☼Do curtir ao agir: a solidariedade na internet☼

 A web é ferramenta fundamental para mobilizar um grande número de pessoas rapidamente.

Como o apoio virtual se torna uma ação concreta? Liuca Yonaha Em um pequeno município paulista, na região das divisas com Minas Gerais e Rio de Janeiro, a professora de inglês Teresa Isoldi juntou, em um dia, 200 litros de água mineral, 100 de água sanitária e cerca de 100 cobertores para as vítimas da tragédia provocada por deslizamentos de terra e enchentes na Região Serrana do Rio.

O volume pode parecer pouco comparado às toneladas de doações enviadas por todo o Brasil – somente a Cruz Vermelha mandou mais de 250 mil litros de água e três mil cobertores. Porém, Silveiras tem apenas 5,7 mil habitantes e Teresa conseguiu formar, na internet, uma comunidade de apoio à causa com mais de 800 membros.

O TAMANHO DA CAUSA
No aplicativo Causes, no Facebook, o número de apoiadores da causa é ilustrado com desenhos
como este, que representa o "pelotão" da causa
"Solidariedade aos Brasileiros afetados pelas Enchentes" Além de reunir os donativos com uma convocação via web, Teresa encontrou o transporte da contribuição dos moradores de sua cidade também pela internet.

A professora soube de um grupo  do Recreio dos Bandeirantes, na zona oeste do Rio, que levaria doações em um veículo 4x4 para a serra. Encheu seu carro no sábado (15) após a tragédia com o que havia conseguido até então e levou até o Rio (cerca de três horas de viagem).

Outra ação que começou no Facebook foi o Minha Ajuda Sua Casa, que reuniu mais de 50 caminhões de doações e duas centenas de voluntários.

O desastre fluminense é mais um caso em que a web se torna um importante aliado para a mobilização rápida de um grande número de pessoas. Não apenas iniciativas individuais, como a de Teresa, ma as ONGs e entidades que atuam nessas catástrofes também utilizam cada vez mais a internet para  se organizar e acionar seus voluntários.

A Cruz Vermelha avalia que a tragédia no Rio é um marco na forma como a instituição atua no mundo virtual. Após a forte chuva que deixou mais de 800 mortos, o braço brasileiro da entidade criou um perfil no Facebook e um canal no Youtube. E uma página especial no site foi montada para receber o grande volume de visitas.

"Conseguimos mobilizar uma rede enorme de doadores acompanhado por essa rede virtual da internet.

Isso fez com que a Cruz Vermelha alcançasse seus objetivos: mobilizar seus voluntários e a sociedade para socorrer aquelas pessoas e possiblitar à instituição um canal direto com a sociedade", diz o presidente nacional da instituição, Walmir Moreira Serra Júnior.

A possibilidade de mostrar pela web o que estava acontecendo na Região Serrana, para Moreira Serra, foi muito importante para sensibilizar a população de diferentes regiões do país.

 "Estaríamos nesse campo de intervenção com nossas equipes de qualquer jeito. Com esse processo de comunicação instantâneo, conseguimos mostrar as necessidades do campo. Isso mobilizou um contingente enorme, que nem eu no momento tenho ideia."
Saiba mais
A Cruz Vermelha deve manter a atuação nos canais que acabou de abrir, mesmo depois de passado o momento crítico de assistência na Região Serrana. Certamente, o volume de interação deve cair com o tempo.

Porém, a rede criada em torno da causa estará lá, para ser acionada e ganhar forma quando necessário.

A internet é um lugar para exercer a solidariedade não somente nos momentos de grandes catástrofes.

Ao facilitar o encontro – mesmo que apenas virtual – entre pessoas com interesses e dificuldades em comum, ela facilita a criação de laços. A informação chega com mais facilidade a seu público-alvo.

 É o que tenta fazer Laila Sena com a Veia Social – uma rede que a relações-públicas criou há quase um ano, com o webdesigner Lula Ribeiro.

"Ele, como doador, queria um espaço pra 'desmistificar' e alertar os internautas em relação à doação de sangue. Eu, que fui ex-paciente de câncer e voluntária de uma instituição de pacientes também com câncer, sentia e via a necessidade de um lugar confiável para a família evitar jogar seus dados em alguma corrente de e-mail", diz Laila.

 A Veia Social tem mais de 400 cadastrados e 70% é doador de sangue. Além dos membros da rede em si, também está no Twitter e no Facebook.

Laila conta que em momentos de tragédias, como a do Rio, o tráfego da Veia Social, mesmo sendo atendendo a um nicho, aumenta bastante.

"Recebemos visitas do Chipre e até do Japão! Independentemente de ser uma rede social sobre doação de sangue, criamos uma campanha  de solidariedade e agregamos inúmeros postos de coleta de donativos, para facilitar a vida de  quem pudesse doar, e também ajudamos o HemoRio a divulgar informações, como o agendamento da doação de sangue e os endereços dos inúmeros postos da hemorrede", diz.

Apesar dos resultados positivos da Veia Social, Laila reconhece que a mobilização virtual pode não se concretizar no mundo real. "Na internet, acontece a 'revolução do sofá', onde é fácil ser eco
(por exemplo, "curtir" uma causa no Facebook). Ela ajuda a 'sofrer junto'.

Mas, para realmente ajudar, tem que sair da internet", afirma. Ela dá como exemplo as mobilizações que organiza para hemocentros.

 Muitas pessoas "viram eco", divulgando o evento. Porém, no dia da doação, não são todos os que aparecem.

O jornalista Malcolm Gladwell, colunista da revista The New Yorker, afirmou em um artigo que os laços criados na web são fracos e, por isso, podem até servir para atos como as doações, mas não são fortes o suficiente para que as pessoas corram riscos por uma causa.

Por isso, disse, um ativismo social mais combativo – como os movimentos negros contra a segregação racial nos Estados Unidos nos  anos 1960 – não vai ser baseado nas redes sociais do mundo virtual. 

O texto "
Small Change – Why the revolution will not be tweeted" ("Pequena mudança – Por que a revolução não vai ser tuitada"), publicado por Gladwell no ano passado, foi bastante comentado por quem estuda e  acompanha os movimentos das redes sociais.

Esclarecer o papel e a força da internet em acontecimentos recentes pode definir se os laços criados na web são mesmo incapazes de grandes transformações na sociedade.

No Irã, Mahmoud Ahmadinejad segue no poder mais de um ano e meio depois dos protestos contra sua reeleição; na Tunísia, o presidente Zine El Abidine Ben Ali fugiu, mas é incerto que haverá uma democratização; e, no Egito, veremos uma revolução?

Se os laços não são suficientemente fortes para derrubar um governo, pelo menos ajudam pessoas como Teresa e Laila a serem solidárias e entidades como a Cruz Vermelha a alcançar quem quer ser solidário.

"Tenho certeza de que a internet foi fundamental", diz Teresa. Sem a web, os 200 litros de água mineral de Silveiras talvez não tivessem chegado a Nova Friburgo.

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