Ex-diretor da Petrobras diz que irregularidades
acontecem no país inteiro
Paulo Roberto Costa
e Nestor Cerveró foram ouvidos na CPI mista da Petrobras para esclarecer
divergências em depoimentos
POR ANDRÉ DE
SOUZA, EVANDRO ÉBOLI E WASHINGTON LUIZ
02/12/2014
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Paulo Roberto Costa,
ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, na acareação com Nestor Cerveró -
Ailton de Freitas / O Globo
BRASÍLIA - O ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto
Costa afirmou nesta terça-feira em sessão da CPI mista que confirma tudo o que
disse no processo de delação premiada que firmou com a Justiça.
Acusado de
irregularidades na estatal, ele está colaborando com as investigações, com o
objetivo de ter uma redução da pena.
Ele disse estar arrependido e que decidiu
participar da delação premiada por orientação da família. Isso teria lhe
trazido “sossego à alma”. Paulo Roberto disse que todas as indicações para
cargos de diretoria da empresa são políticas e que está arrependido de ter
assumido o posto.
Afirmou ainda que as irregularidades na Petrobras acontecem
no Brasil inteiro, das rodovias às hidrelétricas.
A CPI fez uma acareação entre Paulo Roberto Costa e o ex-diretor da Área
Internacional da Petrobras Nestor Cerveró para esclarecer as divergências em
depoimentos anteriores feitos pelos executivos.
Costa já disse à Polícia
Federal (PF) que houve pagamento de propina para que a empresa adquirisse a
refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. Cerveró nega irregularidades.
Em sua primeira fala, Paulo Roberto Costa disse que, assim como na
primeira vez que foi à CPI mista, em 17 de setembro, permaneceria calado,
justamente para não atrapalhar o processo de delação premiada.
Segundo ele,
todas as dúvidas já haviam sido esclarecidas ao Ministério Público, Polícia
Federal e Justiça Federal.
Mas ressaltou que faria alguns esclarecimentos.
Neles, lembrou que assumiu o posto de diretor de Abastecimento 27 anos depois
de ter entrado na empresa por concurso público. Nesse período, disse, ocupou
postos importante por sua competência técnica, mas destacou que isso não seria
suficiente para se tornar diretor.
— Nesses 27 anos, assumi cargos importantes. Em todos esses cargos que
assumi, não precisei nunca de apoio político. Consegui esses cargos por
competência técnica.
Quando surgiu a oportunidade de obter uma diretoria, era
sonho meu ser diretor e, quem sabe, a presidência. Mas desde os governo Collor,
Itamar, Fernando Henrique, Lula, Dilma, todos os diretores, se não tivessem
apoio político, não chegavam a diretor. Infelizmente, aceitei uma indicação
política para assumir a diretoria de Abastecimento. Estou extramente
arrependido de fazer isso.
Se pudesse, não teria feito isso. Quisera eu poder
não ter feito isso. Isso tudo, para tornar minha alma mais pura, confortável,
para mim e para minha família, fiz o acordo de delação. Passei seis meses na
carceragem.
O que acontece na Petrobras acontece no Brasil inteiro, nas
rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e hidrelétricas — disse Paulo Roberto.
SEM DETALHES
Ele confirmou tudo o que disse no processo de delação premiada, mas não
quis dar detalhes. Segundo eles, fatos e pessoas envolvidas nas irregularidades
serão conhecidos no momento oportuno.
— Tudo que falei lá, eu confirmo. Não tem nada lá que não confirmo. É um
instrumento sério, que não pode ser usado de artificio, de mentira, que não
pode ser na frente confirmado.
Nos mais de 80 depoimento que eu fiz, foram mais
de duas semanas de delação, o que está lá eu confirmo. Provas existiram e estão
sendo colocadas. Falei de fatos, de pessoas. Na época oportuna, virão a
conhecimento público — disse Paulo Roberto.
O ex-diretor da
Petrobras Nestor Cerveró - Ailton de Freitas / Agência O Globo
Ele afirmou ainda que a família está sofrendo e que foi, por orientação
dos familiares, que está colaborando com as investigações:
— Quando resolvi falar a delação premiada, não foi orientação do
advogado, de ninguém. Foi da minha família. Quem colocou com clareza foi minha
esposa, minhas filhas, meus genros e netos. Falavam: por que só você? E os
outros? Você vai pagar sozinho. Fiz a delação para dar um sossego à minha alma
e conforto à minha família.
‘ALGUMAS DEZENAS’ DE POLÍTICOS ENVOLVIDOS
No fim da sessão da CPMI, o deputado Enio Bacci (PDT-RS) solicitou a
Costa uma estimativa sobre o número de políticos envolvidos no esquema de
corrupção na estatal. Bacci pediu, em tom descontraído, que o ex-diretor da
Petrobras o “premiasse com esta delação”.
