"Já se dizia que, com a nomeação de Lula, o governo Dilma Rousseff chegava ao fim.
Talvez a frase deva ser encarada, a partir dos próximos dias, de forma mais literal do que se pensava", diz Otávio Frias Filho, em editorial publicado na Folha, nesta quinta-feira; texto sugere que grampo ilegal feito contra a presidente Dilma Rousseff deve embasar pedido de impeachment
É o fim
A nomeação do ex-presidente Lula (PT) para o cargo de
ministro-chefe da Casa Civil poderia expressar o estado de desespero terminal
em que se encontra um governo com índices baixíssimos de popularidade e com
escassa sustentação para evitar o próprio impeachment no Congresso.
Há mais, entretanto. Logo após sacramentada a inclusão de Lula no
ministério, divulgou-se a gravação de uma conversa entre este e Dilma Rousseff
(PT), na qual se escutam claras indicações de que não se resumiam a raciocínios
políticos os objetivos da nomeação.
Confirma-se aquilo que os mais exacerbados adversários do governo
foram rápidos em considerar como essencial na manobra.
Na iminência de ter decretada sua prisão por Sergio Moro, juiz
federal que trata das decisões em primeira instância da Operação Lava Jato, o
líder máximo petista queria se blindar, posicionando-se num cargo com foro
privilegiado.
Pelo telefone, Dilma assegurava a Lula que seu termo de posse no
ministério estava pronto; seria enviado para "caso de necessidade".
Como entender tal conversa se não como um verdadeiro acerto entre
elementos interessados em fugir ao alcance da lei?
Será a palavra "cumplicidade" forte demais para aplicar
a uma presidente da República e a um ex-presidente que se afobam em arranjar
artifício desesperado para manter a corrupção impune, a Justiça paralisada e o
privilégio intacto?
A dupla superou, com certeza, tudo o que já se tinha visto no PT e
arredores em matéria de cinismo, de imprudência e provocação.
Cinismo, porque poucas horas antes a presidente concedera
entrevista refutando a tese de que Lula estava sendo nomeado apenas para
escapar da polícia. Tratar-se-ia, na verdade, de obter novas energias políticas
no enfrentamento da crise.
Mas não: o argumento elaborado vinha, ao que tudo indica, apenas
disfarçar o que merece ser chamado de esforço de atrapalhar o livre
funcionamento do Judiciário.
Imprudência, portanto: às voltas com iminente pedido de
impeachment, a presidente dá novos e escandalosos fundamentos a uma possível
ação contra seu mandato.
Provocação, acima de tudo. Dias depois de um protesto com
dimensões jamais registradas na história do país, Dilma e Lula se associam para
acender, de forma provavelmente irreversível, uma indignação popular ainda mais
intensa.
Mal anunciada a manobra, iniciou-se uma manifestação espontânea em
frente ao Palácio do Planalto. A afluência popular repetiu-se em São Paulo e só
fez crescer quando se teve notícia das gravações comprometedoras. No Congresso,
a palavra "renúncia" é pronunciada aos brados pela oposição.
Já se dizia que, com a nomeação de Lula, o governo Dilma Rousseff
chegava ao fim. Talvez a frase deva ser encarada, a partir dos próximos dias,
de forma mais literal do que se pensava.
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