Executivo admitiu que o esquema irrigou os cofres de partidos políticos e agentes públicos
POR RENATO
ONOFRE, ENVIADO ESPECIAL
02/04/2015
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CURITIBA - O presidente da
Camargo Corrêa, Dalton Avancini, confessou à Justiça que a empresa pagou
propina para executar obras na Ferrovia Norte-Sul, nos mesmos moldes das
operações que foram feitas com os contratos da Petrobras, inclusive com
formação de cartel entre as empresas. O executivo admitiu que o esquema irrigou
os cofres de partidos políticos e agentes públicos.
As declarações foram feitas
em depoimento de delação premiada aos investigadores da Operação Lava-Jato. Na
Norte-Sul, a empreiteira participou de contratos no valor de R$ 1 bilhão,
assinados em 2010 com a Valec, estatal ligada ao Ministério dos Transportes que
administra as ferrovias brasileiras. As informações foram obtidas pelo GLOBO.
Com essas revelações, as investigações podem chegar a novos executivos das
empreiteiras.
Em prisão domiciliar desde
segunda-feira, Avancini detalhou a existência, na Norte-Sul, de um esquema
similar ao “Clube das Empreiteiras”, que determinava quais empresas venceriam
as licitações na Petrobras. Os investigadores querem saber se as regras do
cartel eram idênticas ao esquema coordenado pelo presidente da UTC, Ricardo
Pessoa, na estatal de petróleo. Além da Camargo, entre as empresas envolvidas
estariam outras investigadas na Lava-Jato como Constran, ligada à UTC, Andrade
Gutierrez e Queiroz Galvão.
O executivo da empreiteira
afirmou ainda que a distribuição de propinas seguia regras similares ao esquema
montado na Petrobras. Durante as investigações da Lava-Jato, a Polícia Federal
e o Ministério Público Federal revelaram que 1% dos contratos da estatal com as
empresas do cartel abasteciam partidos políticos e agentes públicos. Em caso de
aditivos, os valores poderiam chegar a 5%.
O executivo será chamado a
depor novamente para esclarecer como eram feitos os pagamentos e o valor das
propinas. O testemunho específico sobre a Norte-Sul deverá ser marcado para
antes do interrogatório sobre a Petrobras, agendado para maio.
As revelações de Avancini
ampliaram as investigações da Lava-Jato para contratos além dos da Petrobras.
Em março, O GLOBO revelou que o presidente da Camargo Corrêa confirmara o
pagamento de R$ 100 milhões em propina para obter contratos de obras na usina
de Belo Monte. Ainda segundo Avancini, o valor foi dividido entre PT e PMDB:
cada um dos partidos receberia 1% do valor dos contratos.
Em outubro de 2010, a Valec
anunciou os nomes dos consórcios de empreiteiras que venceram licitação para
executar a construção de um trecho de 669 quilômetros da Ferrovia Norte-Sul,
entre Ouro Verde (GO) e Estrela d'Oeste (SP) — um negócio de R$ 2,3 bilhões
divididos em cinco lotes. A Camargo Corrêa se uniu à Queiroz Galvão através do
Consórcio Ferrosul e venceu os lotes 2 e 3 que, somados, custaram R$ 1 bilhão.
Mesmo vencedora, a Camargo teria aberto mão do contrato e, após a vitória, a
obra do lote 2 foi assumida pelo segundo colocado na concorrência: o consórcio
Pavotec/Ourivio/Tejofran/Fuad Rassi/Sobrado. Os investigadores vão apurar como
se deu o pagamento de propina nesses dois contratos, inclusive com a saída da
Camargo.
Além da Ferrosul, outros três
grupos conquistaram os contratos para a construção do trecho Ouro Verde-Estrela
d'Oeste. O primeiro lote foi vencido pelo grupo formado por Aterpa e Ebate, ao
custo de R$ 387,7 milhões. O lote 4 ficou a cargo do consórcio Constran, Egesa
e Carioca, por R$ 520 milhões. O quinto ficou com a Tiisa Triunfo Iesa
Infraestrutura, por R$ 434,3 milhões.
Ano passado, um relatório do
Tribunal de Contas da União (TCU) identificou superfaturamento e sobrepreço em
obras referente ao trecho entre Porto Seco de Anápolis (GO) e Pátio de Uruaçu
(GO). As irregularidades somadas chegam a R$ 176 milhões. Entre as obras
executadas pela Camargo Corrêa, o montante superfaturado foi de R$ 45 milhões,
segundo as contas do TCU.
EMPRESAS
NEGAM CORRUPÇÃO
As construtoras citadas por
Avancini em sua delação premiada repudiaram as acusações de formação de cartel
nas obras da Ferrovia Norte-Sul e negaram o pagamento de propina a políticos. A
Camargo Corrêa divulgou nota dizendo que “não tem acesso ao referido acordo de
colaboração, desconhece seus termos e também o teor dos depoimentos. A empresa
reitera que permanece à disposição das autoridades”.
Já a Andrade Gutierrez disse
em nota que “repudia falsas acusações que vêm sendo feitas e reitera, como tem
feito desde o início da Operação Lava-Jato, que não tem ou teve qualquer
envolvimento com os fatos investigados”. “É importante ressaltar que não há
qualquer tipo de prova sobre a participação da AG em pagamentos indevidos de
recursos a políticos e ou a quaisquer outras pessoas. Todas as acusações
equivocadas vêm sendo feitas em cima de ilações e especulações, sem qualquer
fato ou prova concreta”, completa o texto da empreiteira.
A Queiroz Galvão também negou
“veementemente qualquer pagamento ilícito a agentes públicos para obtenção de
contratos ou vantagens”. “A companhia reitera que todas as suas atividades
seguem rigorosamente à legislação vigente”, diz a empresa, em nota, ao GLOBO. A
Constran/UTC disse que “não comenta investigações em andamento”.
A Valec disse que não foi
notificada sobre o conteúdo da delação do executivo e que desconhece os fatos
citados. Também destacou que a atual diretoria está à frente do órgão há dois
anos.(Colaboraram
Germano Oliveira e Sérgio Roxo)
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