Estadão Conteúdo 12/07/2022
As Forças Armadas preparam um plano de
fiscalização paralela para as eleições deste ano. Depois de enviar mais de 80
questionamentos ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o processo eleitoral
e alegar que não tem obtido respostas, o Ministério da Defesa montou uma equipe
de oficiais do Exército, da Marinha e da Aeronáutica com a missão específica de
elaborar o roteiro inédito de atuação dos militares.
O plano vai além das sugestões de segurança
das urnas eletrônicas encaminhadas ao TSE e coincide com recomendações do
presidente Jair Bolsonaro (PL), que pressiona a Corte eleitoral politicamente,
lançando suspeição, sem que haja provas, sobre a confiabilidade do sistema
eletrônico de votação. Até agora, a participação dos militares no processo
eleitoral se limitava à ajuda na logística para transporte de urnas.
A campanha à reeleição de Bolsonaro quer que
as Forças Armadas promovam uma contagem de votos à margem da oficial, algo que
os militares não haviam proposto originalmente. O PL, sigla do presidente, vai
realizar uma auditoria privada, como defendem militares.
O plano de fiscalização das Forças Armadas
será dividido em oito etapas, seguindo de perto todas as fases do processo
eleitoral. Esses oito momentos passam pela lacração das urnas, pelos testes de
autenticidade e integridade e pela verificação da totalização dos votos, na
qual a contagem é comparada com os boletins de urna impressos. Numa dessas
etapas, os militares pretendem cobrar da Corte que os equipamentos sejam
submetidos a testes.
"Estamos com plano de ação para cada uma
dessas oito fases, para que, na hora da fase propriamente dita, por exemplo, na
lacração do sistema, estejamos presentes para perguntar, verificar, questionar
os procedimentos e propor alguma coisa", disse o ministro da Defesa, Paulo
Sérgio Nogueira de Oliveira, em audiência na Câmara. Ele também sugeriu uma
"auditoria posterior", ao fim das eleições, mas alegou que a palavra
final será sempre do TSE.
DADOS TÉCNICOS
O Ministério da Defesa já avisou ao tribunal
que terá um plano de fiscalização própria. Para concluir esse plano, porém, os
militares solicitaram uma lista de informações técnicas ao TSE e reclamam que
ainda estão sem resposta. São, ao todo, 12 pontos, que vão desde documentos
relacionados às eleições passadas, de 2014 e 2018 - como boletins de urna,
relatórios de equipamentos substituídos, comparecimento e abstenção em cada
seção eleitoral -, até detalhes sobre o programa que seleciona, por sorteio, as
seções eleitorais em que urnas eletrônicas serão submetidas aos testes de
integridade e autenticidade.
Os militares pedem ainda informações técnicas
sobre o funcionamento do "sistema vota", o programa que coleta e
apura os votos numa mesma seção eleitoral. Também solicitam dados sobre
protocolos com argumento de que apenas querem aumentar a segurança do sistema
que conta e totaliza os votos de todo o País.
Segundo o ofício da Defesa, essa demanda de
"informações preparatórias" vai permitir o trabalho da Equipe das
Forças Armadas de Fiscalização do Processo Eleitoral, nomeada pelo ministro.
Ela é composta por dez oficiais das três Forças, chefiados pelo coronel Marcelo
Nogueira de Sousa, do Exército.
O ministro da Defesa e o presidente do TSE,
Edson Fachin, não se falam mais. Trocam apenas ofícios. Os militares sustentam
que as informações requisitadas à Justiça Eleitoral são
"fundamentais" para o plano de fiscalização. As Forças Armadas afirmam
que atuam "estritamente na legalidade", com base em resolução do TSE
que, em dezembro do ano passado, as legitimou como "entidades
fiscalizadoras" nas eleições de 2022. Também constam na lista partidos
políticos, a Ordem dos Advogados do Brasil, o Congresso Nacional, o Supremo
Tribunal Federal, a Controladoria-Geral da União e a Polícia Federal, entre
outros.
PRAZO
O TSE confirmou ter recebido o ofício da
Defesa. Segundo o tribunal, o prazo para as "entidades
fiscalizadoras" manifestarem interesse em trabalhar nas eleições de
outubro terminou no dia 8 de julho. Agora, a Corte vai apresentar um calendário
de auditorias.
O tribunal descartou a adoção de sugestões ao
pleito de 2022 que chegaram depois de janeiro, caso de parte das que foram
enviadas pelas Forças Armadas. Essas, informou o TSE, "estão sendo
analisadas para os próximos ciclos eleitorais". "A Justiça Eleitoral
reitera que sempre foi aberta às sugestões e no momento está cumprindo a
legislação eleitoral e finalizando os ajustes finais para que os sistemas
eleitorais rodem perfeitamente no pleito", disse o TSE.
PRESSÃO
Comissão de Transparência das
Eleições
O TSE criou, em setembro de 2021, a Comissão
de Transparência das Eleições e convidou militares para integrar o grupo. Então
ministro da Defesa, Braga Netto indicou como representante o general Heber
Garcia Portella.
'Vulnerabilidades'
Em fevereiro, Jair Bolsonaro afirmou que os
militares identificaram "mais de uma dezena de inconsistências" no
sistema eleitoral adotado no Brasil. "Nosso pessoal do Exército buscou o
TSE e começou a levantar possíveis vulnerabilidades. Foram levantadas várias,
dezenas de vulnerabilidades", disse o presidente.
'Péssima mistura'
Ministro do STF e do TSE, Luís Roberto
Barroso disse, em abril, que as Forças Armadas "estão sendo
orientadas" para desacreditar o processo eleitoral. O ministro da Defesa,
Paulo Sérgio de Oliveira (foto), classificou a declaração como
"irresponsável".
Apuração paralela
Bolsonaro defendeu a apuração paralela das
eleições pelas Forças. "Uma das sugestões é que seja feita uma ramificação
para que tenhamos um computador das Forças Armadas para contar os votos."
Questionamentos
Em maio, o Estadão mostrou que
as Forças Armadas enviaram 88 questionamentos ao TSE sobre supostas
fragilidades que, na visão dos militares, podem expor a vulnerabilidade do
processo eleitoral.
'Forças desarmadas'
Presidente do TSE, Edson Fachin disse que
quem cuida de eleições são as "forças desarmadas".
Auditagem
No mês passado, as Forças Armadas pediram que
seja facilitada a auditagem das urnas por partidos políticos. "A todos nós
não interessa concluir o pleito sob a sombra da desconfiança dos
eleitores", afirmou o ministro da Defesa.
Testes públicos
As Forças insistem ainda numa reunião entre
militares do Comando de Defesa Cibernética e técnicos da Justiça Eleitoral.
"Não há sistema que não mereça aperfeiçoamento", disse o general
Paulo Sérgio.
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