Luxos e
contratos suspeitos levam TSE a quebrar sigilo de partido
De mansões a avião e helicóptero: segundo
investigação, dinheiro do fundo partidário foi usado para atender a interesses
pessoais do presidente do Pros
Um
helicóptero e um avião para uso particular, mansões, carros de luxo para
familiares, viagens nababescas ao exterior.
Tudo isso pago com dinheiro do
fundo partidário, a generosa fonte de recursos públicos que abastece as contas
das dezenas de partidos brasileiros.
Uma investigação em
curso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mapeou um caso ilustrativo de como
os milhões de reais do fundo, criado para financiar a atividade política das
siglas, têm sido usados para bancar a doce vida de dirigentes partidários.
No
centro da investigação está Eurípedes Júnior, um inexpressivo ex-vereador
da cidade goiana de Planaltina, vizinha de Brasília.
Escolhido para
comandar o Pros, partido criado em 2013 para reforçar a base da então
presidente Dilma Rousseff no Congresso Nacional, ele passou a usar o dinheiro
do fundo partidário como se fosse seu – e se lambuzou quanto pôde.
Foi
justamente essa festança que deu origem à apuração, aberta a pedido do
Ministério Público.
Por ordem da ministra Luciana Lóssio, o TSE quebrou o
sigilo bancário de todas as contas do diretório nacional do partido e tomou
depoimentos de dirigentes e filiados da sigla.
O que se descobriu até aqui é um
assombroso festival de irregularidades com o dinheiro do contribuinte.
Eurípedes
Júnior comprou um helicóptero e um avião bimotor para uso próprio, investiu em
imóveis e fechou contratos superfaturados de aluguel de carros que, ao fim e ao
cabo, serviam para transportar parentes e amigos dele.
A investigação do TSE
mira os gastos do Pros em 2014 e 2015 (só em 2015, a sigla recebeu 16,8
milhões de reais do fundo partidário).
O
helicóptero foi comprado por 2,4 milhões de reais. Só a empresa que intermediou
o negócio recebeu 266 000 reais do fundo. Segundo a investigação,
Eurípedes tem usado a aeronave para “fins particulares” e para “empréstimos a
seus amigos”.
O presidente do partido pagou ainda 400 000 reais por um
bimotor que, segundo integrantes do próprio partido, também tem servido para
“fins pessoais”.
No
mesmo período, o presidente do Pros usou o fundo partidário para comprar cinco
imóveis. Um deles, uma mansão no exclusivo Lago Sul de Brasília, custou
4,5 milhões de reais.
Uma casa vizinha, também adquirida pelo partido, foi
comprada por 2,2 milhões de reais.
A
lista de aquisições inclui duas casas na cidade de Planaltina, berço político
de Eurípedes Júnior.
Não há, segundo os documentos anexados ao TSE,
nenhuma indicação de que os dois imóveis tenham sido adquiridos para
servir às atividades do partido.
O
processo também mostra que Eurípedes contrata os funcionários do Pros
por meio de empresas terceirizadas de parentes e amigos.
Os valores pagos,
sustentam testemunhas, são superfaturados.
Além disso, alguns dos funcionários
nem sequer aparecem para trabalhar.
O dinheiro do fundo partidário foi usado
ainda para pagar o aluguel de automóveis de luxo para uso pessoal de parentes
de membros da cúpula do partido.
A
investigação mira também diversos contratos com escritórios de advocacia,
alguns suspeitos de servirem apenas de fachada para repasses de recursos, e
inúmeras viagens ao exterior sem nenhuma relação com as atividades
partidárias.
Entre os destinos, estão Paris e Pequim.
Em
depoimentos ao tribunal, dirigentes do Pros denunciaram os abusos do presidente
do partido.
Membro da executiva nacional e secretário jurídico da sigla, o
advogado João Leite diz que Eurípedes Júnior é centralizador e costuma tomar
sozinho as decisões partidárias, que depois são chanceladas por atas assinadas
por aliados.
“O
Eurípedes está acabando com o partido, está usando o dinheiro do fundo
partidário em benefício próprio, como se fosse dele”, diz o tesoureiro do
partido, Niomar Calazans.
Eurípedes
Júnior é personagem recorrente em histórias pouco republicanas.
Na delação
da Odebrecht, por exemplo, ele é citado como um dos destinatários de 7 milhões
de reais distribuídos pela empreiteira a partidos aliados do PT para que
apoiassem a reeleição de Dilma Rousseff, em 2014.
Na
decisão que quebrou o sigilo das contas da legenda, a ministra Luciana Lóssio
sustenta que “há fortes indícios de irregularidade na aplicação dos recursos do
fundo partidário pelo presidente do Pros”.
“Os
recursos do fundo partidário, por serem de natureza pública, devem seguir os
mesmos princípios que norteiam a utilização das verbas públicas em geral, quais
sejam: legalidade, legitimidade, economicidade, moralidade e finalidade”,
emendou a ministra.
Apesar
das graves suspeitas, Luciana Lóssio negou pedido do Ministério Público
Eleitoral para suspender liminarmente os repasses mensais do fundo partidário
ao Pros.
Ela ressalvou, porém, que pode rever a decisão, dependendo das provas
que surgirem a partir da quebra do sigilo.
Ao final do processo, o partido pode
ser punido até com a cassação de seu registro.
Só
neste ano, as 35 siglas registradas na Justiça Eleitoral receberão 817 milhões
de reais do fundo partidário.
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