novembro passado, por exemplo, lançou luz sobre um de seus mistérios mais antigos: por que, afinal, há tantas crateras na Lua?
Os astrofísicos já sabiam que a maior parte dessas fendas foi formada há 4 bilhões de anos, numa chuva de asteroides. O que se descobriu agora é o motivo de a face da Lua constantemente voltada para nosso planeta possuir crateras bem maiores – com mais de 320 quilômetros de extensão – do que as da virada na direção oposta.
Pela análise de dados enviados por sondas que orbitaram o satélite, a equipe da NASA concluiu que a face voltada para nós tem uma superfície mais fina, consequência de ter sofrido com intensas erupções vulcânicas. Por isso, asteroides abriram crateras com o dobro da dimensão na superfície frágil.
“Desde tempos imemoriais, a humanidade olha para cima para tentar compreender a Lua”, disse a geofísica Maria Zuber, autora do estudo. Os astrofísicos têm outra aposta – se decifrarmos todos os enigmas lunares, saberemos também como se deu a formação do sistema solar, da Terra e teremos mais indícios para compreender como nasceu o universo. A corrida pela Lua é, portanto, resultado da procura por responder a uma antiga indagação: “Como tudo surgiu?”.
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