“MAIS MÉDICOS”: Estava tudo combinado — um jeitinho para enviar dinheiro a Cuba

 
RAPAPÉS -- Carissa Etienne, diretora da Opas, com o ditador Raúl Castro, em Havana, em julho: elogios à obsoleta medicina cubana (Foto: Granma)
RAPAPÉS — Carissa Etienne, diretora da Opas, com o ditador Raúl Castro, em Havana, em julho: elogios à obsoleta medicina cubana (Foto: Granma)
Reportagem de Leonardo Coutinho, publicada em edição impressa de VEJA 18/10/2013 
ESTAVA TUDO COMBINADO
Documentos oficiais mostram que o Mais Médicos foi concebido para enviar dinheiro à ditadura de Cuba — e que o governo brasileiro escondeu o acordo durante meses
Desde o colapso da União Soviética, no início dos anos 90, Cuba ficou à míngua, sem um padrinho para financiar sua ditadura comunista. Na década passada, esse papel passou a ser desempenhado pela Venezuela de Hugo Chávez e por outros países latino-americanos governados por simpatizantes.
Com o PT no poder, o Brasil tem contribuído sem alarde com empréstimos camaradas do BNDES e, descobre-se agora, com a importação de médicos.
Em maio passado, o então chanceler Antonio Patriota anunciou o plano de trazer 6.000 médicos da ilha para atuar nos rincões do Brasil. O que Patriota não disse é que o “plano” era, na verdade, um fato consumado. O acordo para a importação de médicos cubanos já havia sido assinado no mês anterior, valendo-se de um subterfúgio para não tornar pública a verdadeira natureza do negócio.
O contrato falava, em termos genéricos, de uma “contratação de profissionais temporários” e em nenhum trecho citava Cuba ou médicos cubanos. Isso era possível porque, formalmente, o acordo foi fechado entre o Ministério da Saúde e a Organização Panamericana de Saúde (Opas).
Na prática, a entidade vinculada à ONU era apenas a intermediária da transferência de recursos dos contribuintes brasileiros para a ditadura cubana (o que também não era dito no acordo original).
Tanto esforço para omitir Cuba do acordo intermediado pela Opas se explica pela reação negativa da opinião pública brasileira, especialmente das associações médicas, ao anúncio feito por Patriota. Afinal, a importação de médicos cubanos viola uma série de leis brasileiras, além de pôr em risco a saúde da população por causa da qualificação duvidosa dos profissionais.
Criticado pelo “plano”, o governo federal deu sinais de que recuaria. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, chegou a dizer que a prioridade não era trazer médicos cubanos, mas portugueses e espanhóis. Puro diversionismo, pois nos bastidores os trâmites burocráticos para a contratação dos cubanos seguiam em ritmo acelerado.


Em meio aos protestos de junho, a presidente Dilma Rousseff ressuscitou o tema, prometendo na TV “trazer de imediato milhares de médicos do exterior para ampliar o atendimento do SUS”. Daí nasceu o programa Mais Médicos, sob medida para esquentar o acordo já firmado para importar profissionais cubanos.
A abertura de inscrições para médicos de outros países e de brasileiros que trabalham no exterior foi só uma maneira de legitimar a vinda dos cubanos, pois já se sabia que estes viriam em maior número. O documento assinado por Padilha em 22 de agosto foi apenas um termo de ajuste do acordo assinado em abril na surdina.
ENTROSADO -- O cubano Joaquín Molina, chefe da Opas no Brasil (Foto: ABr)
ENTROSADO — O cubano Joaquín Molina, chefe da Opas no Brasil (Foto: ABr)

Eis por que três dias depois os primeiros 400 médicos cubanos já desembarcavam no Brasil. Uma semana antes, o governo brasileiro havia pago 11,5 milhões de reais à Opas, valor que coincide com o custo das passagens.
Um dos arquitetos da triangulação Brasil-Opas-Cuba foi o dentista Joaquín Molina, ex-coordenador da Cooperação Técnica Internacional, o departamento do Ministério da Saúde de Cuba responsável pela exportação de mão de obra médica. Em 29 de março de 2012, Molina assumiu o posto de representante da Opas no Brasil – um dia antes de a entidade firmar com Cuba um convênio, que ele ajudou a negociar, para intermediar a venda de serviços de saúde da ilha.
A missão de Molina em Brasília era bem definida e servia com perfeição aos planos de Padilha. Em 17 de dezembro, Molina protocolou no Ministério da Saúde o projeto Fortalecimento da Atenção Básica no Brasil, em que a Opas pedia quase 512 milhões reais para ajudar o país a combater “as iniquidades sociais e limites de acesso aos serviços de saúde”.
Antes do Natal, o documento venceu cinco degraus da burocracia, mais rápido do que qualquer outra proposta feita ao ministério na mesma data. Em fevereiro, a diretora da Opas, a dominiquense Carissa Etienne, veio a Brasília para dar mais um empurrãozinho na “cooperação médica” com Cuba, pela qual a Opas viria a receber 24,3 milhões de reais de comissão.
Em meio às mentiras e dissimulações envolvendo a contratação de médicos cubanos, há um dado intrigante: o valor de mais de 500 milhões de reais (dos quais 100 milhões foram pagos no mês passado e os outros 400 milhões já foram reservados no Orçamento federal) pleiteado pela Opas em dezembro de 2012 é rigorosamente o mesmo do contrato-encenação feito por Padilha oito meses depois para a importação de 4 000 médicos.
Patriota, porém, havia anunciado em abril a vinda de 6.000 cubanos. Ou seja, o Brasil está pagando a mesma quantia por menos profissionais. Considerando a má qualidade do ensino médico em Cuba, talvez seja melhor não reclamar.

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