O fato determinante foram as manifestações de 13 de março, especialmente a de São Paulo, a maior da história do Brasil
Publicado no Globo
Não há qualquer dúvida de que Michel Temer é o novo presidente da República.
O Senado vai receber o processo e aprovar o impeachment de Dilma Rousseff.
A interinidade deve ser breve — inferior aos 180 dias constitucionais.
O projeto criminoso de poder e seus asseclas foram derrotados.
A história — e não é a primeira vez — traçou um caminho surpreendente.
Apesar do desastre do primeiro governo, Dilma conseguiu ser reeleita na eleição mais suja da República.
Imaginava-se que faria um governo cinzento.
E que Lula deveria ter um papel mais ativo, preparando o caminho para retornar à presidência em 2018, ser reeleito em 2022 e eleger um poste em 2026.
A pouca combatividade da oposição, a inércia das entidades empresariais, as benesses obtidas pelo grande capital e o estabelecimento de relações nada republicanas com o Congresso Nacional e as Cortes superiores de Brasília davam ao petismo um protagonismo e uma força desproporcional à realidade.
Quando o pedido de impeachment deu entrada na Câmara — em outubro de 2015 —, poucos acreditavam que seria apreciado. Outros já tinham sido rejeitados.
Pouco depois, o STF decidiu, equivocadamente, que caberia monocraticamente ao presidente da Câmara a decisão de receber o pedido. Falou-se que seria rejeitado por Eduardo Cunha.
Porém, a 2 de dezembro, acabou sendo recebido. Seis dias depois, foi eleita a Comissão Especial por 272 votos a 199, com uma composição independente do Palácio do Planalto.
Mais uma vez, o STF interferiu inconstitucionalmente, obrigando a Câmara a anular a votação e criar uma comissão "eleita" pelos líderes.
Considerou-se uma vitória, pois os partidos da base governamental eram maioria.
O recesso parlamentar deu ao governo uma aparente sobrevida.
Ficou na aparência.
O agravamento da crise econômica — o ano fechou com a queda do PIB em -3,8% —, as investigações da Lava Jato e a participação da sociedade civil com as manifestações de rua — quatro em 2015 — e a fantástica mobilização das redes sociais foram paulatinamente deslocando a balança para os adversários do petismo, mesmo quando os partidos oposicionistas ainda patinavam no enfrentamento do projeto criminoso de poder.
O ano legislativo de 2016 começou sem que estivesse claro qual o rito que deveria ser seguido na Câmara, pois o STF tinha tomado uma decisão pouco clara e, pior, invadindo a esfera do Legislativo.
Após os esclarecimentos, o caminho ficou aberto. Mas o fato determinante do processo foram as grandes manifestações de 13 de março, especialmente a de São Paulo, a maior da história do Brasil.
Nesse momento, as ruas, pela primeira vez, empurraram o Parlamento, deixando de ser coadjuvantes para serem protagonistas.
O PMDB foi se afastando do governo — a 12 de março declarou-se independente. A resposta do Planalto foi um suicídio político: a nomeação de Lula para chefia da Casa Civil.
Uma demonstração de fraqueza travestida de uma grande jogada política. Um golpe de Estado, dando a presidência, de fato, a um procurado da Justiça.
A suspensão da nomeação e a divulgação dos áudios foram fatais. Desnudaram as razões da nomeação e as conversas de ministros e dirigentes petistas.
Apresentaram um governo de cafajestes e celerados. Ficaram ainda mais isolados. E novamente as ruas deram resposta enérgica à manobra golpista.
A 17 de março foi constituída a Comissão Processante.
Para evitar questionamentos jurídicos, foi seguido estritamente o rito determinado pelo STF.
Diferentemente de 1992, desta vez houve amplo direito de defesa.
A solidão do Planalto ficou maior quando o PMDB rompeu com o governo.
De nada adiantou a presença constante de Lula em Brasília e a transformação de um quarto de hotel em gabinete presidencial — triste momento que aproximou o Brasil de uma república bananeira.
A Comissão Processante teve seus trabalhos conduzidos com muita propriedade e equilíbrio pelo presidente Rogério Rosso, e o parecer do relator Jovair Arantes não deixou pedra sobre pedra — e a 11 de abril foi aprovado por ampla maioria.
As respostas do governo na comissão, na Câmara e na sociedade foram desastrosas.
Chamar de golpe o que está previsto na Constituição foi um desastre.
A defesa feita pela AGU foi patética.
Os atos no Planalto com os "movimentos sociais" afastaram ainda mais o governo de parlamentares que estavam indecisos.
E, para piorar, Dilma pediu a intervenção de organismos internacionais, caso de crime de lesa-pátria.
A votação de 17 de abril foi histórica.
De nada adiantaram as transações criminosas de Lula tentando comprar parlamentares. O quorum constitucional foi suplantado.
E a admissibilidade do processo, aprovada. O PT — que funciona mais como uma organização criminosa do que como partido político, basta recordar as inúmeras condenações judiciais — tentou — e ainda tenta — desqualificar a decisão.
Criticou o "nível" dos deputados — como se a média dos parlamentares, desde 1826, quando o Parlamento foi aberto, fosse muito distinta; além do que teve sustentação congressual durante 13 anos —, ameaçou o país com guerra civil, incentivou a desmoralização das instituições e colocou em risco a paz pública.
Temer não deve esquecer que chegou à presidência graças à mobilização das ruas.
Vai ter de organizar um ministério competente, enfrentar os graves problemas econômicos, melhorar a qualidade do gasto público, não compactuar com a corrupção, despetizar o Estado e levar o país às eleições de 2018.
Não será fácil. Mas muito mais difícil foi o povo derrotar a quadrilha petista e seu chefe, Lula.
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