Julio Camargo, da empresa Toyo Setal, que detinha contratos com a Petrobras, disse que Fernando Baiano cobrou US$ 40 milhões em contrato de sondas.
Laryssa Borges e Marcela Mattos, de Brasília
Executivos presos na sétima fase da Operação Lava Jato são liberados pela Polícia Federal, na noite desta terça-feira (18/11), na sede da Polícia Federal em Curitiba - Junior Pinheiro/Folhapress
O executivo Julio Gerin de Almeida Camargo, da empresa Toyo Setal, disse em depoimento à Justiça Federal que o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano e apontado como o operador do PMDB no escândalo do petrolão, exigiu, em 2005, propina de 40 milhões de dólares para conseguir que a empresa sul-coreana Samsung celebrasse com a Petrobras contratos para a fabricação de duas sondas de perfuração em águas profundas. O pagamento completo da propina precisou de intermediação do doleiro Alberto Youssef, que providenciou contratos simulados com empresas de fachada para viabilizar parte dos recursos. O pagamento de propina incluía ainda o ex-diretor da Petrobras Renato Duque e o ex-gerente Pedro Barusco.
Julio Camargo firmou um acordo de delação premiada com a Justiça para revelar detalhes do esquema de corrupção e fraude em licitações na Petrobras em troca da perspectiva de benefícios como a redução de pena. Na transação que relatou ao juiz Sergio Moro, a Piemonte Investimentos, ligada a Camargo, atuou em favor da Samsung na obtenção de contratos para as sondas a mediação de Fernando Baiano por conta do “sabido bom relacionamento” dele com a Área Internacional da Petrobras, comandada na época pelo diretor Nestor Cerveró.
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Depois de iniciada a negociação comercial, Baiano informou que “precisaria estabelecer os valores” e pediu 15 milhões de dólares iniciais para que pudesse “concluir a negociação em bom êxito”. Na versão do empresário, o pagamento da propina era “o único jeito de fechar o negócio”. Na triangulação para o recebimento da primeira parte do dinheiro sujo, os termos do contrato que a empresa de Camargo tinha com a Samsung foram repassados a uma empresa offshore de Fernando Baiano, que passaria a embolsar os recursos na medida em que a sul-coreana pagasse comissionamentos do executivo.
Em seu depoimento, Julio Camargo disse que, em uma primeira fase, pagou “12,5 milhões de dólares ou 15 milhões de dólares” a partir de uma conta no banco Winterbothan, no Uruguai, para “inúmeras contas” indicadas por Baiano. De acordo com ele, “pode ser” que o ex-diretor de Área Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, atuasse diretamente no esquema, utilizando uma das contas indicadas por Fernando Baiano. Em acareação na CPI mista da Petrobras nesta terça-feira, Cerveró disse diante do ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa desconhecer esquema de propina envolvendo a estatal do petróleo.
Dois meses depois de fechado o negócio para a primeira sonda da Samsung, Fernando Baiano procurou novamente o empresário e disse que, mediante o pagamento de uma comissão de 25 milhões de dólares, poderia conseguir contrato para uma segunda sonda. Ao todo, portanto, Baiano exigia 40 milhões de dólares em propina para conseguir os contratos da Samsung para fornecer duas sondas à Petrobras.
Sem conseguir pagar toda a propina exigida pelo operador do PMDB no petrolão, Julio Camargo recorreu a Alberto Youssef, que viabilizou os recursos por meio de contratos simulados de investimentos entre as empresas Auguri, Treviso e Piemonte com a empresa de fachada GFD Investimentos, controlada pelo doleiro.
Camargo Correa – Nos depoimentos no âmbito da delação premiada, o executivo Julio Camargo afirmou que atuava na Petrobras também a mando da empreiteira Camargo Correa. Com orientações do vice-presidente da construtora, Eduardo Leite, cabia a Julio Camargo efetivar os pagamentos das propinas exigidas, incluindo benefícios ao ex-diretor de Serviços da estatal Renato Duque e ao ex-gerente da área Pedro Barusco. De acordo com o depoente, apesar da carta branca para a distribuição de dinheiro sujo, a própria empreiteira negociaria diretamente com o ex-diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa.
“Se não houvesse propina na área de Abastecimento e na área de Engenharia, não se chegaria ao sucesso das negociações”, resumiu Julio Camargo. Em 2008, por exemplo, foram repassados pelo menos 6 milhões de reais em propina para a Diretoria de Engenharia e Serviços. No exterior, realizou depósitos de suas contas no Credit Suisse para contas indicadas por Renato Duque e Pedro Barusco.
“Essa sistemática se aplicou a todos os contratos da Camargo Correa com a Petrobras nos quais o declarante atuou como consultor, isto é, o declarante cuidava dos pagamentos de propina na Área de Engenharia e Serviços e a própria Camargo Corrêa dos pagamentos de propina na Área de Abastecimento”, disse.
Propina – Em depoimento, Julio Camargo disse que negociava diretamente com os ex-diretores da Petrobras o pagamento de dinheiro sujo, também confirmou o pagamento de propina a Renato Duque e Paulo Roberto Costa. Ele informou ainda que cabia ao doleiro Alberto Youssef atuar como intermediário de Costa, enquanto Pedro Barusco, braço direito de Duque atuava, em alguns casos, como auxiliar no recebimento do dinheiro. Duque, Barusco e Youssef indicavam contas bancárias específicas para o depósito dos valores. Para Camargo, o pagamento de propina era “a regra do jogo” em contratos com a Petrobras.
De acordo com o depoente, normalmente 1% dos valores dos contratos eram repassados em propina à diretoria da Petrobras comandada por Costa e outro 1% para a área de controle de Renato Duque, “embora esses percentuais pudessem ser negociados e muitas vezes o foram para menos”. Para a construção da unidade de coque da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), Camargo disse que “houve solicitação de pagamento de vantagem indevida por Renato Duque e Pedro Barusco no valor aproximado de 12 milhões de reais”, pagos em contas bancárias no exterior – no caso de Costa, em Hong Kong e na China; no caso de Duque, na Suíça. Tanto Duque quanto Barusco, embora participassem das negociações, mandavam três emissários, conhecidos como “Tigrão”, “Melancia” e “Eucalipto” para transportar a propina quanto paga em dinheiro vivo.
No acerto dos valores a serem pagos em propina, os encontros entre corruptos e corruptores ocorriam na sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, ou em restaurantes de luxo. Tanto Duque quanto Barusco tinham tabelas para controlar a entrada de propina e o cronograma dos valores que seriam depositados futuramente.
Ao contrário do executivo Augusto Mendonça Neto, também da Toyo Setal, Julio Camargo disse que o repasse a partidos políticos, essencialmente ao PT, não eram resultado de propina, e sim “doações espontâneas, dentro dos limites previstos em lei”. Entre os políticos que receberam os recursos, o depoente cita o senador Delcídio Amaral (PT-MS) e o ex-senador Romeu Tuma, morto em 2010.
De acordo com Julio Camargo, havia uma espécie de disputa de poder entre operadores do esquema do petrolão em diretorias da Petrobras, e Fernando Baiano não atuava, por exemplo, na área reservada ao ex-diretor de Serviços Renato Duque, indicado ao cargo pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. “A filosofia da Diretoria de Engenharia era ter contato direto com as empresas”, explicou.
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