Pesquisadores australianos descobriram, na era do Photoshop e dos tratamentos estéticos transformadores, que as mulheres lidam com mais um padrão de beleza que em nada corresponde à realidade. Em um estudo, entrevistadas que foram inicialmente expostas a imagens de órgãos genitais femininos modificados cirurgicamente eram mais propensas a considerá-los “normais” e “ideais”, quando comparadas com genitálias inalteradas.
A labioplastia, ou ninfoplastia, é uma cirurgia estética para reduzir o tamanho dos pequenos lábios de uma mulher e torná-los mais “simétricos”, para que não se projetem para além dos grandes lábios. A técnica tem se tornado cada vez mais popular e até a eterna subcelebridade Geisy Arruda já assumiu ter passado pelo processo. Na ocasião, a cirurgia íntima ganhou manchetes dos mais diversos veículos noticiosos por causa de uma declaração polêmica de Geisy, afirmando que sua vagina, antes do procedimento, parecia “uma couve-flor”.
Apesar da frase ter virado piada, o assunto é sério. Segundo a ginecologista Paula Marcovici, entrevistada pelo portal Terra à ocasião, a procura pela modificação no Brasil é grande, especialmente entre meninas de 16 e 17 anos, que estão iniciando a vida sexual. Porém, a recomendação é que a cirurgia só aconteça com indicação médica e depois dos 18 anos, quando o órgão já está totalmente desenvolvido.
Ainda sem estatísticas sobre o tema no Brasil, o número de labioplastia realizadas pelo Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido aumentou cinco vezes desde 2001, de acordo com os autores do novo estudo. “Acho que o aumento da cirurgia estética genital para as mulheres é uma tendência muito preocupante”, opina Claire Moran, principal autora da pesquisa e doutoranda na Faculdade de Psicologia da Universidade de Queensland (Austrália). “Parece haver equívocos enormes ao redor de percepções da aparência genital normal e eu queria explorar isso ainda mais”, explica.
Geralmente, não há razões de saúde para submeter-se à cirurgia; é apenas uma questão de aparência. Assim, os pesquisadores queriam saber o que impulsiona a percepção das mulheres sobre o que fica bom lá em baixo.
“Há equívocos em torno da aparência genital normal. Isto é devido à edição de imagens, à falta de exposição a órgãos genitais normais das mulheres, maior visibilidade genital devido à depilação total e ao tabu geral sobre discutir os órgãos genitais e a aparência genital”, enumera Moran.
Os resultados do novo estudo foram publicados na revista “BJOG: An International Journal of Obstetrics & Gynaecology”. Noventa e sete mulheres australianas com idades entre 18 a 30 anos foram divididas em três grupos. Na fase inicial do estudo, um grupo de mulheres viu quase três dezenas de imagens de órgãos genitais femininos modificados. Ao outro grupo foram mostradas imagens de genitálias não modificadas. Um terceiro grupo não viu nenhuma delas.
Em seguida, os três grupos viram uma mistura de imagens de órgãos genitais modificados e não modificados que deveriam avaliar em o quão a vulva “parece normal” e “representa o ideal da sociedade”. Todos os grupos avaliaram as imagens das vulvas modificadas como mais próximas do ideal da sociedade do que as vulvas não alteradas (embora o grupo que tenha visto vulvas não modificadas as tenham considerado “normais” nesta segunda etapa).
Os pesquisadores sugerem que as mulheres jovens podem não perceber genitálias normais variam consideravelmente na aparência. “A realidade é que quando se trata de órgãos genitais femininos, como acontece com outras partes do corpo, a diversidade é o que é normal. Os resultados demonstram que a exposição a um tipo de imagem impacta a percepção das mulheres sobre o ‘normal’”, disse Moran.
“[A pesquisa] é importante para entender se as mulheres estão procurando cirurgias eletivas genitais porque elas querem que suas vulvas pareçam ‘normais’ ou porque quer que elas sejam consistentes com um ‘ideal’”, acrescenta Vanessa Schick, coautora do livro “Read My Lips: A Complete Guide to the Vulva and Vagina” (em tradução literal, “Leia Meus Lábios: Um Guia Completo para a Vulva e Vagina”. “Se elas querem mudar a cor dos lábios, forma ou tamanho porque acham que são anormais, as preocupações com a variação pode ser abordadas mostrando às mulheres uma variedade de imagens de genitais”, sugere.
A escritora ainda ressalta que há vários livros, sites, cartazes e projetos que se dedicam a desmitificar a questão e fazer com que as mulheres sintam-se confortáveis com a sua aparência genital. “Se as mulheres estão optando por uma cirurgia a fim de corresponder a um ideal genital, pode ser mais difícil de combater as preocupações dessas mulheres”, conta Schick.
A psicóloga clínica Sarah Calabrese, da Universidade de Yale (EUA), ressalta que os resultados deste estudo dão provas concretas de que as imagens da vulva às quais as mulheres estão expostas podem afetar sua percepção do que é o “normal”. “Isto é especialmente desconcertante uma vez que, para muitas mulheres, a faixa estreita e surrealista de vulvas apresentadas no mainstream da pornografia norte-americana podem ser as únicas imagens que elas vêem”, lamenta Calabrese.
Nenhum comentário:
Postar um comentário