Paulo Roberto Costa, que não pode citar políticos nominalmente, disse
que o parlamentar estava deixando-o numa situação “meio constrangedora”. Mas
respondeu:
— Algumas dezenas — encerrou, ouvindo risos entre os parlamentares
presentes.
CERVERÓ NEGA RECEBIMENTO DE PROPINA
Cerveró, por sua vez, disse que não conhece o conteúdo da delação
premiada de Paulo Roberto. Perguntado pelo deputado Enio Bacci (PDT-RS), autor
do requerimento que levou à acareação, Cerveró negou ter recebido propina.
— Ratifico o que disse antes, que não recebi — disse Cerveró.
— Então se o Paulo Roberto disse que o senhor recebeu, ele (Paulo
Roberto) está mentindo? — pergunta Bacci.
— O senhor (Bacci) está fazendo uma ilação. Não conheço o depoimento do
Paulo Roberto. Aí é o caminho do "se" — disse Cerveró.
Cerveró confirmou que sua defesa está sendo paga pela Petrobras, mas de
forma indireta, por um seguro que cobre ações dos gestores da empresa.
— A minha defesa está sendo paga pelo seguro, é uma forma indireta.
Modelo americano que cobre atos de gestão de diretores e conselheiros. Cobre
toda atividade de defesa de gestão desses diretores.
Em seguida, Paulo Roberto Costa negou que tenha se valido do mesmo
mecanismo.
— A defesa de Paulo Roberto Costa, a Petrobras não pagou um centavo. A
defesa de Paulo Roberto Costa quem paga, com muito sacrifício, é Paulo Roberto costa
— disse Costa
Cerveró afirmou que não conhecia esquema ilícito na Petrobras como um
todo. Perguntado que citasse nomes envolvidos no escândalo, Paulo Roberto disse
que não declinou nomes no depoimento para Sérgio Moro mas que confirmava tudo
que disse ao juiz.
O deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) disse que o Brasil "vai ter
limpa sem igual".
— Onde está o problema em afirmar o óbvio, que Aécio Neves perdeu a
eleição para uma quadrilha? — disse Carlos Sampaio, acrescentando: — Quadrilha,
havia.
Desvio, houve. Propina, inegável. Corrupção não tem coloração
partidária. O senhor Paulo Roberto errou, merece críticas. Mas sua mudança de
postura trouxe um ganho ao país. O Brasil vai ter uma limpa sem igual.
Sessão na CPI com
Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró - Ailton de Freitas / Agência O
Globo
O deputado perguntou a Cerveró se não tinha corrupção na Petrobras ou
ele desconhecia.
- Desconhecia, logo, não tinha - respondeu Cerveró.
E-MAIL PARA DILMA
Paulo Roberto Costa também foi perguntado sobre e-mail enviado à então
ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, no dia 29 de setembro de 2009, sobre
irregularidades apontadas pelo TCU em obras da Petrobras.
Em reportagem, a
revista "Veja" indica que Paulo Roberto teria apontado uma solução
política para que as obras não fossem paralisadas. O então diretor relatou
ainda os problemas apontados pelo tribunal.
— Até acho que foi importante (levantar a questão) porque a imprensa
deturpou um pouco o processo deste e-mail — disse Paulo Roberto — Primeiro por
que eu não passei por níveis hierárquicos. O Gabrielli, então presidente da
Petrobras, tinha ciência (do e-mail). Foi me pedido pela Casa Civil que eu
mandasse a ela (Dilma) o e-mail.
— Nesta época eu já estava enojado deste processo todo — afirmou Paulo
Roberto, sustentando que não havia alertado para uma solução política para o
caso.
SEGUNDA VEZ NA CPI
Os dois diretores já foram convocados a depor na CPI Mista. Na primeira
vez em que esteve presente na comissão, em 17 de setembro, Costa se recusou a
responder as perguntas. Na época, o acordo de delação premiada de Costa ainda
não havia sido homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Assim, ele
preferiu ficar calado para não se comprometer. Pelo acordo, Costa decidiu
colaborar com as investigação, tendo em vista uma redução da pena.
Cerveró, por outro lado, declarou, em 10 de setembro, não ter havido desvio
de dinheiro na compra da refinaria de Pasadena. Ele também garantiu desconhecer
qualquer participação direta do também ex-diretor Paulo Roberto Costa nos
acertos empresariais para a compra da refinaria nos Estados Unidos.
Costa está em prisão domiciliar no Rio de Janeiro depois de ter firmado
o acordo de delação premiada. A presença dele na CPI foi autorizada pelo juiz
federal Sérgio Moro, responsável pelo processo da operação Lava-Jato. Moro
determinou que Costa fosse escoltado pela Polícia Federal até o Senado, devendo
ser “evitada a utilização de algemas”.
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